Pelo grafite em parada de ônibus, artista da Ceilândia denuncia violências

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Por Danyelle Silva e Mayara Mendes
Agência de Notícias CEUB

Artista urbano nascido e criado na Ceilândia, Fernando Elom enxerga no grafite uma missão: dar voz a quem já foi silenciado e hoje tem a oportunidade de dizer, através da arte, quem é.

Ao escolher os temas de seus trabalhos, o artista busca iluminar realidades muitas vezes ocultas, fazendo da arte um instrumento de consciência e denúncia.

Seus grafites, principalmente nas paradas da Ceilândia, abordam temas urgentes como o feminicídio, a violência doméstica e a desigualdade de gênero.

“Não vejo o grafite exatamente como resistência, mas como responsabilidade social. O grafite faz parte do hip hop, que tem quatro elementos: break, rap, DJ e grafite. É um movimento com raiz social. Gosto de abordar questões como o feminicídio e a violência doméstica, trazendo essas realidades para a arte. É uma forma de provocar reflexão e dar visibilidade ao que muitas vezes é ignorado”, diz Elom.

Preconceitos

Apesar do avanço da arte urbana, o artista reconhece que o grafite ainda enfrenta barreiras. Muitas vezes, é visto de forma fragmentada, longe de sua origem social.

“Infelizmente, a política ainda trata a arte urbana de forma segmentada. A esquerda costuma estar mais presente nas periferias, criando projetos e apoiando a cultura. Já a direita, muitas vezes, ignora essa realidade”, afirma Elom.

Ainda assim, o artista acredita no poder de romper fronteiras. Já levou seus grafites da Ceilândia a escolas particulares no Lago Sul, onde encontrou receptividade e admiração dos alunos.

“Já tive várias experiências disso. Levei o grafite da Ceilândia até uma escola particular no Lago Sul. As crianças nunca tinham visto o grafite da periferia de perto. Levei esse universo até elas, e o respeito foi incrível. Isso mostra que o grafite rompe barreiras sociais e culturais.”

Ele conta que, em áreas mais nobres de Brasília, como o Plano Piloto, muita gente ainda espera ver um grafite “bonitinho”, “decorativo”. Mas isso está mudando. “As pessoas estão começando a entender que o grafite não é só enfeite — é ferramenta de transformação”, afirma.

Igualdade

Quando perguntado sobre qual símbolo gostaria de eternizar em um mural, Elom é direto: a igualdade social. Para ele, a arte de rua deve transcender ideologias e fronteiras partidárias.

“Sem vermelho para a esquerda ou azul para a direita. A arte de rua não deve carregar bandeiras políticas ou religiosas. A rua pede o tema: se for sobre o roubo de celular, é isso que vai ser retratado. Não deve ser uma crítica a um político ou apoio a outro”, afirma.

Para Elom, o lugar ideal para sua arte é o centro da Ceilândia. Mais do que ocupar o espaço urbano, ele quer mostrar que a arte nasce na periferia, mas tem potência para dialogar com todos os cantos da cidade.

Brasília

Ao falar sobre Brasília, Elom disse: “Brasília é Ceilândia.” Sem a força e a presença da periferia, diz ele, a capital seria vazia, quase patética. O Plano Piloto é o coração da cidade, e a Ceilândia é quem respira por ela — diferentes formas, mas igualmente importantes.

“Brasília é uma cidade turística, política e arquitetônica. Mas, pra mim, Brasília é Ceilândia. A Ceilândia movimenta Brasília. Sem ela, Brasília seria uma cidade patética. A Ceilândia tem poder no comércio, no esporte, na cultura. É o pulmão da cidade, enquanto o Plano Piloto é o coração.”

O artista também defende que a capital não pode ser vista apenas como um cenário de decisões políticas ou de crescimento econômico.

“Eu gostaria que as pessoas entendessem que Brasília não é só política. Ela é cultura, é periferia, é povo”, finalizou.

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