JOÃO GABRIEL DE LIMA
LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS)
Estrangeiros que vivem em Portugal foram surpreendidos no início do mês pelo anúncio de uma nova onda de deportações, liderada pelo ministro da Presidência, António Leitão Amaro, responsável pela articulação política. Nas primeiras semanas, estão previstas 4.500 notificações judiciais. Nos próximos meses, o total deve chegar a 18 mil.
Os alvos da medida -que recebem o aviso em casa ou no local de trabalho, em ação da Polícia de Segurança Pública- têm 20 dias para deixar o país. Caso descumpram o prazo, podem ser detidos nos CITs (Centros de Instalação Temporária), onde aguardarão voos para seus países de origem.
A notícia causou um grande alvoroço entre os brasileiros, maior contingente de imigrantes do país -370 mil de acordo com os dados oficiais, cerca de 700 mil segundo estimativa da Embaixada do Brasil. Os efeitos para a comunidade, porém, devem ser restritos.
Ao comunicar as deportações, o ministro Leitão Amaro disse que dois terços dos cidadãos a serem notificados eram originários da Índia, Nepal, Paquistão, Bangladesh e Butão.
“Estima-se que o impacto entre os brasileiros seja muito pequeno”, diz a advogada Érica Acosta, especialista em direito migratório.
“Até agora não chegou a nós nenhum caso concreto de brasileiro que tenha sido notificado”, afirma Ana Paula Costa, presidente da Casa do Brasil de Lisboa, organização de apoio à comunidade brasileira.
A principal razão para a notificação seria a falta de certificado de antecedentes criminais ou a inclusão no cadastro de recusados do SIS (Sistema Integrado do Espaço Schengen) -a área que abrange 31 nações europeias e permite a livre circulação entre um país e outro.
“Essas duas questões afetam pouco os brasileiros”, diz Érica Acosta. “Em alguns países asiáticos é necessário esperar meses por um certificado de antecedentes criminais, que precisa ser apostilado. No Brasil, é possível baixar na internet e tem validade imediata em Portugal.”
Quanto ao Espaço Schengen, são poucos os brasileiros catalogados no SIS, onde constam os nomes dos que tiveram vistos negados por algum país da região. Os turistas brasileiros não precisam de visto para entrar na maior parte dos países europeus.
Deportações de imigrantes não são novidade na Europa. “A Diretiva de Regresso existe desde 2008 e obriga os países a notificar e deportar os imigrantes sem documentos”, diz Ana Paula Costa. “O anúncio foi feito como se fosse uma coisa nova, às vésperas das eleições, talvez com o intuito de agradar a eleitores que são contra a imigração.” O país vai às urnas no próximo domingo (18).
Portugal é governado pelo primeiro-ministro Luís Montenegro, de centro-direita, que luta para continuar no cargo pela via eleitoral, depois de ser afastado num caso momentoso de conflito de interesses. Segundo esse raciocínio, Montenegro estaria de olho nos votos do Chega, o partido da ultradireita xenófoba portuguesa.
A novidade, no caso das deportações, é a escala. “No ano passado foram cerca de 1.500 notificações de deportação. O número triplicou”, afirma Acosta. Ela atribui o aumento à força-tarefa da Agência para Integração, Migrações e Asilo (Aima), organismo do governo português que lida com os imigrantes.
A Aima se tornou mais rigorosa depois que o Pacto Europeu de Migração, aprovado em 2024, recomendou uma conduta mais restritiva em relação à imigração.
Para Ana Paula Costa, existe um recado claro, além da mensagem de cunho eleitoral. “O governo quer desestimular a imigração para Portugal, deixando patente que quem vier sem papeis pode ser deportado.”
Pelo menos num primeiro momento, os mais vulneráveis são os imigrantes que não falam português e não estão ao abrigo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Associações como a Casa do Brasil de Lisboa, no entanto, estão atentas a possíveis notificações de deportação de brasileiros.