STF retoma julgamento do caso Débora, e definição de pena deve depender de Cármen Lúcia

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CÉZAR FEITOZA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta sexta-feira (25) o julgamento de Débora Rodrigues dos Santos, mulher que pichou a estátua “A Justiça” durante o 8 de janeiro. Ela responde por outros crimes relacionados aos ataques golpistas de 2023.

O ministro Luiz Fux anunciou que vai apresentar um voto divergente, com pena menor que os 14 anos sugeridos por Alexandre de Moraes. O voto definidor do julgamento deve ser dado pela ministra Cármen Lúcia.

Cármen tem acompanhado Moraes em todos os votos relacionados ao 8 de janeiro —seja nas penas mais altas, de 17 de anos, ou nas menores, de 1 ano. A tendência, segundo um ministro ouvido pela Folha, é de que a posição da ministra se mantenha e Débora seja condenada. O julgamento será virtual, com término previsto para 6 de maio.

Os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino foram os únicos a depositar seus votos antes do julgamento ser interrompido por Luiz Fux. Os dois recomendaram condenar Débora a 14 anos de prisão pelos crimes de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado contra o patrimônio público, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.

O último integrante da Primeira Turma do Supremo é o ministro Cristiano Zanin, presidente do colegiado. Ele defende em todos os processos uma pena menor que a sugerida por Moraes.

No caso de Débora, a tendência é que Zanin vote pela condenação a 11 anos de prisão, segundo um ministro do STF. Esse é o patamar que o presidente da Primeira Turma tem sugerido a todos os denunciados que comprovadamente tenham participado dos atos de 8 de janeiro, mas não quebraram algo durante os ataques.

Se os votos divergentes de Zanin e Fux forem confirmados, o desempate caberá a Cármen Lúcia. Três integrantes do Supremo afirmaram à Folha, sob reserva, serem mínimas as chances de mudança de voto de Dino e Moraes.

O caso de Débora é explorado pelo bolsonarismo na ofensiva pela anistia dos condenados pelos ataques às sedes dos Poderes. Aliados de Jair Bolsonaro (PL) tentam levantar a tese de que a mulher somente pichou a estátua com um batom e não deveria ser condenada.

A acusação da PGR (Procuradoria-Geral da República) contra Débora, porém, considera a ação individual da denunciada e a atuação multitudinária —um conceito do direito penal que se refere a crimes cometidos por multidão em tumulto.

A Procuradoria entende que, nesse tipo de crime, cada pessoa que atuou no ataque às sedes dos Poderes tinha o mesmo objetivo: forçar as Forças Armadas a darem um golpe de Estado contra Lula (PT).

Seguindo essa tese, Paulo Gonet pede a condenação de Débora não pelo fato de ter escrito na estátua a frase “perdeu, mané”. Para a PGR, a sentença se daria porque a mulher participou do ataque aos Poderes e incentivou uma ruptura democrática.

O ministro Luiz Fux anunciou que revisaria o processo de Débora porque acha que algumas penas impostas aos denunciados do 8 de janeiro estão excessivamente altas.

“Julgamos sob violenta emoção após a verificação da tragédia do 8 de janeiro. Eu fui ao meu ex-gabinete, que a ministra Rosa [Weber] era minha vice-presidente, vi mesa queimada, papéis queimados. Mas eu acho que os juízes na sua vida têm sempre de refletir dos erros e dos acertos”, disse Fux no fim de março.

O ministro disse que “debaixo da toga bate o coração de um homem” e defendeu a necessidade de que os ministros do Supremo tenham a “capacidade de refletir”.

“O ministro Alexandre, em seu trabalho, explicitou a conduta de cada uma das pessoas. E eu confesso que em determinadas ocasiões eu me deparo com uma pena exacerbada. E foi por essa razão, dando satisfação à Vossa Excelência, que eu pedi vista desse caso. Eu quero analisar o contexto em que essa senhora se encontrava”, disse

Como a Folha mostrou, a revisão de Fux tinha como objetivo identificar as circunstâncias em que Débora se encontrava. Um dos focos era conferir se a mulher havia invadido o prédio do Supremo durante os ataques.

A investigação da Polícia Federal e a denúncia da PGR, porém, não trazem provas da invasão de Débora aos prédios públicos.

A principal evidência de participação da cabeleireira nos atos golpistas foi um laudo de correspondência morfológica feito pela PF. Papiloscopistas da corporação usaram um sistema para comparar fotos do 8 de janeiro com uma imagem dela no banco de dados da polícia.

Débora foi transferida para prisão domiciliar em 28 de março. Ela estava detida no Centro de Ressocialização Feminino de Rio Claro, no interior de São Paulo, havia dois anos.

A flexibilização da prisão foi autorizada por Moraes após o ministro negar nove pedidos de liberdade para Débora.

Moraes argumentou na decisão que Débora ficou presa por dois anos —quase um sexto da possível pena de 14 anos sugerida pelo ministro. Ela tem filho menor de idade e é responsável pelos cuidados da criança, e o ministro considerou a situação.

Em depoimento ao Supremo, Débora Rodrigues pediu desculpas pela participação nos atos de 8 de janeiro e disse que pichou a estátua levada pelo “calor da situação”.

“Quando me deparei lá em Brasília com o movimento, eu não fazia ideia do bem [valor] financeiro e simbólico da estátua. Quando eu estava lá já tinha uma pessoa fazendo a pichação. Faltou talvez um pouco de malícia da minha parte, porque ele começou a escrita e falou assim: ‘Eu tenho a letra muito feia, moça, você pode me ajudar a escrever?’. E aí eu continuei fazendo a escrita da frase dita pelo ministro [Luís Roberto] Barroso”, disse.

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