
(Foto: Bruce Emmerling por Pixabay)
É comum que no imaginário das pessoas o jornalista seja aquele profissional que trabalha em grandes redações, sempre barulhentas com telefones tocando e gente apressada andando de um lado para o outro. Talvez esse pensamento fizesse sentido em um tempo não tão distante, no qual grandes redações eram praticamente um organismo vivo, funcionando quase como uma fábrica fordista com cada um exercendo o seu papel dia após dia.
Assim como acontece em qualquer área de trabalho, funções e atribuições dentro de uma redação se modificaram, e algumas deixaram de existir. A figura do pauteiro, por exemplo, já não existe mais, pelo menos não como função única. O avanço da tecnologia permite essas modificações no dia a dia do jornalista que, por sua vez, torna-se um profissional multitarefa.
O intuito desse texto não é romantizar o trabalho do jornalista sem a tecnologia que temos hoje, nem mesmo dizer que antigamente era muito melhor. Aliás não faria muito sentido, já que não posso ser saudosista de um período no qual sequer cogitava ser jornalista. O meu objetivo é questionar a individualização da prática jornalística, que atualmente é muito centralizada na figura do profissional multitarefa. Esse, por sua vez, escreve, edita, filma, fotografa, diagrama, publica e entrevista. Trabalhando, muitas vezes, acompanhado apenas de um celular e um computador.
Além do acúmulo crescente de funções, são somadas à equação as mudanças substanciais do trabalho graças à evolução do digital. No livro “O privilégio da servidão”, o sociólogo Ricardo Antunes destaca que a instabilidade e a insegurança são marcas determinantes das novas modalidades do trabalho. Esse, por sua vez, passa a ser constituído quase como algo sem contrato, no qual não existe previsão de jornada a seguir nem direitos trabalhistas garantidos. Basta apenas que o funcionário esteja online para atender às demandas. Assim, para Antunes, aumenta-se o processo de “uberização” e “pejotização”, no qual trabalhadores se tornam escravos do digital.
Ao retornar para o campo do jornalismo, exemplos mostram que a necessidade sempre maior do profissional multitarefa e a ideia de Antunes quanto ao trabalho digitalizado colaboram para uma precarização veloz da categoria. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), juntamente com sindicatos pelo Brasil, adota uma postura de combate à pejotização, constantemente recorrendo ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) quando direitos trabalhistas de jornalistas são desrespeitados.
Note que o combate a essa prática parte da coletividade. Não é necessário ir a fundo na história para descobrir que direitos trabalhistas são conquistados a partir da luta coletiva dos trabalhadores. Entretanto, a diminuição de contingente nas redações e a individualização da atividade jornalística distanciam o indivíduo do coletivo. Retomando o pensamento de Antunes, à medida que crescem os enxugamentos e as reestruturações, aumenta-se a precarização. Além disso, ao mesmo tempo em que existem menos pessoas nos postos de trabalho, há mais trabalhadores e trabalhadoras atuando sem os devidos direitos.
Desse modo, no jornalismo, a lógica da individualização, do profissional multitarefa e da produtividade acima de tudo tornam-se obstáculos à conquista e à manutenção de direitos trabalhistas. A precarização, conforme Antunes, é um processo que pode crescer ou diminuir dependendo da capacidade de resistência dos trabalhadores. Essa resistência se torna mais forte se feita de maneira coletiva.
Referência
ANTUNES, Ricardo. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2018.
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Vitor Ventura é Graduando em jornalismo no Centro Universitário UDF, no Distrito Federal.
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