MAELI PRADO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Em meio ao forte crescimento da economia e de olho na demanda por crédito, os bancos pequenos e médios aceleraram as captações com garantia do FGC (Fundo Garantidor de Créditos) e ultrapassaram, em dezembro de 2024, o patamar de R$ 1 trilhão em CDBs (Certificados de Depósitos Bancários), segundo dados do Banco Central.
É uma alta anual de 22,4% e um salto de 289% ante dezembro de 2019 nos chamados depósitos a prazo, nome técnico dos CDBs e RDBs (Recibos de Depósitos Bancários) -os dois títulos são quase idênticos, com a diferença que os últimos não são negociados no mercado secundário.
Em geral, os bancos menores captam recursos por meio desses papéis e emprestam para pequenas e médias empresas, que são seus principais clientes. Quando a economia está forte, o crédito costuma crescer bem acima do PIB (Produto Interno Bruto), e não por acaso o crescimento dos empréstimos concedidos pelos bancos pequenos e médios foi bastante significativo, de 153% entre 2019 e 2024.
“A economia cresceu muito nos últimos anos, estava bastante aquecida. E isso aumentou o crédito concedido pelos bancos, que por isso precisaram captar”, explica Luis Miguel Santacreu, analista de bancos da Austin Rating.
Após a queda de 3,3% em 2020, ano da pandemia, o PIB avançou 4,8%, 3%, 3,2% e 3,4% em 2021, 2022, 2023 e 2024, respectivamente, estimulado entre outros fatores pela expansão dos programas sociais.
O movimento também impulsionou as emissões de CDBs e as operações de crédito nos bancos grandes, apesar de em ritmo menor -nesse caso, o crescimento foi de 135% nos depósitos a prazo e 70% nos empréstimos em relação aos números de 6 anos atrás.
Além da economia aquecida, os bancos também foram estimulados a captar mais pelo salto na garantia do FGC, que em 2014 subiu de R$ 70 mil para R$ 250 mil por CPF, movimento que beneficiou as instituições financeiras de menor porte.
Por fim, o salto na emissão de CDBs tem a ver com a ampliação do escopo das plataformas de investimentos. De acordo com dados do Banco Central, entre o segundo semestre de 2019 e o segundo semestre de 2023 -últimos dados disponibilizados- as captações por meio das plataformas cresceram 246,5%.
MAIS RISCO, MENOS CONCENTRAÇÃO
O forte crescimento acontece a despeito de normas editadas pelo Banco Central nos últimos anos para restringir a disparada de investimentos alavancados pela proteção do FGC. Como mostrou a Folha, as medidas são consideradas insuficientes por grandes instituições financeiras, que negociam com o BC uma reforma no modelo de contribuição do fundo em meio à crise do Banco Master.
Essa movimentação gerou reação da Abranet (Associação Brasileira de Internet), que reúne mais de 150 fintechs, plataformas digitais de investimento e outras empresas do setor financeiro digital.
A entidade criticou qualquer tentativa de mudança no fundo sem um amplo debate público.
“O benefício de um seguro maior é que isso criou maior condição de competitividade para os bancos pequenos e médios. Os bancos grandes têm uma espécie de garantia implícita de serem ‘too big too fail’ [grandes demais para falirem], e o seguro do FGC mitiga essa diferença entre pequenos e grandes”, diz Rafael Schiozer, professor titular de finanças da FGV EAESP.
Ou seja, se por um lado ficou mais arriscado, do outro ajudou na desconcentração do mercado. Se em 2019 os bancos médios tinham 19,3% de participação nos depósitos a prazo, essa fatia cresceu para 28,4% no final de 2024, segundo números do BC.
“Não acho que a maioria dos bancos médios foi oportunista com o FGC”, aponta Santacreu, da Austin Rating. “Tanto que estão preocupados, estão conversando com o BC, porque sabem que a situação do Master pode desfavorecê-los”.
Na avaliação dos especialistas, a maior parte dos bancos médios em geral se diferencia do caso do Master, que captou recursos pagando taxas altíssimas nos seus CDBs enquanto investia em ativos arriscados -em dezembro de 2024, o banco possuía R$ 58,5 bilhões em depósitos a prazo, segundo dados do BC.
“Emitir CDB é mesmo o que o banco médio tradicionalmente faz, porque em geral não possuem volume de depósitos a vista. Eles captam e destinam recursos principalmente para crédito”, diz Santacreu. “Emitir muito não é um problema em si. O problema está no que o Master fez: captar muito com CDB e depois direcionar não para crédito, mas para investimentos de risco muito maior, como precatórios [títulos de dívidas judiciais].”
Para Schiozer, os bancos pequenos e médios vêm emitindo com responsabilidade, mas cabe cautela por parte do investidor na hora de aplicar em um CDB com taxa muito elevada. “Quanto mais os bancos oferecem nos CDBs, maior o retorno que precisam ter, às vezes em ativos mais arriscados, para dar conta de pagar essas taxas aos investidores”, explica.