Policiais de SP suspeitos de elo com PCC movimentaram R$ 25 milhões em 7 anos

ROGÉRIO PAGNAN
SÃO PAULO, SP, BRAGANÇA PAULISTA, SP E PRAIA GRANDE, SP (FOLHAPRESS)

Dois policiais civis paulistas suspeitos de ligação com integrantes da facção criminosa PCC, ambos alvos da operação da Polícia Federal e Promotoria nesta terça-feira (17), movimentaram ao menos R$ 25 milhões em um intervalo de sete anos, conforme levantamento feito pela reportagem.

O investigador Eduardo Lopes Monteiro, preso na operação Tacitus, movimentou cerca de R$ 12 milhões, e o agente Rogério de Almeida Felício, considerado foragido, movimentou cerca de R$ 13 milhões, conforme o levantamento. A maior parte do patrimônio envolve compra e venda de imóveis.

Como funcionários públicos, Monteiro recebe um salário bruto de R$ 11.985 (R$ 5.504,70 líquidos), e Felício recebe mensais R$ 7.911 (R$ 7.337,17 com descontos), conforme dados oficiais.

Procuradas, as defesas dos policiais afirmaram que as movimentações ocorrem dentro da lei e que ambos foram investigados pela Promotoria no passado, sem que tenham sido achadas irregularidades. Também negaram ligação com o crime organizado e consideram desnecessário o pedido de prisão (leia mais abaixo).

Os nomes de Monteiro e Felício ficaram conhecidos a partir de novembro deste ano quando foi divulgada parte da delação do empresário Antônio Vinícius Gritzbach, assassinado no aeroporto de Guarulhos.

Em acordo de delação premiada com o Ministério Público, Gritzbach apontou uma série de policiais supostamente envolvidos em esquema de corrupção, entre eles Monteiro e Felício, além do delegado Fábio Baena, chefe de ambos durante passagem deles pelo DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa).

Baena e sua equipe foram os responsáveis pela investigação do assassinato em 2021 de Anselmo Becheli Santa Fausta, o Cara Preta, chefe do PCC. Gritzbach era o principal suspeito de ser o mandante do crime.

Os policiais teriam exigido dinheiro para livrá-lo das acusações, segundo a versão apresentada pelo delator.

A reportagem não conseguiu identificar uma evolução patrimonial considerável do delegado Baena. Pelos registros em cartório no estado de São Paulo, os bens do delegado não chegam a R$ 1 milhão.

Já os outros policiais tiveram crescimento patrimonial exponencial. Os R$ 12 milhões movimentados por Monteiro, por exemplo, equivalem a 15 vezes o patrimônio declarado em 2017. Já os R$ 13 milhões de Felício, representam 40 vezes o patrimônio de R$ 319 mil registrado em 2019.

Monteiro mora em uma casa de três pavimentos em um condomínio de Bragança Paulista, no interior do estado, uma propriedade estimada por corretores ouvidos pela reportagem em R$ 2 milhões.

Em outubro do ano passado, ele vendeu outro imóvel no mesmo condomínio, por R$ 4 milhões. A reportagem não publica o nome do condomínio para não colocar eventualmente em risco a família do policial, que ainda mora no local.

A reportagem considera em seu levantamento o valor da casa de Monteiro estimado por corretores, e não o valor registrado em cartório de R$ 439 mil, que ainda aparece como um lote sem construção.

Da mesma forma, a reportagem considera o valor de R$ 1,8 milhão para o prédio adquirido por ele na avenida Antônio Pires Pimentel, uma das principais de Bragança. Hoje funciona no local a concessionária de veículos Baronesa Motors, mas na escritura ele foi registrado como um terreno comprado por R$ 450 mil.

A Baronesa Mortors, que vinha comercializando veículos de luxo como Porsche até novembro, também estava em nome do investigador até março de 2023. Naquele mês, a empresa passou para sua mulher e para um sócio, Edmundo Alves Pereira Gaeta, ambos com 50% da companhia, estimada em R$ 500 mil.

Das 15 matrículas adquiridas ou comercializadas pelo investigador, duas delas estão em nome da empresa MD Construção e Incorporação, registrada em nome de Monteiro e da mulher dele, uma médica da cidade.

O investigador deixou a sociedade da MD em março do ano passado, deixando a empresa apenas para a mulher. O patrimônio dele ainda inclui carros e sala comercial.

Já o patrimônio do agente Felício é concentrado em uma série de condomínios de casas na Praia Grande, litoral paulista. Pelos documentos disponíveis em cartório, ele adquiriu terrenos na cidade, construiu pequenas casas e as vendeu por valores entre R$ 240 mil e R$ 420 mil.

Até agora, foram construídas 37 unidades divididas em cinco condomínios batizados de Magnata, e há ao menos mais cinco unidades em construção no Magnata 6. Parte das unidades já foi comercializada, e outra continua em nome da Magnata Construtora e Incorporadora.

A empresa está registrada em nome do policial, de um sobrinho dele e de um terceiro sócio, todos com partes iguais na empresa. Além dos condomínios, a empresa tem ainda mais duas casas em Praia Grande estimadas em R$ 500 mil.

Policiais dizem que negócios são legais

A defesa de Monteiro, liderada pelo advogado Daniel Bialski, diz que “paralelamente à elogiada carreira policial”, o investigador foi sócio da Baronesa Motors e da MD Construções LTDA. “Não exercendo qualquer cargo de administração. Hoje já não mais integra o quadro societário de ambas empresas”, diz.

Sobre os carros anunciados na loja, tratava-se de veículos deixados em consignação por terceiros, clientes. “Já em relação a MD Construções LTDA, o maior aporte para obtenção dos imóveis é fruto do ofício de sua esposa e de vendas pretéritas. Aliás, tudo está regular e devidamente declarado em seu imposto de renda”, afirma a defesa do investigador.

Já a defesa de Felício, liderada pelo advogado José de Oliveira Júnior, afirma que em 2017 foi aberta uma investigação contra o agente pelo Ministério Público, arquivada em 2021. Neste mesmo ano, outra investigação foi aberta pela Promotoria, também arquivada em 2023.

“Vale dizer que Rogério, bem como a Construtora Magnata, tiveram suas movimentações financeiras analisadas desde o ano de 2011, sem qualquer incompatibilidade financeira”, diz trecho da nota.

Sobre a a movimentação de R$ 13 milhões como compra e venda de imóveis nos últimos anos, a defesa diz “que os imóveis negociados pela construtora ocorreram por intermédio de permutas, incorporações e financiamentos bancários.”

A defesa diz que as acusações feitas por Gritzbach contra o agente são infundadas com o objetivo de descredibilizar o trabalho sério e eficaz realizado por Rogério e equipe, que o apontaram como mandante da morte de Santa Fausta. “Reiteramos que a evolução patrimonial do policial civil Rogério de Almeida Felício é totalmente compatível com suas atividades profissionais, estando devidamente documentada e em conformidade com a legislação vigente.”

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