Tignanello: 50 anos de história e inovação

vinho Tignanello

Durante o evento “Taormina Gourmet on Tour”, realizado em Palermo, na Sicília, participei de uma masterclass inesquecível, dedicada a um ícone da enologia italiana: o Tignanello. Este evento, que reúne as maiores autoridades do vinho e da gastronomia, oferece aos participantes a chance de mergulhar no universo do vinho italiano por meio de masterclasses exclusivas. A sessão mais marcante foi a de celebração dos 50 anos do Tignanello, conduzida pelo renomado Daniele Cernilli, diretor do Doctor Wine e um dos maiores especialistas do mundo no assunto.

Cernilli nos guiou por uma jornada pela história desse vinho, que em 2024 comemora meio século de legado. Criado pela família Antinori, o Tignanello não é apenas um vinho; ele é um símbolo da transição da enologia italiana da tradição à modernidade. Lançado pela primeira vez em 1974, o Tignanello surge em um contexto onde o Chianti Clássico, embora respeitado, ainda não desfrutava do prestígio internacional necessário para competir com vinhos como o Brunello di Montalcino.

Foi nesse cenário que Piero Antinori, em parceria com o enólogo Giacomo Tachis, decidiu desafiar as convenções da época. Inspirados pelos vinhos de Bordeaux e pela necessidade de elevar o padrão da vinicultura italiana, Antinori e Tachis romperam com as regras do Chianti Clássico, que exigiam o uso de uvas brancas no blend. Assim nasceu o Tignanello, em 1971, inicialmente classificado como “vino da tavola” (vinho de mesa), por não atender às normas da Denominação de Origem.

A primeira safra do Tignanello trazia um blend predominantemente de Sangiovese, com pequenas quantidades de Canaiolo e Malvasia Nera. No entanto, o resultado não foi o esperado. Tachis afirmou que a Sangiovese da época não possuía a base genética necessária para criar um grande vinho em sua forma pura. Os vinhedos de Chianti Clássico eram, então, considerados inadequados para produzir um Sangiovese de qualidade capaz de envelhecer com o tempo.

Foi quando Tachis, influenciado por seus estudos em Bordeaux sob a orientação do renomado Emile Peynaud, sugeriu a inclusão de variedades internacionais, como o Cabernet Sauvignon e, mais tarde, o Cabernet Franc. O blend final passou a ser composto por cerca de 80% de Sangiovese, 15% de Cabernet Sauvignon e 5% de Cabernet Franc. A introdução do uso de barricas de carvalho para maturação trouxe uma sofisticação inédita, redefinindo os padrões dos vinhos italianos.

O design do rótulo do Tignanello também foi um marco. Criado pelo designer Silvio Coppola, o layout moderno e elegante foi um dos primeiros exemplos de design específico para um vinho. Embora tenha passado por algumas alterações ao longo dos anos, a essência do rótulo permanece a mesma, refletindo a inovação que caracteriza o próprio vinho.

O Tignanello logo se tornou um ícone. O crítico Luigi Veronelli, de forma provocativa, batizou-o de “vino da favola” (vinho de fábula), em uma brincadeira sobre a falta de regulamentação para esse tipo de vinho. O blend inovador e a quebra das normas causaram polêmica, especialmente na imprensa, que criticava a legislação por não acompanhar as mudanças do setor. Como ressaltou Cernilli, o Tignanello foi o primeiro vinho moderno da Itália, fruto de um projeto meticuloso que envolvia técnicas de vinificação, o blend e o design do rótulo, todos revolucionários para a época.

Nos anos 1980, o Tignanello e outros vinhos semelhantes passaram a ser conhecidos como “Super Tuscans”, um termo cunhado pela imprensa internacional para descrever esses vinhos excepcionais, que desafiavam as normas tradicionais. O Tignanello não apenas modernizou o Chianti Clássico, mas também colocou a vinicultura italiana no mapa global, competindo com os melhores vinhos de Bordeaux. Como Cernilli destacou, “Tignanello não é apenas um vinho; ele é a história da enologia italiana, uma trajetória de inovação e qualidade.”

Hoje, o Tignanello continua a ser uma joia cobiçada por colecionadores e apreciadores ao redor do mundo. Com uma produção limitada a 300 mil garrafas anuais, ele representa a essência da Toscana e do “Made in Italy”, além de ser um marco na fusão entre tradição e modernidade. Ao celebrarmos seus 50 anos, relembramos não apenas sua história, mas também o impacto profundo que teve na elevação do vinho italiano ao status de excelência que ocupa no cenário global.

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