A imagem do mês de abril, eleita por unanimidade pela ARFOC-SP, é da fotojornalista Márcia Foletto, do jornal O Globo. A foto mostra a sutileza de uma mulher cobrindo o rosto de uma criança durante a passagem do corpo de um suspeito, morto em ação policial para capturar bandidos na Ladeira dos Tabajaras, na zona sul do Rio. Imagem corriqueira no noticiário, o depoimento da profissional dá a dimensão do papel do fotojornalista nos dias de hoje e o que chamamos de “novo normal”.
“Chego na redação às sete horas da manhã e fico esperando as coisas acontecerem. Naquela terça feira (15) estava tudo tranquilo até um colega ser notificado que estava havendo um tiroteio na Ladeira dos Tabajaras e seguir para lá. Depois de um tempo foi resolvido que eu também iria para reforçar a cobertura.
É fundamental para um repórter fotográfico ir até o local de um acontecimento com o máximo de informação possível. Tudo que souber sobre o assunto, contribui para a composição da imagem e para que faça um relato mais preciso possível do que está acontecendo.
Quando cheguei no local estava tudo tranquilo. Eu acompanho operações policiais há décadas, e sempre é preciso tomar cuidado antes de entrar em qualquer comunidade. Fiquei à espera de um momento em que me sentisse segura e fomos (eu e a repórter) falando com as pessoas, até saber que tinha um corpo no local.
O fotojornalista em uma situação como essa tem várias questões a considerar: a sua própria segurança, o respeito pelas pessoas envolvidas, a emoção para que a informação passe por você e retorne ao leitor com força e potência, e frieza para registrar esses momentos duros e de muito sofrimento.
Mas eu imaginei essa foto, pensei que em algum momento o corpo seria retirado pela viela por onde entrei e já tinha mapeado elementos importantes pra descrever o que estava acontecendo ali: bandeira do brasil, pessoas sentadas e o corpo passando. Dados visuais significativos para composição da foto, mas quando vinham descendo com o corpo apareceram duas mulheres e uma criança andando na frente dos policiais. Comecei a fotografar porque vi que este momento renderia uma boa foto, só que elas se posicionaram no muro e os policiais passaram. Essa cena (dela colocando a mão no rosto da criança) eu só vi depois quando estava editando todo o material; o detalhe da mulher tapando o olho da criança para que ela não visse a dureza da cena, de um corpo passando por ela enquanto os policiais carregavam.
Eu não me canso de fazer essa fotografia, que é dura, mas que leva à reflexão, que pode provocar alguma sensação e gerar uma mudança de pensamento, de atitude. Esse é objetivo maior. Valeu a pena ter ficado esse tempo todo sem comer, sem ir ao banheiro, porque essa é a condição do trabalho do repórter fotográfico nesse contexto. Só depois de transmitir as fotos é que consegui relaxar e almoçar, às 19 horas.”
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