Uiramutã, lugar bom para se viver

Vejam vocês. Circula há algum tempo em jornais e redes socias que nosso pacato e aprazível Uiramutã é a pior cidade do país para se viver porque, segundo tal “pesquisa”, apresenta os piores índices de qualidade de vida e desempenho socioambiental. Ou seja, pela “pesquisa” moramos em um lugar extremamente poluído e violento, onde reinam a fome e a miséria.
Então, diante de tal “pesquisa”, eu, como jornalista e morador do Uiramutã há mais de quatro anos, me senti na obrigação de averiguar dados e números reais, apontados pela fonte mais segura desta nação, o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Mas antes de colocar em “xeque” a tal “pesquisa”, que macula a imagem do nosso querido Uiramutã, vou primeiro falar do seu responsável. Trata-se da Escola Sloan de Administração do MIT (MIT Sloan School of Management), liderada por Michael Porter e Scott Stern, autores da Social Progress Imperative, uma organização internacional batizada de Índice de Progresso Social (IPS), responsável pela tal “pesquisa”.
Antes, bom observar que este IPS não apresenta nenhuma credibilidade internacional. Então, como acreditar em uma “pesquisa” feita por dois norte-americanos, que moram lá na “caixa-prego” e que nunca pisaram no Uiramutã? Só este fato já põe em “xeque” a tal pesquisa.
Mas vamos lá. O relatório do IPS coloca Uiramutã no último lugar do ranking nacional, com pontuação de 37,63 em uma escala que atinge até 100, por apresentar uma série de dificuldades enfrentadas pela nossa população nas áreas de Educação, Saúde, Social, Infraestrutura e prestação de serviços públicos.
Só que os últimos dados do IBGE, a fonte de informação mais segura do Brasil, desmentem tal “pesquisa”. Senão, vejamos. Pelo último Censo realizado em 2022, Roraima apresentou taxa de abandono escolar de 0,6%. Já no Maranhão, Piauí e Bahia, no Nordeste, a taxa é superior a 2%. Com índices inexpressivos, Uiramutã sequer apareceu no quesito Evasão Escolar, principalmente na Educação Básica, ou seja, quase 100% de nossas crianças estão na escola.
Vale ressaltar ainda neste tópico que nos últimos quatro anos, o Executivo municipal reformou, construiu e equipou dezenas de escolas em várias comunidades indígenas. Também regularizou o fornecimento da merenda escolar, gás de cozinha, materiais didáticos e de expediente. E todas essas ações reforçam a qualidade de ensino no Uiramutã, o colocando em destaque, por isso no ano passado o município ganhou dois importantes prêmios, nacional e internacional.
Na área da Saúde, a tal “pesquisa” também revelou números que não condizem com a nossa realidade. Temos na sede do Uiramutã duas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e uma unidade mista de responsabilidade do município e do governo do Estado. Apenas no ano passado, bom lembrar, a prefeitura construiu e entregou mais de 10 postos de saúde em várias comunidades indígenas.
Aí, o IPS aparece dizendo que aqui morremos na fila, sem atendimento médico e sem medicação, como ocorre no HGR, na maternidade do Estado e no Coronel Mota, em Boa Vista. Só pode ser brincadeira um negócio desse. É verdade que nossa saúde municipal não anda “bem das pernas”, convenhamos, mas nosso atendimento, garanto, é bem melhor do que ocorre em muitos municípios do Brasil, pois alguns sequer tem posto de saúde.
Outro dado importante. A mortalidade infantil no Uiramutã é quase zero, enquanto em Marajá do Sena e Fernando Falcão, no Maranhão, e em Santo Antônio dos Milagres, no Piauí, os números assombram. Nesses municípios, a fome e falta d’água potável matam 11 a cada 100 crianças antes de alcançarem dois anos, segundo números do IBGE.
Aí, vos pergunto: alguém aqui já ouviu falar que uma criança morreu de fome ou sede no Uiramutã? Pelo contrário, nossos curumins são cheios de energia e saúde. Como já disse: moro aqui há mais de quatro anos e nunca fiquei sabendo de uma criança que morreu por desnutrição. E somos o pior município do Brasil? Aqui, nesta terra produtiva, a fruta (coco, manga, caju, goiaba, jambo…) faz “lama” no pé. Então, onde está a fome? O mais engraçado é que os três municípios citados acima sequer aparecem na “pesquisa” dos gringos.
Na área social, que abrange em especial a segurança pública, o IPS também colocou Uiramutã como vilão. Segundo a “pesquisa”, nosso índice de criminalidade beira à terra sem lei. E quem aqui nunca pisou logo pensa que vivemos em um “faroeste caboclo”, que matamos e morremos, que somos selvagens e que nossa cultura é pautada pelo uso intencional da força. Ou seja, para os gringos somos animais irracionais violentos, sedentos por sangue.
Então, pergunto: alguém aqui já presenciou ou soube de um assalto na sede do Uiramutã, único município de Roraima onde o crime organizado ainda não chegou? Cadê essas mortes tão violentas que colocaram nosso município nessa pesquisa de alta criminalidade? De onde o IPS tirou esses números?
Olha só. Ainda no quesito Violência, temos duas praças na sede, uma no Centro e outra na antiga pista de pouso. Moro há anos aqui e nunca vi um moleque vendendo droga nesses locais, diferente de Boa Vista e outros municípios de Roraima, onde traficantes degolam e esquartejam seus rivais em plena luz do dia.
