
A ação foi da Advocacia Geral da União (AGU). Mulher e os três filhos do auditor fiscal falecido Rodrigo Silveirinha ainda pode recorrer da decisão. Rodrigo Silveirinha
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Os herdeiros do auditor fiscal Rodrigo Silveirinha Correa, um dos envolvidos no escândalo conhecido como Propinoduto, em 2003, terão que devolver R$ 287 milhões à União. (Entenda mais adiante na reportagem o que foi o Propinoduto)
O valor corrigido com juros e com base na inflação até abril de 2024 corresponde ao dinheiro depositado por Silveirinha em um banco na Suíça para ocultar o patrimônio desviado dos cofres públicos entre 1999 e 2002.
A decisão é da 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, a partir de uma ação da Advocacia-Geral da União (AGU).
Rodrigo Silveira morreu em agosto de 2023. A viúva e os três filhos do auditor fiscal podem recorrer da decisão.
O valor a ser devolvido ainda pode aumentar. Os valores contabilizados são até abril de 2024. Falta ao processo a atualização de juros e a inflação referente ao restante de 2024 e esses quatro meses de 2025. O cálculo atualizado só será incluído na ação quando não houver mais chance de os réus recorrerem.
Na sentença, o juiz Marcelo Leonardo Tavares concordou com o argumento da AGU de que o “patrimônio obtido de forma ilícita seja transferido aos herdeiros”, isto é, que a morte de Silveirinha não tem o efeito de evitar as consequências cíveis dos crimes praticados, explica a AGU.
“A ausência de trânsito em julgado […] não afasta o dever de ressarcir, a ser suportado pelo espólio, sobretudo quando houve o reconhecimento pelas instâncias ordinárias e pelo STJ de que as condutas criminosas causaram dano ao patrimônio da União”, afirma o juiz federal Marcelo Leonardo Tavares em trecho da decisão.
O dinheiro segue bloqueado na Suíça enquanto o processo estiver em andamento. Assim, os recursos não podem ser acessados atualmente pelos herdeiros de Silveirinha.
O advogado da União Eugenio Muller Lins de Albuquerque, da Coordenação de Defesa da Probidade da 2ª Região, explicou que “essa importante vitória não somente garante o retorno dos valores aos cofres públicos, mas também reafirma o compromisso da AGU com o combate ao enriquecimento ilícito e à corrupção”.
Rodrigo Silveirinha era chefe do núcleo de fiscalização da Fazenda estadual e responsável por enviar, ilegalmente, US$ 8,9 milhões para a Suíça
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A defesa dos herdeiros de Silveirinha considera ilegítimo o processo da União. Eles alegam que só poderiam ser incluídos em um processo após a partilha dos bens e, como não houve partilha, isso só poderia ocorrer depois da herança recebida.
“A União não foi a suposta prejudicada por RODRIGO, que era fiscal da Receita do Estado do Rio de Janeiro, e não auditor da Receita Federal. Assim sendo, eventuais atos ilícitos perpetrados por ele poderiam prejudicar o Estado do Rio de Janeiro, mas nunca a União. Sob a ótica de enriquecimento ilícito, a conclusão seria a mesma: a parte prejudicada só poderia ser o Estado do Rio de Janeiro”, informou a defesa dos herdeiros de Silveirinha
A defesa explica ainda que Rodrigo Silveirinha morreu antes do trânsito e julgado da sentença condenatória na área criminal, o que é visto por eles como suficiente para que a “União comprove suas alegações. Os advogados explicam ainda que não se comprovou a titularidade da conta “supostamente aberta por Rodrigo na Suíça e nem que houve enriquecimento compatível com a sua atuação”.
“Na ação de improbidade movida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, que tramita há mais de vinte anos, ainda não se concluiu a fase instrutória, estando pendente expedição de carta rogatória para o Banco Suíço L’Union Bancaire Privée, requerendo informações acerca da abertura de conta, com a apresentação de documentos que comprovem sua titularidade”, explicou o advogado no processo.
O escândalo do Propinoduto
Investigações revelaram, em janeiro de 2003, que fiscais da Fazenda estadual e da Receita Federal cobravam propinas de empresários e depositavam o dinheiro em contas na Suíça. O total encontrado no banco suíço foi de US$ 33, 4 milhões.
As investigações começaram depois que autoridades suíças avisaram o governo brasileiro de que um grupo de pessoas do Rio depositou altos valores em um banco de lá.
O fiscal Rodrigo Silveirinha, subsecretário de Administração Tributária no governo de Anthony Garotinho (1999 a abril de 2002), foi condenado a 15 anos de prisão em primeira instância. Na conta em seu nome há US$ 8,7 milhões, e sua movimentação foi de US$ 20 milhões, de acordo com os investigadores.
Silveirinha controlava a arrecadação de 70% dos impostos do Rio. Era o chefe de um departamento responsável por fiscalizar as 400 maiores empresas do estado.
Mas os fiscais só ficaram presos por 1 ano e dois meses. O dinheiro da corrupção está retido na Suíça até hoje. Com uma infinidade de recursos, o processo se arrasta até hoje nos tribunais brasileiros.
Nos últimos anos de vida, Silveirinha era taxista, mas não abandonava a mansão na Zona Oeste do Rio. Ele morreu em 10 de agosto de 2023, de câncer no pâncreas. Os advogados dele entraram, na época, no processo informando a morte do réu e pedindo a extinção da punibilidade.
O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, na ocasião, num despacho do ministro André Mendonça, a inexistência de trânsito em julgado em relação a Rodrigo Silveirinha, ou seja, não existe decisão final. E assim, abriu a brecha para os herdeiros reivindicassem a fortuna que está na Suíça.
Propinoduto: crimes estão perto de prescrever e integrantes podem ficar sem punição