TULIO KRUSE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Preso na Bolívia na tarde desta sexta-feira (16), o traficante Marcos Roberto de Almeida, conhecido como Tuta, passou a integrar a alta cúpula do grupo criminoso PCC (Primeiro Comando da Capital) após a transferência para o sistema penitenciário federal de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder máximo da facção, em 2019.
Tuta integrava a sintonia final de rua, grupo com posição hierárquica mais alta entre os membros do PCC em liberdade, e era responsável por toda a logística do tráfico de drogas do PCC, segundo investigações do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público de São Paulo. Sua proeminência foi descoberta na Operação Sharks, deflagrada em 2020. Estava foragido há cinco anos.
No ano passado, Tuta foi condenado a mais de 12 anos de prisão, com base nas denúncias apresentadas pela Sharks. A Justiça estadual considerou que havia provas suficientes contra ele e outros três criminosos por associação criminosa e lavagem de dinheiro.
Cerca de R$ 1,2 bilhão teria sido lavado no esquema, apenas entre 2018 e 2019, por Tuta e outros integrantes da facção. A reportagem não conseguiu contato com sua defesa.
“Ao menos até aquela época [2020], ele respondia pelo preparo, pela distribuição, comercialização das drogas”, explica o promotor Silvio Loubeh, que integrou a força-tarefa do Gaeco que resultou na Operação Sharks. “É uma prisão importante, acho que deve abalar mais um pouco a estrutura e o poder decisório do PCC.”
A investigação descobriu que Tuta coordenava um esquema que pagava mensalidades a pessoas comuns, que não integravam a facção, para esconder drogas e dinheiro nas próprias casas –as chamadas “casas-coca”. Quando alguém pedia para deixar de participar do esquema, segundo Loubeh, era Tuta que providenciava a retirada da droga, a realocação e os pagamentos pelo serviço.
No momento da deflagração da Sharks, ele dividia a sintonia final de rua com outros dois chefes do PCC: Marcelo Moreira Prado, o Sem Querer, e Eduardo Aparecido de Almeida, o Pisca. Ambos foram presos na operação –outros dois homens também foram presos naquela ocasião, e um foi morto em confronto com policiais–, restando Tuta em liberdade.
Segundo as investigações, eles e os outros chefes da sintonia final de rua teriam sido indicados pelo próprio Marcola para assumirem o comando da facção enquanto a cúpula estava confinada em presídios do sistema federal.
“Com a transferência das lideranças da sintonia final, que ficava lá em Presidente Venceslau [em penitenciária estadual], para os presídios federais, a comunicação se tornou mais difícil e eles precisavam ter mais agilidade na tomada de decisões”, explicou Loubeh.
As investigações da Operação Sharks começaram a partir da prisão de um homem responsável pelo setor financeiro do PCC. Foram apreendidos agendas, celulares, notebook e uma contabilidade que indicava envio de recursos para o Paraguai na ordem de R$ 100 milhões. A quebra de sigilo do telefone mostrou as conversas com Tuta e outros líderes da facção.
Pelo fato de ter mapeado as novas lideranças da facção criminosa, a Sharks foi considerada à época a operação mais importante do Gaeco paulista desde a transferência da cúpula do PCC para os presídios federais.
Tuta chegou a trabalhar num cargo no Consulado de Moçambique em Belo Horizonte, em Minas Gerais.
Há dois anos, ele foi alvo da segunda fase da Sharks, que mirou seu patrimônio pessoal. A investigação apontou movimentações financeiras de centenas de milhões de reais e uma rotina de viagens internacionais em aviões particulares. Essa ação ainda está em andamento na Justiça.
Mais recentemente, o nome dele reapareceu numa investigação da Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo, que apontou mais de dez agentes suspeitos de repassar informações privilegiadas à cúpula do PCC.
Tuta constava como um dos principais beneficiados pelos vazamentos de informações, ao lado de nomes como Anselmo Becheli Santa Fausta (vulgo Cara Preta, morto em 2021), Claudio Marcos de Almeida (o Django, também morto), Silvio Luiz Ferreira (o Cebola, foragido) e Rafael Maeda Pires (o Japa, também morto).
Entre policiais envolvidos estariam homens com passagem pela Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), tropa de elite da PM que realiza diversas ações de combate ao crime organizado, e de outros batalhões. Uma denúncia recebida pela Corregedoria afirmava que um sargento e um cabo, que trabalharam na sala de rádio da Rota, passavam informações para Tuta e Cebola sobre as operações do batalhão.