Também já participei de vários festejos em diferentes comunidades indígenas e nunca presenciei mortes, sequer brigas. Então, mais uma vez pergunto: de onde o IPS tirou esses assombrosos números de violência no Uiramutã? Pelo contrário, vejo que este povo é acolhedor, pacífico e ordeiro.
Olha só. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública revelam que sete entre os dez municípios mais violentos do Brasil em 2023 ficam na região Nordeste. O ranking, no entanto, é liderado por uma cidade localizada na região Norte. Trata-se do município de Santana, no Amapá.
Também aparecem na lista da violência, as cidades de Camaçari, na Bahia, e Sorriso, no Mato Grosso. Essa pesquisa é oficial e bate com a do IBGE, mas o engraçado é que nenhuma dessas cidades aparece na “pesquisa” do IPS, só nosso pacato e pacífico Uiramutã. Vai entender.
Ainda na área de mortes violentas, o trânsito é outro fator que influencia. As maiores taxas, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), apontam Boa Vista (RR) em primeiro lugar, alcançando a maior taxa, de 34,2 mortes a cada 100 mil habitantes. Depois vêm Palmas (TO) e Campo Grande (MS). Uiramutã também não aparece nesta lista.
No setor de infraestrutura e prestação de serviços públicos, segundo o IPS, moradores da sede do Uiramutã também lidam com problemas na coleta de lixo e na iluminação pública. Sobre a coleta, mais uma vez o apontado pela “pesquisa” não condiz com a verdade. Moro no Centro e a caçamba passa três, quatro vezes por semana, recolhendo lixo domiciliar e até entulhos. A capinação também é feita toda vez que o mato cresce. Portanto, se comparado a outros municípios, Uiramutã é sem dúvida um dos mais limpos de Roraima.
Ainda na área de infraestrutura, o IPS acertou em um quesito: estrada precária. É verdade, a nossa principal rodovia, a RR-171, de responsabilidade da SEINF, do Governo do Estado, encontra-se em péssimas condições. Mas esse único quesito não pode nos colocar como o pior município do Brasil para se viver. Afinal, tem município brasileiro que sequer tem acesso por via terrestre.
Na área ambiental, também objeto de estudo da “pesquisa” dos gringos, Uiramutã aparece como terra devastada e muito poluída. Ora, vejam vocês. Respiramos um ar puro e bebemos a água mais potável de Roraima, com pH acima de 7, o que significa que é alcalina, ou seja, é a água ideal para a nossa saúde.
Outra: nossos campos e serras são os mais preservados da região porque aqui não há garimpo clandestino e nem agrotóxico utilizado pelos grandes produtores e pecuaristas. Por isso, afirmo sem sombra de dúvidas que Uiramutã tem o melhor e mais bem conservado meio ambiente de Roraima.
No campo econômico, também podemos facilmente desmontar a “pesquisa” do IPS, que nos coloca na condição de desempregados miseráveis. Contudo, nosso comércio é pujante porque o movimento ocorre durante todo o mês, e não apenas quando sai o pagamento do servidor público, como ocorre na Capital e em outros municípios do Estado.
Aqui, o grande diferencial é que o ouro e o diamante guianense aquecem nosso comércio a todo instante, por isso o movimento é contínuo. Duvida? Então, pergunte a qualquer comerciante local se ele troca Uiramutã por outro. Já observaram que a maioria dos comerciantes daqui tem Hilux e padrão de vida elevado. Sabe porquê? Por que o lucro aqui é alto e este é o principal motivo deles permanecerem no município, pois se não estivesse bom, já teriam ido embora, com certeza.
No setor público, Executivo e Legislativo municipais fecharam o ano com as contas equilibradas, enquanto outros municípios de Roraima, como São Luiz do Anauá, por exemplo, no Sul do Estado, não pagou os salários de novembro e dezembro, além do 13º aos seus servidores concursados, seletivados e terceirizados.
Importante aqui também fazer o seguinte questionamento: como Uiramutã foi apontado como o pior município do país para se viver, se foi reconhecido internacionalmente ano passado e recebeu o importante Selo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), por cumprir com os requisitos de desenvolvimento de políticas públicas voltados à promoção e consolidação dos direitos das crianças e adolescentes?
Lembrando ainda que a Prefeitura de Uiramutã também recebeu em 2024 o Selo Ouro do Programa Nacional de Transparência Pública, promovido pelo Tribunal de Contas de Roraima (TCE-RR). O reconhecimento destaca as melhores práticas de transparência e acesso à informação entre os municípios. Com índice de transparência superior a 86%, Uiramutã foi o 4° mais bem avaliado do Estado.
Portanto, com todos esses importantes reconhecimentos, nacional e internacional, como pode nosso querido Uiramutã ser o pior município do Brasil para se viver? Alguma coisa está errada e alguém está mentindo. A verdade é que essa “pesquisa” do IPS não condiz com nossa realidade, portanto é fajuta, sem credibilidade alguma, pois nosso querido, próspero e pacífico município com certeza é um dos melhores lugares do Brasil para se viver. E para o morador daqui que não concorda, é simples: arrume as malas e vá morar em outro lugar.

(*) Amilcar Júnior- Jornalista.

“As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do Jornal”

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