Festival de Tiradentes: vencedor do maior concurso de fotojornalismo do mundo revela detalhes de obras que retratam seca na Amazônia


O fotógrafo peruano Musuk Nolte foi o ganhador da categoria “Histórias” na América Latina, do World Press Photo, em 2025. Musuk Nolte fotografado em Tiradentes no dia do anúncio dos vencedores do World Press Photo
Divulgação/Leo Lara
Quando Musuk Nolte viu seu nome publicado na lista dos vencedores de 2025 da maior premiação de fotojornalismo do mundo, o World Press Photo, ele estava em Tiradentes, em Minas Gerais.
O fotógrafo peruano comemorou a segunda vitória no concurso — a primeira foi em 2023, com o trabalho “Derramamento de Óleo em Lima” — com outros artistas, que já se tornaram amigos e também estavam na cidade histórica para participar da 14ª edição do Festival de Fotografia de Tiradentes.
Nolte foi um dos convidados do festival e, no sábado (29), foi entrevistado pelo escritor Joca Reiners Terron, no Centro Cultural Yves Alves. O espaço estava lotado de amantes da fotografia que queriam conhecer mais sobre o artista premiado.
Joca Reiners Terron entrevista Musuk Nolte no Festival de Fotografia de Tiradentes
Fernanda Torquato
Durante a entrevista, o público pode ver fotografias produzidas por Nolte ao longo dos anos e conhecer mais detalhes da vida do fotógrafo. Ele é filho de uma antropóloga, convive desde pequeno com questões ambientais e se tornou referência na combinação de fotografia documental e artística para explorar questões sociais, incluindo memória e degradação ambiental.
Parte do evento foi dedicada ao trabalho premiado na categoria “Histórias” do World Press Photo, intitulado “Secas na Amazônia”. A série mostra a seca severa que atingiu a região amazônica brasileira no fim do ano passado (veja fotos mais abaixo).
Expedição
Em uma entrevista exclusiva ao g1, Nolte contou detalhes da cobertura. Segundo ele, o trabalho foi feito em parceria com o fotógrafo Rafael Alves, que fez uma ponte entre ele e os moradores mais afetados pela seca em Manaus e cidades do entorno.
Foram dez dias de captação de imagens e cerca de duas mil fotografias produzidas. A etapa de escolha e edição das dez fotografias enviadas à competição durou uma semana.
“Tive muita dúvida entre enviar as fotografias coloridas ou em preto e branco e decidir entre as imagens mais descritivas ou mais metafóricas, mas consegui fazer uma boa mescla”, disse Nolte.
Sobre a participação no Festival de Fotografia de Tiradentes, Nolte disse que estava feliz em estar ali.
“Os festivais que são feitos com tanto carinho, amor e propósito são espaços muito nobres, são espaços para encontrar com amigos e ampliar a relação com fotografia. [O Festival de Fotografia de Tiradentes] é um festival com muita alma”, destacou o fotógrafo.
‘Secas na Amazônia’
A série de fotografias premiada mostra o retrato de uma região da Amazônia brasileira que enfrentou, no fim do ano passado, a maior seca da história. São imagens aéreas que mostram leitos dos rios secos e barcos encalhados, mas também fotografias de pessoas que foram diretamente impactadas pela seca.
“Secas na Amazônia”, trabalho vencedor da categoria “Histórias” do World Press Photo 2025
Musuk Nolte
Uma delas é de um jovem que precisava andar dois quilômetros no leito do Rio Solimões seco para levar comida para a mãe que mora em uma aldeia de Manacapuru. Antes da seca, a comunidade era acessível por barco.
“Secas na Amazônia”, trabalho vencedor da categoria “Histórias” do World Press Photo 2025
Musuk Nolte
As fotografias de Musuk também deixam claro o impacto para comunidades inteiras, que ficaram isoladas por causa da baixa das águas. Por lá, muitas casas flutuantes desabaram e os canais usados para navegar no Rio Amazonas, não são mais viáveis. 
“Secas na Amazônia”, trabalho vencedor da categoria “Histórias” do World Press Photo 2025
Musuk Nolte
O fotógrafo ainda revelou que diante de tanta seca, perdeu a noção de que estava na Amazônia e se sentiu como se estivesse em uma praia, mas ao mesmo tempo percebeu o impacto de que estava pisando no fundo de um rio.
‘Amazônia, inverno e verão’ e ‘Sub/Emerso’
O trabalho de Musuk Nolte tem um diálogo direto com duas exposições do Festival de Tiradentes: as dos fotógrafos brasileiros Walter Firmo e Bob Wolfenson.
Dentro de uma exposição coletiva intitulada “Ecosofias”, Walter Firmo expõe “Amazônia, inverno e verão”, uma série de fotografias feitas publicadas originalmente na revista Realidade, em janeiro de 1973, na qual retrata famílias do município de Prainha, às margens do Rio Amazonas, no Pará.
Firmo acompanha as mesmas pessoas e as fotografa nos mesmos lugares, com os mesmo ângulos e enquadramentos, durante o verão (na vazante) e o inverno (cheia) amazônicos. Dessa forma, ele faz um panorama das mudanças climáticas nas paisagens e na vida dos moradores ribeirinhos, que é fortemente marcada pela presença das águas das chuvas e do rio.
“Amazônia, inverno e verão”, do fotógrafo Walter Firmo
Já Bob Wolfenson apresenta “Sub/Emerso”, uma exposição que reúne fotografias atingidas pelo alagamento do estúdio de Wolfenson em 2020. Segundo o fotógrafo, 80% do acervo de 35 anos de fotografias analógicas foi atingido.
No texto de abertura da exposição, ele confessa que rasgou e dispensou algumas fotografias, mas que em algum momento decidiu resgatá-las.
“Uma certa injustiça tomou conta desse processo; as imagem recém-dispensadas começaram a fazer falta, e as que estavam condenadas, a caminho de serem destruídas, ressuscitaram. Aos meus olhos, ganharam um novo sentido, uma nova beleza. Um escorrimento impregnado na superfície delas, criou uma ‘sobrememória’, pois elas em si já eram lembranças de outras épocas”, disse Bob.
Entre as fotos que “ressuscitaram” estão os retratos de Caetano Veloso com sua sobrancelha levantada, o nu de Fernanda Torres e a pose austera de Oscar Niemeyer, que agora, com as marcas da lama, para o fotógrafo, ganharam materialidade e ficaram ainda mais interessantes.
“Ganharam uma nova graça, um novo sentido”, finalizou Bob.
Retrato de Fernanda Torres depois da enchente no estúdio do fotógrafo Bob Wolfenson, em 2020
Fernanda Torquato
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