Capes muda regra, e artigos passam a ser avaliados pela qualidade, e não pelo impacto da revista

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ANA BOTTALLO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior) fará uma mudança no modelo de avaliação da produção científica nacional. A partir do ciclo 2025-2028, o processo passará a focar a classificação dos artigos publicados, e não mais o periódico em que o texto saiu.

A produção científica é avaliada a cada quatro anos como parte do processo de avaliação dos programas de pós-graduação. As avaliações podem manter o financiamento de recursos para pesquisa e pós-graduação, como bolsas de mestrado e doutorado e auxílios para laboratório e de publicação, ou podem ser reduzidas, se o desempenho no período for abaixo do esperado.

Antes, os artigos eram classificados segundo uma lista conhecida como Qualis Periódicos, que estratificava os títulos conforme uma classificação (de A1 até B4) baseada no impacto científico internacional dos periódicos.

Nessa avaliação, revistas eram ranqueadas por área segundo o fator de impacto geral na plataforma, o que gerava uma discrepância, já que artigos de melhor qualidade podiam ter uma avaliação pior se fossem publicados em uma revista de nível inferior do que aqueles publicados em revistas A1 ou A2, por exemplo.

Agora, a avaliação será feita com três procedimentos: levando em consideração a relevância da revista e do artigo, como por meio das citações alcançadas; se ele foi publicado em uma revista indexada em grandes bases de periódicos e de acesso aberto; e pela qualidade do artigo em si.

Segundo a Capes, órgão ligado ao MEC (Ministério da Educação) e responsável por gerenciar os programas de pós-graduação no país, os documentos orientadores das novas regras serão publicados de forma detalhada em março de 2025.

O diretor de avaliação da Capes, Antonio Gomes de Souza Filho, afirma que a reformulação proposta mantém os preceitos dos indicadores bibliométricos das revistas como forma de avaliar indiretamente a qualidade dos artigos.

“Do ponto de vista conceitual, a base do Qualis Periódicos continua, mas não serão classificados os periódicos, e sim os artigos”, diz ele.

MODELOS DE PUBLICAÇÃO DE ARTIGOS CIENTÍFICOS

Via Verde
O artigo é publicado em qualquer revista, o autor retém os direitos autorais e tem permissão para colocar cópias do artigo em um repositório ou em seu próprio site. Trata-se do arquivamento do manuscrito no repositório. Algumas editoras exigem um período de embargo antes que o artigo fique em acesso aberto

Via Dourada
O artigo é publicado em uma revista de acesso aberto. Neste modelo, é permitido que cópias do artigo sejam arquivadas em outro lugar. As revistas de acesso aberto não cobram de leitores ou bibliotecas, mas depende do pagamento de taxas pelo autor

Via Diamante
O autor publica o artigo em uma rvista de acesso aberto e o periódico não cobra taxas. Essas revistas são mantidas por meio de trabalhos voluntários. São tipicamente revistas dirigidas por associações ou sociedades profissionais, organizações sem fins lucrativas, universidades ou agências governamentais. Seu modelo econômico depende de contribuições e doações de membros

Via Híbrida
Parcialmente financiadas por assinaturas, as revistas fornecem apenas acesso aberto para alguns artigos individuais para os quais os autores (ou patrocinador da pesquisa) pagaram uma taxa de publicação

Para Abel Packer, diretor do portal de periódicos científicos SciELO, a mudança deve beneficiar as revistas nacionais e impulsionar a produtividade científica brasileira. “Eliminando a estratificação por periódicos [a Capes], tem como objetivo uma coisa que a gente pede há muito tempo: que olhe para o impacto do artigo, e não do periódico onde ele foi publicado.”

O pesquisador afirma que, por diversas razões, os periódicos editados no Brasil acabam tendo uma classificação pior nesse formato convencional. “É uma questão de rede [de pesquisa], de idioma, de prestígio, uma série de condicionantes que faz com que os periódicos internacionais tenham maior impacto.”

A nova avaliação deve minimizar essas diferenças, segundo Souza Filho. “Em algumas áreas esse procedimento tem se mostrado adequado e deve continuar sendo utilizado. Um ponto importante do novo sistema de classificação é que também podem ser considerados os indicadores bibliométricos diretos do artigo.”

O índice conhecido como fator de impacto é, na verdade, uma unidade bibliométrica utilizada para avaliar a relevância científica dos periódicos. Ele equivale ao número de citações do periódico naquele ano dividido pelo total de artigos publicados nos últimos cinco anos.

As revistas Nature e Science, por exemplo, consideradas as mais prestigiadas nas áreas de exatas, ciências naturais e da terra, têm fatores de impacto de 50,5 e 50,3, respectivamente.

Mas para publicar nessas revistas os autores têm um custo mais alto -no caso da Nature, o valor corrente é de US$ 12.290 (cerca de R$ 70 mil) para a modalidade ouro, que é de acesso aberto.

Segundo Packer, os custos de publicação nos periódicos indexados no SciELO (que são todos de acesso aberto) chegam a ser de 60% a a 70% menores do que para as revistas estrangeiras -em torno de US$ 300 (ou R$ 1.700), contra US$ 2.000 a US$ 2.300 (cerca de R$ 11,5 mil a R$ 13,2 mil).

“A diferença é que, se antes você conseguia publicar um artigo na Science, então você recebia tanto.

Hoje, não vai mais ser avaliada a capacidade de emplacar um artigo lá; é realmente a qualidade do artigo.

Esse é o grande avanço da mudança”, afirma ele.

De acordo com a Capes, o gasto em 2024 com o programa de Avaliação, no qual está inserido o Qualis Periódicos, foi de R$ 13 milhões. Já para o Portal de Periódicos, que inclui as assinaturas dos periódicos e descontos para publicação, foi de R$ 593,15 milhões. O portal SciELO tem custo anual de produção e de indexação de periódicos de R$ 63 milhões.

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