
(Foto: DesignDraw DesignDrawArtes/ Pixabay)
Não há como fugir das ferramentas de Inteligência Artificial (IA). Elas estão por toda a parte. O ponto é saber quando e como usá-las e, principalmente, onde foram usadas. E é aqui que a InfoMoney escorregou…
Em matéria publicada no dia 01/05, a revista especializada em investimentos e negócios publicou uma foto de Lady Gaga entregando pessoalmente pizzas aos fãs acampados na porta do Copacabana Palace à espera do seu show no sábado. O grande problema é que a foto foi gerada por IA e publicada como um registro real do momento, foi aí que a notícia “terminou em pizza”. No dia seguinte, a revista publicou uma retratação assumindo e esclarecendo o erro.
A diva do pop de fato mandou entregar 80 caixas de pizza, mas não as entregou pessoalmente, conforme a imagem publicada pela InfoMoney fez parecer. Ação que é capaz de abrir uma caixa de pandora de questionamentos que vão desde a qualidade do jornalismo (será que uma empresa de comunicação controlada pela XP Investimentos faz jornalismo?), até o uso irresponsável da IA.
Se uma empresa de investimento faz ou não jornalismo é uma discussão que dá ‘pano pra manga’, por isso fica a deixa para os futuros doutorandos. Mas, o ponto que interessa aqui é o uso da IA. Se já havia o alarde sobre o uso de ferramentas para gerar textos, isso fica ainda pior quando pensamos que ela é capaz de fazer imagens e vídeos.
Isto é, o que considerávamos incontestável, agora não é mais, e perdemos mais uma salvaguarda que nos dava segurança. Se não podemos confiar em textos e nem em imagens, o que poderá nos salvar? A questão de fundo é que a “era do ChatGPT” se conecta a indústria da desinformação, fake news e fraude comandada por um oligopólio digital (as chamadas “big techs”), lideradas pela Alphabet (Google), Amazon, Apple, Meta (Facebook) e Microsoft. Note, todas com sede física nos Estados Unidos.
A resposta poderia ser idílica como nos delírios de muitos textos que colocam o jornalista como o gatekeeper ou até mesmo o “cão de guarda” dos cidadãos ‘de bem’, mas nitidamente essa não é a melhor estratégia. Os cidadãos talvez não precisem de um cão de guarda, muito menos de um porteiro, eles precisam saber se defender, distinguir entre uma informação falsa e a verdadeira (assim como e, principalmente, os jornalistas).
Saber se defender significa conhecer o potencial de IA, aprender a desconfiar e a buscar meios de chegar aos fatos. Olha que coincidência, parecem tarefas para jornalistas!
Realmente, vivemos um período em que todos podem ser jornalistas. Mas, sabemos que não o são. Cabe a quem escolheu essa profissão se adequar ao tempo presente, buscar incansavelmente a checagem e se tornar referência quando se trata de ser um porto seguro sobre os fatos. Para além disso, é necessário um amplo letramento midiático (educação para o uso da mídia) que extrapola o jornalismo e engloba a sociedade, ressignificando o consumo de informação, que se dá hoje predominantemente pelas chamadas “redes sociais”.
O caso da InfoMoney foi um alerta que não apenas abre mas arregala os olhos para a IA: ela está presente e seu uso crescerá cada vez mais. Entretanto, calma! Isso não será um problema se os jornalistas a colocarem no lugar dela, como uma ferramenta para potencializar o seu trabalho de busca e escrita dos textos, sempre checando as informações com fontes confiáveis.
É possível afirmar que a enxurrada de desinformação feita com IA tende a ser cada vez maior à medida que a ferramenta se populariza, se tornando um oceano. E contra ela, o “cão de guarda” ou “porteiro” não tem força, tampouco utilidade. Por isso, a proposta é tornar o jornalismo um farol, construído sobre terra firme para orientar aqueles que buscam orientação, ou, então, como uma pizza de excelente qualidade que vem em boa hora para quem está acampado há dias na frente do Copacabana Palace.
Publicado originalmente em objETHOS.
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Mariane Nava é Doutora em Jornalismo pela UFSC; é pesquisadora associada ao objETHOS.
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