CLAUDINEI QUEIROZ
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Não é de hoje que moradores de algumas cidades do país se deparam com onças perambulando pelas ruas ou parques urbanos quando deveriam estar nas matas. Somente neste ano, há ao menos 13 registros de onças-pintadas ou onças-pardas -também chamadas de sussuaranas- em ambientes nos quais não são esperadas.
No entanto, Rogério Cunha de Paula, coordenador do Cenap (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros), órgão do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), considera que esse número é subdimensionado, uma vez que outros episódios do tipo pode ter passado desapercebidos.
“As onças não são bobas para entrar na cidade. Elas acabam entrando sem querer e se perdendo.
Acredito que há muitos casos em que os bichos entram, saem e ninguém dá notícia. Tem uma onça que a gente monitorou perto de Foz do Iguaçu. Ela passou dois dias dentro da cidade, andando nos quintais das casas e terrenos baldios, e se movimentando pelos corredores de matas, até conseguir sair. A gente monitorou pela coleira de identificação, mas ninguém percebeu”, conta o biólogo.
Ele diz que há alguns fatores que ajudam a explicar essa “invasão” de áreas urbanas pelas onças. A primeira é o maior uso da tecnologia atual. Todos com um celular conseguem fotografá-las ou filmá-las, assim como a maior presença de câmeras de monitoramento nas ruas e casas. Assim, ao perceber a presença do animal, a pessoa já publica nas redes sociais para atrair a atenção.
Também há a questão ambiental. “As cidades têm crescido em áreas rurais e chegando próximo a fragmentos florestais que estavam longe das cidades. E mesmo nos projetos urbanos de reflorestamento ou projetos paisagísticos acabam sendo formados alguns corredores de mata que levam os bichos para dentro da cidade, e eles se perdem lá dentro”, diz De Paula.
Em algumas regiões, como no pantanal, é mais comum a presença de onças-pintadas. No entanto, mesmo nesses locais há fatores que contribuem para o deslocamento dos felinos para áreas populosas.
Um deles é a cheia do rio Paraguai. A inundação de suas terras faz com que os animais migrem para cidade, em busca de áreas secas e também de alimentos.
E outra é a prática da ceva de animais silvestres, ou seja, o oferecimento deliberado e recorrente de alimentos aos animais para atraí-los para áreas turísticas, aumentando a possibilidade de os visitantes os observarem durante passeios.
Essa prática, porém, poderá ser proibida em Mato Grosso do Sul. A deputada estadual Gleice Jane (PT) protocolou um projeto de lei na Assembleia Legislativa propondo sua erradicação, como forma de evitar justamente o perigo de uma onça atacar um morador, embora essa possibilidade seja rara. O mais comum é os animais se assustarem e fugirem.
Confira abaixo os 13 registros de onças em áreas urbanas neste ano:
Gramado (RS) – 21.mar
O primeiro registro feito este ano foi de uma onça-parda filmada caminhando por uma rua da cidade de Gramado (RS). Um dos vídeos publicados nas redes sociais mostraram o animal durante a noite na rua Theobaldo Fleck.
Faxinal (PR) – 29.mar
Neste dia, outra onça-parda apareceu durante a tarde no estacionamento de um posto de gasolina da cidade de Faxinal, no norte do Paraná. A Polícia Ambiental de Londrina foi chamada e precisou sedar o animal para garantir a segurança dele e dos moradores. Após ser retirada do posto, a onça foi encaminhada à Unifil, instituição que fez a avaliação veterinária do felino antes de ele ser reintegrado à natureza no Parque Estadual da Mata dos Godoy.
Corumbá (MS) – 17.abr
O município com mais registros de aparecimento de onças em áreas urbanas é a cidade de Corumbá, em Mato Grosso do Sul. Sua proximidade com o pantanal explica a estatística. Este ano, o primeiro vídeo mostrou uma onça-pintada durante a noite de 17 de abril caminhando às margens da rodovia Ramão Gomez, uma das ligações entre a área central de Corumbá e a fronteira com a Bolívia. O local é próximo à zona urbana da cidade e ao posto administrativo da Polícia Rodoviária Federal (PRF). De acordo com observadores, aparentemente a onça tentava atravessar a rodovia, mas desistiu e voltou para a mata.
