IGOR SIQUEIRA E RODRIGO MATTOS
RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS)
Os recentes problemas da CBF extrapolam o futebol. A entidade se vê em meio a uma onda de críticas e ataques no ambiente político, com atuação direta de parlamentares de direita e extrema direita.
A CBF entrou na agenda mais recorrente de políticos do PL após a matéria da revista Piauí, mencionando o contrato já conhecido entre a entidade e o IDP (que controla a CBF Academy), que tem entre seus sócios o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.
O gancho da ofensiva tem, claro, o STF, e deságua em outras questões como a cor da camisa da seleção e questionamento de passos que mantiveram Ednaldo no poder.
Na visão dos políticos de direita, a CBF está tomando partido na polarização vigente no Brasil.
O volume de ações da direita tem extrapolado as redes sociais e se materializado em atos formais que colocam a CBF em xeque:
Há uma mobilização do senador Eduardo Girão (Novo) e do deputado federal Coronel Meira (PL-CE) para que haja uma CPI mista para investigar a CBF.
O deputado federal Sargento Gonçalves (PL-RN) entrou com um pedido de audiência pública para apurar se houve fraude ou falsidade ideológica no acordo judicial que sepultou a ação no STF que poderia tirar Ednaldo Rodrigues do poder.
Os deputados federais Zé Trovão (PL-SC) e Coronel Meira (PL-PE) entraram com projetos de lei na Câmara com o mesmo objetivo: impedir que seleções usem em seus uniformes cores diferentes das que estão na bandeira do Brasil.
No Rio, o vereador Marcos Dias (Podemos), acionou o Ministério Público do Trabalho (MPT) para apurar se a CBF cumpriu medidas para coibir casos de assédio moral e sexual na entidade. O vereador sugeriu o afastamento cautelar de Ednaldo da presidência da CBF para evitar intimidações a funcionários e prejudicar as investigações.
COMO A CBF VÊ ISSO TUDO?
Segundo a reportagem apurou, a CBF entende que está entrando numa onda de agentes políticos que querem atacar o Supremo. E como mantém contrato com o IDP, de Gilmar Mendes, entrou no balaio.
A entidade analisa se há articulação nessas ações de políticos de direita e discute internamente formas de defesa jurídica nos casos.
A CBF também vê um oportunismo de ações desse tipo para abalar negociações importantes com a contratação de um novo técnico, que podem ser afetadas por notícias ruins.
A entidade rejeita a tese de que a possível nova camisa da seleção seja um recado político. Assim como nunca se manifestou contra o uso da camisa amarela em manifestações da direita como queriam políticos de esquerda.
Em nota, a CBF disse nesta terça-feira (29) que as imagens vazadas sobre a camisa não são oficiais e reafirmou que os padrões serão mantidos, citando as cores amarelo e azul.
A entidade tenta se cercar de dores de cabeça no cenário político com uma aproximação maior de Brasília. Mas não consegue se blindar completamente.
Os movimentos na Justiça do Rio, ambiente que a CBF politicamente não controla, são os que trazem preocupação a Ednaldo Rodrigues. Foi nesta esfera que ele foi afastado do cargo. A decisão foi revertida no STF após ação do PCdoB.
Durante a assembleia de aprovação de contas, houve debate entre presidentes de federações sobre os ataques. Mesmo presidentes de Federação com bom trânsito com políticos de direita não conseguem suprimir a ofensiva.
O deputado Coronel Meira, por exemplo, é amigo de Evandro Carvalho, presidente da Federação Pernambucana. Os dois, inclusive, poderiam ser companheiros de bancada da bola.
Mas Meira mergulhou na mobilização a favor da CPI contra a CBF e fez um dos projetos que tentam vetar o vermelho na camisa da seleção.
COMO É O PEDIDO DE AUDIÊNCIA NA CÂMARA?
Já a audiência pública solicitada pelo deputado Sargento Gonçalves coloca em dúvida se o Coronel Nunes, ex-presidente interino da CBF, estaria em condições cognitivas de assinar o acordo que teve como efeito prático o fim do questionamento do mandato de Ednaldo no STF.
Um laudo médico assinado por Jorge Pagura, presidente da comissão médica da própria CBF, apontava que Nunes tinha “quadros de tontura e ataxia com piora recente do déficit cognitivo”.
O Coronel Nunes não era figura central no processo. Mas um dos que perderam o mandato quando Ednaldo assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para invalidar a eleição da chapa de Rogério Caboclo e realizar um novo pleito, em 2022.
A oposição mais ferrenha a Ednaldo era feita por Gustavo Feijó, além de Castellar Neto e Fernando Sarney. Caboclo, àquela altura, já estava afastado.
Todos eles, além da Federação Mineira, assinaram o acordo do qual o Coronel Nunes fez parte, enterrando o processo na Justiça do Rio e, consequentemente, no STF.
A convocação para a audiência pública tramita na Comissão de Esporte da Câmara e tem Ednaldo como um dos alvos, além do presidente da Federação Bahiana, Ricardo Lima, braço direito do presidente da CBF e um dos futuros vices no próximo mandato.
TENTATIVA DE CPI
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) usou a tribuna do Congresso para martelar sobre a necessidade de uma CPI para apurar a relação entre Gilmar Mendes e a CBF.
“No meio de toda essa crise com Ednaldo Rodrigues que a CBF promoveu um generoso contrato com o IDP. Ocorre que um dos fundadores do IDP é o próprio ministro Gilmar Mendes, e a instituição é atualmente dirigida por seu filho. Olha a gravidade do que está acontecendo.
Esse, talvez, seja um dos casos mais vergonhosos de conflito explícito de interesse, que exigiria a óbvia suspeição”, disse Girão.
O senador Carlos Portinho (PL-RJ) até relaciona a opção da CBF de fazer um uniforme com tom avermelhado ao fato de o PCdoB ter sido autor da ação no STF que reconduziu o atual presidente da CBF ao cargo.
“Tomaram tudo e até a CBF? Pagando divida com o PCdoB? Não misturem futebol com política, porque a política ao final sempre vai se locupletar e capturar o futebol”, escreveu o líder do PL no Senado, que publicou uma montagem com fotos do presidente Lula e do ministro Alexandre de Moraes com camisas vermelhas da seleção e símbolos do PT.
Outros políticos do PL como o deputado Nikolas Ferreira e o senador Flávio Bolsonaro também atacaram a CBF por causa da suposta camisa vermelha.
É bem verdade que a indignação com a camisa não foi exclusiva da direita – vide a crítica do senador Randolfe Rodrigues, líder do governo Lula.