MICHELE OLIVEIRA
MILÃO, ITÁLIA (FOLHAPRESS)
Não existe uma operação de busca em andamento na Itália para prender a deputada Carla Zambelli (PL-SP), foragida no país europeu desde a última quinta-feira (5). Ela deixou o Brasil para escapar do cumprimento da pena de dez anos de prisão, determinada pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Segundo o embaixador Renato Mosca, à frente da representação diplomática brasileira na Itália, o mandado de prisão, expedido pela Interpol a pedido do Brasil, prevê a detenção em lugares públicos.
“Mesmo que haja o conhecimento de que ela estaria em determinado local, dentro de uma casa, não há mandado de busca. A polícia [italiana] não pode entrar dentro de uma casa para retirá-la e prendê-la. Ela terá de ser presa no momento em que estiver em local público”, disse ele à Folha nesta segunda (9). “Isso dificulta a situação, mas não há outro caminho.”
Mosca afirma que não há informações sobre o paradeiro da deputada, algo que cabe exclusivamente à polícia italiana. A entrada dela no país, pelo aeroporto Fiumicino, em Roma, no dia 5, aconteceu cerca de quatro horas antes da difusão do pedido de prisão da Interpol. “O alerta de detenção ainda não havia chegado à Itália no momento da entrada da parlamentar, o que permitiu a desimpedida circulação dela.”
A deputada pode ser presa se, como disse à CNN Brasil, se apresentar aos órgãos italianos para registrar a sua presença no país. “Vou declarar os meus dados para pegar os documentos. Estou aqui de boa-fé. Estou aqui por conta de uma perseguição política”, disse Zambelli.
A interlocução do Brasil com a Itália acontece em duas frentes. Um adido da Polícia Federal fica em contato com as forças policiais italianas, enquanto o embaixador mantém conversas com os ministérios das Relações Exteriores e do Interior. Mosca afirmou que o tema da extradição da congressista, cujo processo só pode começar depois que ela for detida, ainda não fez parte das conversas.
No entanto, o histórico recente de casos do tipo, inclusive de cidadãos com dupla nacionalidade, derruba a crença da deputada de que, na Itália, ela seria “intocável” por ter a cidadania italiana. Segundo Mosca, os acordos bilaterais entre os dois países em temas judiciais têm sido eficazes, incluindo o de extradição, em vigor desde os anos 1990.
“Temos 14 processos de extradição em tramitação na Itália desde 2024, quatro são indivíduos de dupla nacionalidade. Neste ano já tivemos a extradição de um ítalo-brasileiro”, afirma. “A cidadania italiana não torna intocáveis as pessoas em dívida com a Justiça.”
Diferentemente do Brasil, que não permite a extradição de seus cidadãos que tenham cometidos crimes, a Constituição italiana, em seu artigo 26, prevê que a extradição de um cidadão poderá ser permitida “quando expressamente prevista em convenções internacionais”.
É um processo que costuma durar meses e que passa por aval político, além de jurídico.
Além de possuir a cidadania italiana, Zambelli afirmou que, na Europa, pretende buscar lideranças de ultradireita, incluindo a primeira-ministra Giorgia Meloni.
O embaixador avalia que, apesar do campo ideológico em comum entre Zambelli e integrantes do governo Meloni, esse não deverá ser um critério para a decisão final da Itália. “Não vejo afinidade entre um governo dedicado ao combate ao crime e uma pessoa condenada com amplo direito de defesa por crimes tipificados. Crimes cibernéticos, de invasão de sistemas, têm máxima relevância na Itália.”
Além de, segundo ele, superado o caso do terrorista Cesare Battisti, que foi beneficiado por uma decisão do presidente Lula e passou anos no Brasil como fugitivo da Justiça italiana -sua extradição aconteceu em 2018, no governo Michel Temer-, a relação bilateral entre os países têm sido pautada pela colaboração. Ele cita os casos dos mafiosos Rocco Morabito e Vincenzo Pasquino, ambos presos no Brasil e extraditados para a Itália em 2022 e 2024.
“Há uma série de elementos que contribuem para que esse caso da deputada tenha um desfecho favorável. Não ao Brasil ou à Itália, mas à Justiça”, diz Mosca.