Alta da Selic reflete preocupação do BC em controlar inflação, dizem analistas

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GUSTAVO SOARES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A decisão unânime do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central de elevar a taxa básica de juros da economia em um ponto percentual, de 13,25% para 14,25% ao ano, era esperada e evidencia a preocupação da autarquia em controlar a inflação, dizem analistas.

No comunicado desta quarta-feira (19), o comitê sinalizou que os juros vão continuar subindo na próxima reunião, em maio, e que pretende fazer uma nova alta de menor intensidade.

Como justificativa, citou a continuidade do “cenário adverso” para a convergência da inflação, a elevada incerteza e as defasagens do efeito da política de juros sobre a economia.

Embora o Copom não tenha se comprometido com a intensidade do ajuste, investidores falam em uma alta de 0,50 ponto -desde janeiro, o boletim Focus do BC estima que Selic atinja 15% neste ano.

“Tanto a decisão de aumentar a Selic em um ponto percentual quanto o conteúdo do comunicado não trouxeram nenhuma surpresa em relação às expectativas dos agentes, o que significa que, muito provavelmente, o mercado vai reagir positivamente”, disse José Marcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.

Para o economista, o colegiado indicou que a resiliência da atividade econômica do país exige que a política monetária se torna ainda mais contracionista.

Desde janeiro, houve uma piora nas expectativas de inflação, em especial para 2026. Segundo o boletim Focus divulgado na segunda (17), os analistas esperam que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) termine o próximo ano encostado no teto da meta de 4,50% perseguida pelo BC, em 4,48%. Para 2025, a estimativa é de alta de 5,66%.

“Ao afirmar que vai fazer um ajuste de menor magnitude na próxima reunião, que deve ser de 0,5 ponto percentual, o Banco Central não terá ainda condições de sinalizar um encerramento do ciclo. O comunicado atende a visão de que há um compromisso com o alcance da meta de inflação, e acho que isso não deve ser colocado em xeque nesse momento”, disse André Muller, estrategista e economista-chefe da AZ Quest.

O alvo central da meta do BC é 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Isso significa que a meta é considerada cumprida se oscilar entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto).

“Conquistar a confiança dos agentes de que teremos uma equipe 100% técnica, comprometida com as metas de inflação e sem influências políticas, é de extrema relevância para uma melhor condução da política monetária no país. Caso o cenário adverso persista, podemos ver a taxa Selic acima de 15% ao ano. ainda neste primeiro semestre”, disse Lucas Constantino, estrategista-chefe da GCB Investimentos.

Miguel Torres, presidente da Força Sindical, criticou a decisão em nota, chamando-a de “extorsão” e afirmando que ela frustra os trabalhadores, prejudica as campanhas salariais, dificulta a produção e compromete o desenvolvimento.

“Os juros continuam proibitivos e o Brasil perde outra chance de apostar na produção, no consumo e na geração de empregos”, disse.

No caso dos investimentos, o aumento da Selic favorece ativos atrelados ao CDI, como títulos pós-fixados, que acompanham essa valorização de forma quase imediata. Para Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, a duração da alta é uma questão-chave para a tomada de decisões.

“O grande dilema é se o Banco Central vai elevar a Selic até 15% e, se isso ocorrer, por quanto tempo manterá essa taxa elevada. Esse fator será determinante para o comportamento dos ativos de renda fixa e variável nos próximos meses”, disse.

Com a elevação desta quarta, os juros se igualaram ao patamar observado em outubro de 2016, durante a crise econômica do governo Dilma Rousseff. Na época, também para combater uma inflação resistente, a taxa básica ficou estacionada em 14,25% durante um ano e três meses, a partir do fim de julho de 2015, atravessando o impeachment da petista.

No radar dos economistas agora está a preocupação com a política fiscal expansionista do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em meio à queda de popularidade do presidente, foram apresentadas medidas de estímulo à economia, como o novo consignado privado para trabalhadores do setor privado e a liberação do saldo do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

No caso da proposta de ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 por mês, há temor pela resistência do Congresso à proposta de compensação apresentada pelo Executivo de cobrar um imposto mínimo dos ricos.

Sobre a questão fiscal, o colegiado do BC repetiu o texto usado no comunicado de janeiro, dizendo que segue acompanhando “com atenção” os impactos sobre a política monetária. “A percepção dos agentes econômicos sobre o regime fiscal e a sustentabilidade da dívida segue impactando, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes”, afirmou.

O Copom volta a se reunir nos dias 6 e 7 de maio.

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