Kayapós cobram de governo Lula alternativas de renda após expulsão de garimpeiros

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VINICIUS SASSINE
BELÉM, PA (FOLHAPRESS)

O início da operação para expulsão de garimpeiros na Terra Indígena Kayapó, no sul do Pará, levou um grupo de lideranças e representantes dos kayapós mebengôkres a cobrarem, junto ao governo Lula (PT), alternativas de fontes de renda no território.

A terra kayapó é a área indígena com mais garimpos ilegais no país. A atividade criminosa envolve cooptação de kayapós, que cobram pelo acesso do maquinário pesado –como máquinas escavadeiras– a áreas onde há exploração de ouro, num cerco a aldeias em diferentes pontos.

Existe uma divisão entre indígenas, muitas vezes numa mesma comunidade. A grande maioria das 55 aldeias da terra kayapó se opõe ao garimpo ilegal de ouro.
O governo federal deu início na última sexta-feira (2) a uma operação para desintrusão expulsão de invasores do território, em cumprimento a uma determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) vigente desde o governo de Jair Bolsonaro (PL).

A duração prevista da operação é de 90 dias, com a participação de diferentes órgãos como Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e Exército e coordenação da Casa Civil da Presidência da República.

Segundo o governo, essa é a oitava operação de desintrusão desde o início do governo Lula. A mais recente foi realizada na Terra Indígena Mundurucu, no sudoeste do Pará, onde também havia cooptação de indígenas para o garimpo. A expulsão de invasores da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, iniciada há mais de dois anos, segue em curso.

No dia 1º, dia seguinte ao anúncio da operação feito pelo governo federal, uma reunião foi realizada em Tucumã (PA) com cerca de 70 lideranças e representantes dos kayapós mebengôkres que vivem na terra Kayapó. Tucumã é uma das cidades próximas ao território.

Servidores da Funai e do MPI (Ministério dos Povos Indígenas) participaram da reunião e ouviram dos indígenas falas favoráveis ao garimpo, com cobrança sobre o que seria planejado pelo governo a partir da expulsão dos invasores.

Um plano de trabalho foi discutido na reunião, e ficou acordado com o ministério que reuniões em Brasília, com a participação dos indígenas, vão detalhar projetos possíveis para a região.

Em nota, o MPI afirmou que o plano de gestão territorial da terra Kayapó, aprovado em assembleia geral em 2024, indica os caminhos para as aldeias, com fortalecimento das cadeias produtivas de castanha, cumaru, sementes, açaí e artesanato; etnoturismo; produção agrícola tradicional, com inclusão em programas de aquisição de alimentos; e sistemas agroflorestais.

A reunião feita com as lideranças, que representam cinco associações, buscou garantir “o diálogo direto com as comunidades e assegurar que a desintrusão ocorra com pleno respeito aos direitos e às decisões coletivas dos povos indígenas”, disse o ministério.

O plano de gestão territorial não inclui a atividade de garimpos, segundo Nilton Tubino, assessor da Casa Civil responsável pelas operações de desintrusão em terras indígenas. “A ideia é criar uma comissão para ir a Brasília debater e aperfeiçoar propostas.”

Segundo Tubino, não houve resistência a ações de destruição da estrutura do garimpo ilegal. Agentes estiveram em pontos de acesso de maquinários, controlados por indígenas, e já houve destruição de motores, acampamentos e balsas no rio Fresco.

Uma parte dos indígenas insiste na ideia de geração de créditos de carbono, mesmo após tentativas frustradas de empresas com cláusulas contratuais consideradas abusivas. Esses créditos são gerados e vendidos a empresas interessadas em compensar as próprias emissões de gases de efeito estufa a partir de iniciativas que evitam o desmatamento da floresta amazônica.

A operação faz um pente-fino do garimpo ilegal no território, o que é considerado complexo em razão da cooptação em algumas comunidades.
“Há muitos alertas de garimpos novos”, diz Tubino. Segundo ele, são 18 mil hectares de áreas de garimpo, entre ativos e inativos. Na terra yanomami, um território quase três vezes maior, eram 4.000 hectares, conforme o assessor da Casa Civil. “O estrago é muito grande.”

Tubino afirma que existe uma orquestração de fake news na região, onde é forte o apoio a atividades criminosas de garimpo, no sentido de que a operação busca ampliar a área da terra indígena ou mesmo desapropriar terrenos.

A Folha de S.Paulo esteve na Terra Indígena Kayapó em 2023, mais especificamente na aldeia-mãe, Gorotire, e na aldeia Turedjam, onde um novo cacique, João Kayapó, tomou posse com a perspectiva de distanciamento do garimpo ilegal de ouro.

A reportagem, publicada em junho de 2023, mostrou que as duas aldeias estavam cercadas por garimpos ilegais, que chegaram muito próximos das comunidades. A entrada de escavadeiras e caminhões só ocorria mediante pagamento de taxas a grupos de indígenas.

O garimpo desestrutura as comunidades e a organização política dos kayapós. Não há compartilhamento de ganhos com toda a comunidade. A água do rio Branco, o mais próximo de uma das aldeias, ficou barrenta, e ninguém pesca mais.

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