Crefisa deixa Palmeiras com presidente, títulos e mágoas

LUCAS BOMBANA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Após dez temporadas, chega ao fim oficialmente na próxima terça-feira (31) a parceria entre Palmeiras e Crefisa. A relação fez do clube um dos mais vitoriosos do futebol brasileiro na última década e alçou a dona da financeira, Leila Pereira, à presidência do clube.

A posição dupla assumida por Leila, como dirigente e patrocinadora, trouxe questionamentos da oposição palmeirense sobre conflitos de interesses, em um período marcado também por atritos e rompimentos com antigos aliados.

A patrocinadora passou a injetar dinheiro no clube em 2015, em um momento de dificuldades em campo. O alviverde havia brigado até os últimos lances contra o rebaixamento no certame nacional de 2014, terminando a competição na 16ª colocação.

O clube era então presidido por Paulo Nobre, que anos depois romperia relações com Leila, quando ela passou a galgar posições na política palmeirense.

Economista-chefe da Reag Investimentos e diretor-adjunto de planejamento do Palmeiras na gestão de Luiz Gonzaga Belluzzo (2009 a 2011), Marcelo Fonseca disse que a gestão austera de Nobre (entre 2013 e 2016), somada à construção do Allianz Parque, inaugurado em novembro de 2014, pavimentaram o caminho que permitiu ao clube entrar no radar de empresas interessadas em expor sua marca na camisa verde.

“O sucesso em campo é a combinação de vários elementos que se potencializaram”, afirmou Fonseca, que também participou das negociações com a WTorre para a construção do novo estádio palmeirense.

Diretor da consultoria Sports Value, Amir Somoggi calcula um valor com cotas de patrocínio da ordem de R$ 889 milhões nos anos de parceria, em valores atualizados pela inflação.

“De 2014 para 2015, os patrocínios do Palmeiras cresceram 313%. A Crefisa gastou muito mais do que precisava e ajudou o clube”, disse Somoggi.

Impulsionado pelas cifras aportadas pela empresa do ramo financeiro, o Palmeiras enfileirou 14 conquistas no período –dois títulos da Copa Libertadores (2020 e 2021), quatro do Campeonato Brasileiro (2016, 2018, 2022 e 2023), dois da Copa do Brasil (2015 e 2020), quatro do Campeonato Paulista (2020, 2022, 2023 e 2024), um da Recopa Sul-Americana (2020) e um da Supercopa do Brasil (2023).

Na era Parmalat, que marcou época nos anos 1990, foram 11 títulos conquistados pelo alviverde, dentre os quais três Paulistas (1993, 1994 e 1996), dois Brasileiros (1993 e 1994) e uma Libertadores (1999).

Somoggi acrescentou, contudo, que o modelo da parceria, com a dona da patrocinadora sendo também a presidente do clube, não está de acordo com as melhores práticas de governança do mercado.

“Isso jamais seria aceito em ligas profissionais dos Estados Unidos e da Europa, em que a marca paga um valor fora da realidade e tem o presidente do clube sendo dono do patrocinador. Isso não passa em nenhum compliance”, afirmou o especialista.

O próprio caminho de Leila até a presidência foi alvo de questionamentos. A dirigente se candidatou ao Conselho Deliberativo em 2017 e viu Paulo Nobre tentar barrar a candidatura, pelo entendimento de que ela não cumpria os requisitos legais.

Contando com o apoio do sucessor de Nobre, Maurício Galiotte, e de Mustafá Contursi, que comandou o clube entre 1993 e 2004, com grande influência nos bastidores, Leila conseguiu uma cadeira no Conselho com a maior votação da história. A vitória causou o rompimento entre Nobre e Galiotte.

Meses depois de chegar ao conselho, Leila também rompeu com Mustafá, após a acusação de que ingressos dados pela empresária ao conselheiro eram vendidos. “Mustafá me decepcionou muito”, declarou na época à Folha.

Em 2018, Leila novamente fez um grande lobby junto aos conselheiros do clube para conseguir aprovar uma alteração no estatuto que permitiu antecipar em um ano sua candidatura à presidência.

Em 2021, foi eleita em chapa única, três meses depois de ter renovado o acordo de patrocínio, de cerca de R$ 80 milhões por ano, o que colocava o Palmeiras entre os clubes com os maiores valores recebidos de patrocinadores no futebol sul-americano.

Nos últimos anos, contudo, com a invasão das empresas de apostas esportivas no futebol brasileiro, a agremiação viu rivais como Corinthians e Flamengo conseguirem contratos mais generosos. Agora, o Palmeiras também se acertou com uma “bet” e estampará a marca Sportingbet nos uniformes.

“Foi uma parceria de extremo sucesso. Mas tudo tem um ciclo na vida, não é? O ciclo da Crefisa está terminando”, declarou Leila em entrevista à Folha no início de outubro.

Apesar do patrocínio defasado e dos rompimentos com ex-aliados, o que incluiu também a organizada Mancha Verde, Leila Pereira não teve dificuldade para ser reeleita para um novo mandato até 2027. Em eleições no fim de novembro, a cartola venceu o advogado Savério Orlandi facilmente –2295 votos, contra 858.

“Quando fui eleita presidente pela primeira vez, eu ainda era uma novata dentro do universo do futebol, contribuía somente como patrocinadora. Hoje, depois de três anos comandando um dos maiores clubes do mundo, eu me sinto ainda mais preparada para trabalhar pelo crescimento do Palmeiras, sempre com foco no profissionalismo e na transparência”, afirmou a presidente reeleita.

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