Relator da PEC afrouxa comando para limitar supersalários na administração pública

IDIANA TOMAZELLI E VICTORIA AZEVEDO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sofreu um revés na tentativa de impor um comando mais forte para extinguir brechas que permitem supersalários na administração pública. A medida havia sido incluída no pacote de contenção de gastos apresentado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).

A PEC (proposta de emenda à Constituição) enviada pelo governo previa que uma lei complementar tratasse das verbas que podem ficar fora do teto remuneratório, hoje em R$ 44 mil mensais na esfera federal.

O relator da PEC na Câmara, deputado Moses Rodrigues (União Brasil-CE), alterou o texto para prever a regulamentação por meio de lei ordinária de caráter nacional, aprovada pelo Congresso Nacional. Esse tipo de norma requer um quórum menor para ser aprovada -o que facilita flexibilizações.

Além disso, resoluções do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) têm status de lei ordinária. O uso de instrumento semelhante para regulamentar o teto do funcionalismo poderia tornar a norma contornável.

Técnicos do governo ainda avaliam os efeitos práticos do texto divulgado, mas o diagnóstico preliminar é que ele mantém aberta a brecha para que outras verbas indenizatórias sejam consideradas fora do teto.

Além da mudança no instrumento legal, o texto suprimiu o trecho que citava que “somente” as parcelas previstas em lei poderiam ser excetuadas dos limites remuneratórios.

Há ainda um artigo que diz que, enquanto a lei ordinária não for editada, as “parcelas de caráter indenizatório previstas na legislação” não serão computadas no teto remuneratório. Na avaliação de um integrante do governo, isso significa que, até a aprovação da lei, “fica tudo como está”.

Desde o envio da PEC, integrantes do Judiciário deflagraram uma ofensiva no Congresso para enfraquecer as medidas.

O relator também reduziu o percentual da complementação da União ao Fundeb (Fundo Nacional da Educação Básica) que poderá ser usado em ações para criar e manter matrículas em tempo integral na educação básica. O governo propôs uma fatia de 20%, o que renderia uma economia de R$ 10,3 bilhões entre 2025 e 2026, e de R$ 42,3 bilhões até 2030. O parecer reduz para 10% e cita apenas o ano de 2025.

A partir de 2026, pelo menos 4% de todo o Fundeb seriam destinados por estados e municípios à criação de matrículas em tempo integral na educação básica. Antes da divulgação do texto, o relator disse nesta quarta-feira (18) que a mudança preservaria a expectativa de poupar R$ 10 bilhões entre 2025 e 2026, mas não esclareceu como isso se daria.

“Vai ser mantida a expectativa do que foi mandado no projeto, ou seja, nos dois anos vai ser garantido no mínimo a economia de R$ 10 bilhões”, afirmou.

O relator manteve a mudança no critério de concessão do abono salarial (espécie de 14º salário pago a parte dos trabalhadores com carteira assinada). O texto prevê que, para os trabalhadores que receberão o benefício em 2025, será elegível quem recebia o equivalente a dois salários mínimos do ano-base (neste caso, 2023). O valor equivalente seria o de R$ 2.640.

A partir de 2026, esse valor será corrigido pela inflação, até travar em patamar equivalente a 1,5 salário mínimo. A expectativa do governo é que isso ocorra após uma transição de dez anos. O governo projeta uma economia tímida no ano que vem, de apenas R$ 0,1 bilhão, mas o impacto acumulado até 2030 chegaria a R$ 18,1 bilhões.

Rodrigues também manteve no texto o dispositivo que autoriza descontar da renda familiar considerada no critério de acesso ao BPC (Benefício de Prestação Continuada) apenas as parcelas expressamente previstas em lei. O abatimento, na prática, facilita a concessão do benefício.

O diagnóstico do governo é que há hoje uma enxurrada de decisões judiciais permitindo descontar da renda familiar valores gastos com medicamentos, cuidadores, transporte e alimentação especial, de maneira não uniforme. O comando constitucional para que uma lei discipline o tema é considerado essencial para ajudar a conter a escalada das despesas com esse benefício nos últimos anos.

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