NATHALIA GARCIA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, discutiu nesta terça-feira (20) em reunião com senadores alguns ajustes no texto da PEC (proposta de emenda à Constituição) que dá autonomia financeira e orçamentária à autoridade monetária.
Participaram do encontro os senadores Plínio Valério (PSDB-AM), relator da PEC, Vanderlan Cardoso (PSD-GO), autor da proposta, e Otto Alencar (PSD-BA), presidente da CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado. Estiveram presentes, pelo lado do BC, os diretores Ailton Aquino (Fiscalização) e Rodrigo Teixeira (Administração).
Um dos pontos em discussão refere-se a um trecho do texto que coloca o Senado como responsável por autorizar (ou não) o Banco Central a exceder o teto estabelecido para despesas com pessoal e encargos sociais. No entendimento da autarquia, essa competência deveria ficar a cargo do CMN (Conselho Monetário Nacional) -colegiado formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC.
“O limite para as despesas de pessoal e encargos sociais do Banco Central não poderá superar, salvo autorização expressa do Senado Federal, o valor do limite referente ao exercício imediatamente anterior, corrigido pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, publicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ou de outro índice que vier a substituí-lo, para o período de 12 meses encerrado em junho do exercício anterior a que se refere a lei orçamentária”, diz o relatório.
O BC também quer assegurar que o texto classifique a instituição como de natureza especial, organizada sob a forma de pessoa jurídica de direito privado integrante do setor público financeiro. O objetivo é afastar qualquer correlação com a ideia de privatização da autoridade monetária.
Esse trecho já tinha sido incorporado na última versão apresentada pelo relator, que descartou o uso da denominação “empresa pública” e fez ajustes de redação.
Quanto ao regime dos servidores, ponto central do conflito entre funcionários favoráveis e contrários à PEC, Galípolo não quer se comprometer com nenhum dos lados e deixará o debate aberto, com a decisão na mão dos parlamentares.
A mudança de regime jurídico afetará as relações de trabalho dos servidores do BC, que deixarão de ser regidos pelas normas do RJU (Regime Jurídico Único) e passarão a ser empregados públicos regulamentados pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
Foram incorporados ao texto elementos para preservar a estabilidade dos funcionários da autoridade monetária, mesmo com a alteração na natureza jurídica do BC. Também foram criadas regras provisórias para aposentadoria buscando mitigar os impactos negativos gerados pela mudança de regime previdenciário.
“Essa questão da CLT com estabilidade, a gente precisa definir, mas não é o principal. A gente tem que definir um regime que não prejudique quem está [trabalhando no BC], mas que [crie] regra para quem vai entrar”, afirmou Valério a jornalistas, após encontro com Galípolo.
A ala dos servidores representada pelo Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central) rejeita a proposta em discussão. Já o grupo encabeçado pela ANBCB (Associação Nacional dos Analistas do Banco Central do Brasil) vê a PEC como uma saída para fortalecer a instituição.
Segundo o relator da PEC, o BC deve apresentar as sugestões formais em um prazo de até dez dias e o tema deve voltar a ganhar tração.
“O Banco Central é um Boeing com orçamento de teco-teco”, disse Valério, ressaltando que a autoridade monetária precisa de mais liberdade orçamentária para não comprometer suas entregas, como as novas funcionalidades do Pix.
O parlamentar também afirmou que o presidente da CCJ, senador Otto Alencar, se comprometeu a colocar o tema em pauta assim que o relatório final ficar pronto.
Para o senador Vanderlan Cardoso, as pendências restantes são mínimas, e o projeto deve avançar já nos próximos dias. “O que eu senti hoje foi uma disposição muito grande de fazer o projeto andar”, afirmou à Folha de S.Paulo.
De acordo com o autor da PEC, o BC queria ouvir de todos os envolvidos os pontos em aberto, discutir tecnicamente a questão e alinhar a proposta.
Desde 2021, o BC possui autonomia técnica e operacional assegurada por lei. A autoridade monetária, contudo, continua sem ter poder sobre o seu próprio orçamento. A PEC que concede autonomia financeira e orçamentária está travada na CCJ do Senado desde o ano passado, ainda na gestão de Roberto Campos Neto.
“Nas coisas que são importantes para o país não tem que ter esse negócio de bandeira ideológica, partidária. Vamos juntar todo mundo, aprovar e colocar em prática”, disse Cardoso.
Em julho do ano passado, a votação da PEC acabou adiada após o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sinalizar a construção de um acordo. O tema ficou parado até Galípolo, nome de confiança do presidente, retomar a discussão.
Publicamente, o chefe da autoridade monetária vem defendendo publicamente a necessidade de garantir condições para que os servidores possam continuar fazendo entregas à sociedade.