Literatura e Jornalismo: a interdisciplinaridade no combate ao esquecimento

(Foto: Trương Quốc/Pixabay)

A interdisciplinaridade entre diferentes áreas do saber é, no século XXI, uma das principais qualidades de qualquer profissional; saber mobilizar seus conhecimentos em favor de uma sociedade mais justa e ética, propondo reflexões a toda e qualquer pessoa.

Acredito que dois campos do saber, quando associados são, em meio à Era da Desinformação na qual vivemos, importantes armas para entender a importância de termos ao nosso lado, como cidadãos, a Verdade e, principalmente, os profissionais que fazem com que ela ainda exista em meio a tantas fake news que nos bombardeiam a todo momento, por todos os cantos. Esses campos são o Jornalismo e a Literatura.

Para além da defesa da Verdade e da checagem constante de fatos a serem noticiados à população, o Jornalismo tem em si a também função de rememoração de fatos passados. Somos quem somos porque a História nos guiou até aqui. Há períodos e acontecimentos históricos que, apesar de serem marcados pela tortura e repressão, não podem ser postos de lado até que caiam no esquecimento. Pensemos no período da Ditadura Militar para clarear o que quero dizer.

A Literatura, por sua vez, por situar-se no campo artístico, trata de assuntos complexos, como o combate ao esquecimento. Porém, o faz por vias da ficção, que demanda um leitor atento, que veja para além do primeiro plano de significação das palavras para compreender o que realmente certa obra literária traz à tona. Ou seja, ao contrário do Jornalismo, que privilegia a clareza acima de tudo, a Literatura discute temas reais, assim como o primeiro, por meio de camadas de interpretação (Jakobson).

O livro que me levou a essa reflexão foi “O Vendedor de Passados”, de José Eduardo Agualusa. Uma obra de Literatura Africana que vem ganhando espaço apenas agora em meio aos cânones literários, chegando, inclusive, à prova de um dos principais vestibulares do Estado de São Paulo, o da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Agualusa discute nesse enredo, como o próprio título já nos leva a induzir, a possibilidade da venda de passados, ou seja, de reconstrução e modificação da História de um país, escolhendo quais fatos e acontecimentos fazem parte dela, enquanto outros podem ser jogados ao poço do Esquecimento.

Em uma primeira leitura, podemos achar que se trata apenas de um personagem ficcional que escreve passados para aqueles que chegam a Angola. Porém, nisso, há muito para se refletir. Quem escolhe quais fatos e acontecimentos devem ser rememorados e esquecidos? A quem isso beneficia? Não se trata, afinal, de uma arma para que aqueles que já detêm o poder o mantenham por ainda mais tempo?

A partir dessas questões que nasceram em minha mente pensei, mais uma vez, na importância do Jornalismo como ciência, seja no âmbito local ou não. Através de reportagens ou séries especiais, comumente produzidas por telejornalistas, somos relembrados de nosso próprio passado, não permitindo que ele seja “reescrito” por qualquer outra pessoa. Seja por notícias sobre personagens importantes de nossa região, sobre atividades comerciais que fazem com que nossa cidade se destaque em meio às vizinhas, ou ainda por produções que celebrem efemérides. É a partir de produções jornalísticas que somos postos em contato com o passado, relembrando-o a partir da Verdade, da forma como ele realmente aconteceu. Parece-me que pelo Jornalismo somos capazes de nos encontrarmos conosco, assim como a Literatura, por caminhos distintos, também tem esse poder.

Em meio aos bombardeios de fake news a que somos expostos todos os dias, é preciso que pensemos fora da caixa, vejamos além da superfície. A interdisciplinaridade entre o Jornalismo e a Literatura é uma das maiores armas que temos ao nosso lado para a construção de uma consciência crítica sobre aquilo que ocorre a nossa volta, a partir do contato com a Verdade e os diferentes níveis de reflexão ao quais podemos alcançar.

***

Ana Julia Storti Rosendo é Estudante de Letras – Português e Inglês na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

 

 

O post Literatura e Jornalismo: a interdisciplinaridade no combate ao esquecimento apareceu primeiro em Observatório da Imprensa.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.