Segundo turno em Taboão da Serra (SP) ocorre sob sombra da violência política

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BRUNO XAVIER
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Antes de 18 de outubro, um tema dominava as eleições municipais de Taboão da Serra, na Grande São Paulo: o transporte. Os candidatos divergiam a respeito da chegada do metrô, da implantação da tarifa zero e da municipalização de um trecho da rodovia Régis Bittencourt, que corta a cidade.

Tudo isso hoje está fora da pauta. Em 18 de outubro, o prefeito José Aprígio da Silva (Podemos) sofreu um ataque a tiros e foi atingido no ombro. O atentado dominou o debate público na cidade.

A violência política é persistente na história recente de Taboão. Em 1991, o presidente da Câmara Municipal, José Feres (PDC), foi assassinado com seis tiros no rosto. Outros dois vereadores foram vítimas de atentados a tiros, mas sobreviveram: Paulo Félix (à época no PSDB), em 2003, e Fernando Fernandes (PSDB), que viria a ser prefeito, em 2008.

Mais recentemente, já no governo Aprígio, dois episódios de violência -além do atentado ao prefeito– chamaram a atenção. Em 2021, um assessor da prefeitura foi assassinado com cinco tiros em um posto de gasolina em Embu das Artes, cidade vizinha.

Em 2023, uma confusão generalizada acabou em pancadaria na Câmara Municipal. Na época, Aprígio chegou a registrar boletim de ocorrência contra Fernando Fernandes, hoje deputado estadual, e sua irmã, a também deputada tucana Analice Fernandes, por agressão e ameaça.

Aprígio e Fernandes se opõem no campo político da cidade e disputaram a segunda colocação nas eleições deste ano. No fim, o prefeito conseguiu passar à segunda rodada.

O adversário dele no segundo turno é o Engenheiro Daniel (União Brasil), que foi candidato à sucessão de Fernandes em 2020, mas rompeu com o ex-padrinho e disputou votos com ele neste ciclo. Após o primeiro turno, eles reataram, e o tucano anunciou apoio à candidatura de Daniel. Ele tem participado ativamente da campanha do antigo aliado.

Para tentar a reeleição, Aprígio montou uma ampla coligação com fartura de apoios, do PT ao PL. Já apareceram nas redes sociais recomendando o voto no prefeito o vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), o deputado federal Celso Russomanno (Republicanos) e o secretário de Governo de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD).

Apesar de o Republicanos estar na coligação de Daniel, o governador Tarcísio de Freitas gravou vídeo desejando boa sorte à campanha de Aprígio. Daniel chegou a fazer críticas ao governador, colocando em dúvida o prazo dado pelo republicano para a chegada da linha 4 do Metrô a Taboão, em 2028.

“Não podemos mais brincar com o eleitor de Taboão da Serra falando de metrô. É uma responsabilidade do governo do estado”, disse, em sabatina do portal O Taboanense.

Em sua participação na sabatina do portal, o prefeito do Podemos reforçou a promessa do governador.

“O Tarcísio falou que não abre mão de começar essa obra em dezembro. Vai ter a estação a 35 metros [de profundidade], estará abaixo da rodovia [Régis Bittencourt]”.

Mesmo com a diversidade de apoios, Aprígio não conseguiu decolar na campanha e chegou ao primeiro turno com 25,93% dos votos.

Daniel, por outro lado, quase levou a disputa de primeira. Ele teve 48,98% dos votos no dia 6 de outubro e ficou a cerca de 1.500 votos de ser eleito.

Mesmo sem grandes apoios, Daniel tinha um padrinho de peso na região: o prefeito de Embu das Artes, Ney Santos (Republicanos).

Derrotado em 2020, Daniel assumiu a secretaria de Obras da gestão de Ney, cargo que ocupou até se licenciar para a campanha deste ano.

Ney já foi investigado sob suspeita de elo com o PCC (Primeiro Comando da Capital), o que ele sempre negou. Ele também foi condenado por formação de quadrilha e receptação, em 1999, e por assalto a carro-forte, em 2003.

A presença do prefeito vizinho no palanque de Daniel foi um dos principais pontos de atrito com Aprígio no período eleitoral.

Ele acusa Ney de querer interferir na política local da cidade, e, por sua vez, é atacado pelo rival por causa de sua gestão, considerada a “pior da região” por Ney.

O prefeito de Embu chegou a publicar nas redes sociais, um dia antes do atentado em Taboão, que Aprígio seria “linchado na rua” pelos resultados de seu governo.

Durante sua participação em sabatina promovida pelo G1 no segundo turno, Daniel defendeu o padrinho. “Foram dez anos de investigação do Ministério Público que, se eu não me engano, foi arquivada justamente por falta de provas. Eu conheço o Ney desde 2020. Conheci o Ney prefeito e afirmo para você que nos últimos quatro anos foi o melhor prefeito de toda a região”, afirmou.

Após o atentado, na sexta-feira (18), a campanha eleitoral na cidade entrou em um estado de incerteza. Aprígio estava se recuperando do tiro, e Daniel, em solidariedade, anunciou que faria uma pausa nos compromissos até que o prefeito se restabelecesse e os criminosos fossem punidos.

Apesar disso, publicação da última quarta-feira (23) mostra o candidato em uma agenda de rua na cidade. Aprígio continua internado no Hospital Albert Einstein, mas já saiu da UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) e está em um quarto. A Polícia Civil apontou três suspeitos pelo crime e já prendeu um.

Em outra postagem, nos stories do Instagram, o ex-secretário endossou um vídeo em que o jornalista Alexandre Garcia colocava o atentado em dúvida. “A quem interessa esse atentado? Eu acho que não interessa ao adversário [Daniel], que está ganhando, só valorizaria o atual prefeito, como vítima”, disse Garcia.

A reportagem tentou contato com o Engenheiro Daniel, mas ele não enviou retorno.
Em nota, a assessoria de Aprígio repudiou a disseminação de notícias falsas, mas não citou diretamente a postagem do adversário .

“Colocar em questão a gravidade de um fato tão sério e traumático é um desrespeito não apenas ao prefeito Aprígio, mas também à sua família e a toda a população de Taboão da Serra. Qual é o preço de uma opinião? A que ponto nós chegamos? Um fato tão sério sendo tratado com tanto viés”, diz o texto.

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