Aumento de pena para violência psicológica com uso de IA é avanço para mulheres, dizem especialistas

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LUANA LISBOA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A pena para o crime de violência psicológica contra a mulher poderá aumentar se o delito for cometido com uso de IA (inteligência artificial). A alteração no artigo 147-B do Código Penal, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em abril, é vista como avanço por especialistas.

A punição prevista, de seis meses a dois anos de prisão (além de pagamento de multa), pode chegar a três anos se for comprovado o uso de IA.

Uma nova forma de violência psicológica, os deepfakes (vídeos ou imagens falsas criadas por IA) são usados para constranger e chantagear vítimas, por exemplo, por meio da divulgação de conteúdos pornográficos falsos.

Para o advogado Renato Opice Blum, presidente da Comissão de Estudos de Novas Tecnologias, Neurodireitos e Inteligência Artificial do Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo), é importante que as leis acompanham as mudanças de comportamento causadas pelo avanço tecnológico.

“Antes, a ação [violência psicológica] não tinha a continuidade de hoje e ficava restrita ao ambiente em que acontecia. Isso justifica e exige que a legislação minimamente acompanhe o prejuízo, a potência disso”, diz ele, que é sócio-fundador do escritório Opice Blum e professor de direito digital, proteção de dados, inteligência artificial e segurança da informação.

A mudança no Código Penal teve origem no projeto de lei 370/2024, da deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ). De acordo com dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o número de mulheres vítimas de stalking (perseguição física ou virtual), por exemplo, subiu 34,5% de 2022 para 2023.

De acordo com Larissa Galimberti, sócia do escritório Pinheiro Neto Advogados e especialista em legislação de tecnologia, licenciamento e proteção de dados, a mudança vem na esteira de alterações anteriores no código, que garantem maior proteção às mulheres.

“Quando alguém discute se deveria ser a mesma coisa para homens e mulheres dentro do capítulo de violência psicológica, a verdade é que os números e os estudos indicam que as mulheres sofrem maior volume de casos de violência psicológica e física”, afirma.

A inteligência artificial é tema de outras propostas legislativas. A PEC 29, em tramitação no Senado, pretende alterar o artigo 5º da Constituição para acrescentar um novo direito fundamental, a integridade mental e transparência algorítmica.

No ano passado, o Senado aprovou o projeto de lei 2.338/2023, que diz respeito à regulamentação do uso da IA para garantir segurança ética e jurídica.

Segundo Dora Kaufman, professora do programa tecnologias inteligentes e design digital da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), esse projeto ressalta cuidados e obrigações referentes a grupos vulneráveis, sem, no entanto, mencionar as mulheres. De acordo com a especialista, não se trata de um problema da IA, mas do uso que é feito dela.

“É muito importante pensar que o mundo digital e o mundo físico hoje são um só. Na sociedade muito machista, as regras são comandadas pelos homens. Então, isso se reflete no meio digital. As mulheres são muito mais atacadas nas redes sociais, assim como são no mundo físico também”, afirma.

Dados da ONU Mulheres destacados no estudo “Aprenda a evitar ‘esse tipo’ de mulher: Estratégias discursivas e monetização da misoginia no YouTube”, parceria entre o Ministério das Mulheres e a NetLab da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), mostram que as mulheres têm 27 vezes mais chances do que os homens de sofrer abusos no ambiente digital.

O estudo aponta que a partir de 2022 foi observado no YouTube um aumento significativo de vídeos com “narrativas masculinistas”, nos quais predominam conteúdos que disseminam teorias conspiratórias prejudiciais à igualdade de gênero, além de comportamentos nocivos às mulheres disfarçados de estratégias de valorização dos homens.

“A capacidade da IA generativa de gerar ou modificar com uma precisão quase realista torna-se um novo instrumento para quem quer fazer o mal”, diz Kaufman.

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