Governo avalia que mercado erra ao desconsiderar impacto do Fundeb no pacote fiscal

ADRIANA FERNANDES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Integrantes do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que participaram da elaboração e negociação do pacote de contenção de gastos públicos consideram que há um mal-entendido dos analistas do mercado financeiro sobre o potencial de economia de despesas com as mudanças aprovadas no Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

As alterações foram negociadas com parlamentares da área de educação e mantêm a abertura de um espaço fiscal do lado das despesas de R$ 10,3 bilhões nos anos de 2025 e 2026. Esse é o mesmo valor inicialmente previsto pelo governo, quando o pacote foi enviado ao Congresso.

A estimativa de economia no Fundeb, fundo voltado à educação, não está sendo considerada nas estimativas de especialistas. As previsões do mercado financeiro contabilizam uma perda de economia do pacote de até R$ 20 bilhões nos dois próximos anos, enquanto o governo estima uma redução de R$ 2,1 bilhões -de R$ 71,9 bilhões para R$ 69,8 bilhões no biênio 2025-2026.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) enviada pelo Planalto previa a possibilidade de destinar 20% da complementação da União ao fundo para criar e manter matrículas em tempo integral na educação básica.

Na votação, o percentual foi reduzido a 10%, e a autorização ficou restrita ao ano de 2025, como uma regra de transição. A partir de 2026, pelo menos 4% de todo o Fundeb será destinado por estados e municípios à criação de matrículas em tempo integral na educação básica.

A previsão de economia com o Fundeb foi mantida porque o MEC (Ministério da Educação) deixará de alocar recursos para o programa de escola em tempo integral, pois o fundo aplicará o dinheiro.

Em 2025, já havia R$ 4,8 bilhões alocados na proposta de Orçamento para essa ação, que agora virão da complementação da União ao Fundeb (despesa que fica fora dos limites do arcabouço fiscal).

A medida, na prática, dará um alívio no Orçamento do ano que vem. Essa despesa, prevista no PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2025, será cancelada na votação da Orçamento, que ficou para o ano que vem.

Dessa forma, o Fundeb fará o aporte ao programa com os recursos da complementação da União, aprovada durante o governo Bolsonaro e que aumentou a pressão sobre as contas públicas, embora pelas regras do arcabouço fiscal não entrem no cálculo do teto de gastos.

A complementação estabeleceu um aumento gradual de 10% a 23% até 2026. Em 2025, os valores serão de R$ 56,5 bilhões -cerca de R$ 10 bilhões a mais do que neste ano.

Com a PEC aprovada, a partir de 2026, a despesa ficará totalmente a cargo de estados e municípios, e o governo federal projeta deixar de gastar R$ 5,5 bilhões. O dinheiro a partir daí também sairá da complementação do Fundo.

Dados do MEC apontam que a meta de crescimento do programa é de R$ 1 bilhão ao ano. Da mesma forma do que em 2025, o governo não precisará reservar o dinheiro para o programa no Orçamento dos anos seguintes.

Para técnicos do governo, tem havido uma dificuldade de entendimento das mudanças em razão do pouco tempo entre o envio do pacote ao Congresso, as negociações dos projeto com os parlamentares, e as votações na última semana antes do recesso de fim de ano do Congresso.

Em relatório, a XP Investimentos informou que a medida não tem efeito fiscal porque não reduziu o percentual compulsório ao Fundeb. Os negociadores do governo, ouvidos pela Folha, consideram que essa avaliação é equivocada porque a economia do pacote não está no Fundeb, mas na despesa orçamentária que seria destinada para o estímulo à criação de matrículas em tempo integral (e que agora usará recursos do fundo).

A expectativa do governo é que as dúvidas sobre as previsões começarão a ser sanadas a partir desta semana, após a divulgação do documento do Ministério da Fazenda que contém as notas técnicas e a metodologia do impacto das medidas do pacote aprovadas pelo Congresso. Uma ofensiva de comunicação para explicar as medidas está sendo organizada e deve começar nesta semana.

A regra de transição em 2025 foi criada porque durante as negociações com o Congresso os deputados da bancada de educação não queriam que o governo segurasse de forma permanente, com previsão na Constituição, 10% da complementação da União, para pagar o programa de estímulo à educação em tempo integral.

Os técnicos do governo avaliam que essa é uma das medidas de longo prazo mais importantes do pacote fiscal e que garantem também mais eficiência na qualidade do gasto dos recursos do Fundeb. Na avaliação deles, a medida afasta a possibilidade de o fundo crescer bastante sem garantia de ampliação das matrículas em tempo integral.

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