Aquidauana (MS) – 22.abr
Cinco dias depois, a Polícia Militar Ambiental de Mato Grosso do Sul encontrou pedaços do corpo do caseiro Jorge Avalo, 60, morto após ser atacado por uma onça-pintada no pesqueiro onde trabalhava às margens do rio Miranda, em Aquidauana, no pantanal. A equipe de buscas também foi atacada no momento em que recolhia as partes do corpo da vítima. Um dos socorristas sofreu ferimentos na mão. A Polícia Ambiental localizou e capturou a onça dois dias depois. O macho de 94 kg estava subnutrido e foi levado ao Cras (Centro de Reabilitação de Animais Silvestres), em Campo Grande, para fazer exames. Após o procedimento, ele foi levado para um mantenedor de fauna, localizado em Amparo (SP), a cerca de 135 km de São Paulo.
Iconha (ES) – 2.mai
No município do sul do Espírito Santo, uma onça-parda foi avistada por volta das 5h andando pelas ruas do centro. Moradores a registraram circulando pela rua Muniz Freire, uma das principais do município. Ela acabou se escondendo no banheiro da garagem de um prédio residencial. Foi realizada uma operação conjunta da Defesa Civil municipal com o Batalhão de Polícia Militar Ambiental para sedar e capturar o animal, que recebeu atendimento de um médico veterinário do Instituto Federal do Espírito Santo antes de ser levado para uma reserva ambiental não divulgada.
Caçador (SC) – 7.mai
Na cidade do oeste catarinense, câmeras de segurança de uma residência captaram o momento em que uma onça-parda passou na frente de dois trabalhadores em uma rua. Os vídeos mostram, por ângulos diferentes, os homens percebendo o animal e voltando apressados. Eles foram ajudados por um comerciante, que os deixou entrar em sua casa. Como apareceu, a onça sumiu depois, sem ninguém mais saber para onde foi.
Itapeva (SP) – 16.mai
Na manhã daquela sexta-feira, os moradores do Jardim Beija-Flor avistaram uma onça-parda andando tranquilamente pela rua Helena Husney, por volta das 5h50. O motorista de ônibus Jair Gomes, que saía de casa para trabalhar, ficou frente a frente com o animal e teve o sangue frio para pegar o celular e fotografá-lo. A fera fugiu.
Corumbá (MS) – 23.mai
Na noite desse dia, uma onça-pintada invadiu o quintal de uma residência na região do Mirante da Capivara, no bairro Generoso, e chegou a atacar um dos cães da família, mas outros dois cachorros apareceram e afugentaram o felino. Uma câmera de vigilância flagrou a chegada e a fuga do animal.
Araxá (MG) – 25.mai
Na madrugada de 25 de maio, uma onça-parda foi flagrada circulando pelas ruas de Araxá, no Alto Paranaíba. O animal tentou escalar o portão de um supermercado no Bairro São Geraldo. Em determinado trecho, um ciclista apareceu pedalando calmamente, sem perceber a presença da onça. Logo depois, a sussuarana entrou em outra rua e desapareceu.
Peruíbe (SP) – 26.mai
As câmeras de segurança do residencial Bosque Três Marias, em Peruíbe, no litoral sul de São Paulo, filmaram uma onça-parda circulando durante a noite em frente ao portal de entrada do condomínio, que está localizado em uma região próxima a um grande fragmento de floresta e à estrada Padre Manuel da Nóbrega, que divide o bairro do Parque Estadual da Serra do Mar.
Uberlândia (MG) – 2.jun
No mesmo dia 6 de junho, uma onça-parda saltou o muro para entrar em um condomínio fechado na zona sul da cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Câmeras de monitoramento registraram o animal circulando pelas áreas residenciais antes de se esconder no quintal de uma das casas. Uma força-tarefa envolvendo Corpo de Bombeiros, Polícia Militar de Meio Ambiente e especialistas da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) foi montada para resgatar a onça-parda. Ela foi sedada e depois levada para uma área de preservação ambiental perto da rodovia MGC-455. Na madrugada daquele mesmo dia, uma outra onça-parda havia sido avistada por moradores do bairro Élisson Prieto, na zona sudeste da cidade, mas as autoridades disseram que se tratava do mesmo animal.
Corumbá (MS) – 6.jun
Nesse dia, o município de Mato Grosso do Sul teve ao menos dois registros de aparecimento de onças-pintadas nas proximidades da área urbana. A primeira, aparentemente, foi a mesma que, no dia 23 de maio, atacou um cachorro na região do Mirante da Capivara, no bairro Generoso. Desta vez, a câmera de vigilância a gravou rondando a casa, mas sem entrar no local.
A outra onça-pintada foi filmada por câmeras de segurança na região da Agesa (Armazéns Gerais Alfandegados de Mato Grosso do Sul), próximo ao rio Paraguai.