SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O dólar está em queda firme nesta quinta-feira (24), enquanto investidores continuam atentos à política comercial dos Estados Unidos, marcada por ameaças e recuos constantes do presidente Donald Trump.
O movimento global é de venda da moeda norte-americana em meio às incertezas sobre o tarifaço.
Às 13h, ela caía 0,84% no Brasil, cotada a R$ 5,668.
Já a Bolsa avançava 1,36%, a 134.027 pontos, estendendo os ganhos da véspera e em linha com os índices acionários de Wall Street.
Em entrevista coletiva na quarta à noite, Trump fez mais um aceno à China. Segundo ele, os Estados Unidos buscam um acordo comercial “justo” e que “tudo está ativo” nas negociações envolvendo os dois países.
O republicano já havia declarado que “não jogaria duro” com os chineses nas eventuais tratativas e que reduziria “substancialmente” as tarifas, hoje em 145%. A China aplica tarifas de 125% a produtos norte-americanos como resultado da escalada da guerra comercial.
Horas antes, o país asiático assegurou estar aberto ao diálogo com Washington. “Se tivermos que lutar, iremos até o fim, mas as portas do diálogo seguem abertas”, declarou Guo Jiakun, porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores.
Nesta quinta-feira, entretanto, Jiakun negou que Pequim esteja em negociações com Washington sobre tarifas. “São informações falsas”, afirmou, em resposta a uma pergunta sobre as “constantes notícias do lado americano” que chegaram até a mencionar um acordo já fechado.
“China e Estados Unidos não se consultaram nem negociaram sobre a questão tarifária, menos ainda alcançaram um acordo”.
O mesmo foi dito por Scott Bessent, secretário do Tesouro dos EUA, que afirmou que os diálogos não começaram.
“Acredito que as duas partes estão esperando para falar com a outra”, disse, durante um ato à margem das reuniões da primavera do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial, em Washington.
Bessent advertiu que os dois países não realizaram nenhuma conversa comercial. Fontes familiarizadas com as discussões disseram que Pequim deixou claro que via as tarifas de Trump como uma forma de intimidação econômica e não irá ceder.
Em meio ao vai-e-vém de informações conflitantes, investidores optam por vender dólares e buscar outras moedas neste pregão, movimento que beneficia o real.
“A China afirmou que só aceitará negociar se todas as tarifas forem retiradas, o que voltou a esfriar o otimismo em torno de um possível acordo. Bessent reforçou que Trump não chegou a propor uma retirada unilateral das tarifas, adicionando incertezas ao cenário”, disse Bruno Botelho, especialista em câmbio da One Investimentos.
“O dólar recua no exterior, refletindo uma leve recuperação das principais moedas globais e alguma demanda por ativos de risco. Essa fraqueza do dólar lá fora contribui para o movimento de queda no câmbio local.”
O índice DXY -que compara o dólar a uma cesta de seis moedas fortes- caía 0,48%, a 99,43 pontos, indicando fraqueza global da divisa dos EUA.
“A imprevisibilidade que cerca o cenário econômico global no curto prazo está levando os mercados a uma forte oscilação nos preços. De 2 de abril, dia do tarifaço, até hoje, o mercado de câmbio teve oscilação de R$ 0,50”, diz Marcio Riauba, chefe da mesa de operações da Stonex Banco de Câmbio.
“As publicações de Trump causam alvoroço com mensagens ora promovendo abertura a negociações, ora fazendo ataques desenfreados à China e até ao presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), Jerome Powell.”
Depois de ameaçar Powell de demissão e de chamá-lo de “Sr. Tarde Demais” e “grande perdedor”, Trump recuou. A jornalistas no Salão Oval da Casa Branca, disse que não tem intenções de demitir o chefe do Fed, mas “gostaria que ele fosse um pouco mais ativo na redução das taxas de juros”.
O alvo nas costas de Powell levou o mercado a temer uma interferência política no Fed, cuja independência é um dos pilares do sistema financeiro dos Estados Unidos e, por consequência, da economia global.
O Fed tem adotado uma postura de “ver para agir” diante das pressões econômicas causadas pela onda de tarifas de Trump. Diferentemente do Banco Central do Brasil, o dos EUA trabalha com um mandato duplo, isto é, baliza as decisões de política monetária pela inflação e pelo mercado de trabalho. O objetivo é manter os preços controlados, dentro da meta de 2% ao ano, e atingir o pleno emprego.
Mas especialistas dão como certo que as sobretaxas de importação aumentarão os preços ao consumidor final, o que pode levar a um repique inflacionário. Por outro lado, as medidas podem enfraquecer o mercado de trabalho, aumentando o desemprego. Cada um dos cenários fortalece decisões opostas sobre a política monetária: inflação elevada é combatida com juros altos; emprego fraco, com juros baixos.
As incertezas em torno das tarifas -cujas magnitudes já foram alteradas diversas vezes, em um vai-e-vém pouco previsível- colocou o Fed em uma posição delicada, e membros da autarquia, incluindo Powell, reconheceram que podem ser forçados a focar só na inflação ou só no desemprego.
Com o adiamento do tarifaço, essa discussão pode demorar semanas ou meses para de fato exigir uma movimentação, permitindo que o Fed, por enquanto, continue com a taxa de juros onde está até que fique claro qual será a decisão final de Trump e o impacto que ela terá sobre os empregos, os preços e as perspectivas econômicas.
Mas cautela é exatamente o que Trump não quer. Ele tem defendido o corte nas taxas de juros, hoje na banda de 4,25% e 4,5%, como forma de injetar dinamismo na atividade, que periga estar a caminho de uma “estagflação” -quando a inflação está elevada e a economia não cresce- por causa do tarifaço.
Os membros do Fed projetam até dois cortes de 0,25 ponto percentual na taxa este ano. No entanto, subiu de um para quatro o número de membros do comitê que espera que nenhum corte ocorra.