Pouso do Starship e terapia com CAR-T estão entre os principais feitos científicos de 2024

foguete

PHILLIPPE WATANABE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A tradição natalina científica inclui as listas com as mais importantes descobertas e personalidades da ciência do ano feitas pelas revistas Science e Nature. E, para não quebrar esse costume, aqui vão as de 2024.

Entre elas estão a droga injetável lenacapavir, pesquisas com o telescópio James Webb, o primeiro tique de um novo relógio e a recuperação do primeiro estágio do foguete Starship, da Spacex.

Confira todas abaixo.

LENACAPAVIR

Uma nova esperança contra o HIV/AIDS surgiu em 2024 com a droga injetável lenacapavir, que ofereceu uma surpreendente proteção contra o vírus. A revista Science elegeu o feito como a descoberta do ano.

Pesquisadores esperam que, se usada como PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), ela poderá reduzir consideravelmente os níveis globais de infecção.

Em um estudo duplo-cego, controlado e randomizado com 5.000 mulheres e garotas adolescentes da África do Sul e de Uganda, houve zero infecções por HIV no grupo de 2.134 que receberam lenacapavir.

Todas as infecções ocorreram nos outros dois braços do estudo.

Outro estudo apontou eficácia de 99,9%, com somente duas infecções no grupo que recebeu a droga.

Esse foi desenvolvido na América do Sul, Ásia, África e Estados Unidos, com 3.265 homens cisgênero, homens e mulheres transgêneros e pessoas não binárias que faziam sexo com homens.

CAR-T CONTRA DOENÇAS AUTOIMUNES

A terapia com CAR-T (células T com receptor de antígeno quimérico) ganhou uma nova dimensão neste ano, com aplicação para pacientes com doenças autoimunes. Tanto a Science quanto a Nature destacaram pesquisas nessa área.

O tratamento já era usado, por exemplo, para cânceres sanguíneos.

A técnica consiste em modificar geneticamente células T do paciente para atacar células B, que, assim como as T, fazem parte do sistema imune. Em linhas gerais, as células B cancerígenas são as raízes de leucemias e linfomas e as células B também desempenham um papel na autoimunidade.

Até o momento, mais de 30 pacientes foram tratados de doenças autoimunes com células CAR-T. Entre os pacientes que fizeram parte dos estudos, estão pessoas com lúpus, esclerodermia e miosite. Houve casos de remissão e interrupção do uso de imunossupressores.

TELESCÓPIO JAMES WEBB

O James Webb, o mais potente telescópio espacial existente, tem tido sucesso em revelar as luzes do amanhecer cósmico, afirma a lista da revista Science.

O telescópio foi desenhado especificamente para olhar para o primeiro bilhão de anos do Universo e já encontrou mais galáxias candidatas do que o imaginado. Curiosamente, as observações indicaram brilhos incomuns e tamanhos comparáveis ao da Via Láctea, um crescimento que não seria possível, de acordo com as teorias de evolução galáctica atuais.

Além disso, o telescópio foi citado pela Nature, desta vez através da pesquisa de Wendy Freedman. A cientista foi importante para novas estimativas sobre a velocidade de expansão do Universo. O dedo dela também está presente no Telescópio Gigante de Magalhães, no Chile, e seu trabalho ajudou a melhorar estimativas sobre a idade do Universo.

PESTICIDA À BASE DE RNA

A EPA (Agência de Proteção Ambiental dos EUA) aprovou, em 2024, um pesticida em spray feito para agir, especificamente, em um gene de seu alvo. O avanço foi citado pela revista Science.

O químico foi desenvolvido para agir especificamente contra o escaravelho-da-batata, resistente a pesticidas já existentes.

O spray, aplicado nas folhas das plantas, usa um método conhecido como RNA de interferência, processo usado por células para regular a expressão gênica. Quando a larva do inseto come as folhas, o RNA bloqueia uma proteína do bicho, que morre após algum tempo.

OS NITROPLASTOS

Até 2024, não se conheciam organismos eucariontes -em linhas gerais, seres complexos- capazes de fixar nitrogênio do ar e transformá-lo em amônia, influenciando a produção de proteínas em plantas, por exemplo.

Os nitroplastos teriam aparecido cerca de 100 milhões de anos atrás. A origem seria a endossimbiose entre cianobactérias, capazes de fixar nitrogênio, e algas marinhas.

A pesquisa foi mencionada pela Science.

ORGANISMOS MULTICELULARES

Seres multicelulares já existiam no planeta Terra muito antes do imaginado anteriormente, de acordo com pesquisa publicada neste ano e destacada pela Science.

A descoberta ocorreu a partir de fósseis microscópicos de organismos semelhantes a algas com 1,6 bilhão de anos.

O achado sugere que eucariontes multicelulares apareceram cerca de 1 bilhão de anos antes de corpos mais complexos -com isso, a estrada para a complexidade foi mais lenta do que se pensava antes, diz a Science.

STARSHIP E OS BRAÇOS MECÂNICOS

Em outubro deste ano, recorda a revista Science, a SpaceX conseguiu recuperar o primeiro estágio do Starship, algo essencial para tornar o veículo rapidamente reutilizável.

A manobra de recuperação contou com enormes braços mecânicos que pinçaram o foguete, o maior já construído, em pouso.

O veículo, que ainda está na fase de testes, deve ser utilizado na volta dos humanos à Lua e, quem sabe, a Marte.

DNA DO PASSADO

Graças a avanços para extração de DNA antigo e ao barateamento de tais análises, cientistas têm conseguido identificar laços familiares de milhares de anos atrás, aponta a Science.

É claro que não se trata apenas de curiosidade. A capacidade de olhar para DNAs antiguíssimos e conectar as informações achadas com outros DNAs de pessoas enterradas nos arredores, tipo de sepultura, idade do esqueleto, entre outras possibilidades, ajuda a chegar a conclusões a que, muitas vezes, a arqueologia não conseguiria sozinha.

A revista científica cita como exemplo o trabalho de pesquisadores que, combinando dados de DNA de chefes celtas com detalhes das sepulturas onde estavam, conseguiram apontar que dinastias locais eram transmitidas pelo lado materno.

TEMPO NUCLEAR

A revista Nature, em seu tradicional Nature’s 10 (algo como os 10 da Nature), apontou um pesquisador, Ekkehard Peik, que, com outros cientistas, conseguiu o primeiro tique de um novo relógio que pode ser mais preciso e robusto do que relógios atômicos -estes são acurados ao nível de perderem ou ganharem 1 segundo a cada 40 bilhões de anos.

O novo relógio é baseado em tório-229 -mais especificamente, baseia-se em pequenos deslocamentos de energia no núcleo atômico. No entanto, para avançar no projeto, ainda a desafios a serem vencidos, como a obtenção de lasers mais compactos e precisos.

RESPOSTAS EM ROCHAS LUNARES

Da lista da Nature também consta a pesquisa com rochas lunares derivadas da missão chinesa Chang’e 6, que, neste ano, colheu quase dois quilos de material do lado afastado da Lua.

A revista destacou o trabalho do geólogo Li Chunlai com as amostras de pedras e solo. Ele esteve por trás da organização da missão, contribuindo, por exemplo, para a escolha do local onde a sonda pousaria no satélite.

Um dia após chegarem à Terra, as amostras já estavam no laboratório do geólogo em Pequim. A expectativa é que elas possam desvendar segredos lunares, entre os quais por que um lado afastado do satélite é tão diferente do outro, que sempre fica voltado para o nosso planeta.

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