Substituição de gestores em escolas de SP não resolve baixo desempenho no IDEB, afirma pesquisa

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Um levantamento técnico realizado pelo Instituto Cultiva questiona a eficácia da proposta da Prefeitura de São Paulo de transferir a gestão das 50 escolas municipais com os piores desempenhos no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) para organizações sociais (OSs). A medida, anunciada pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) como forma de “melhorar a gestão” e “elevar os índices educacionais”, é considerada equivocada pelos pesquisadores por desconsiderar fatores estruturais, socioeconômicos e territoriais que influenciam diretamente o rendimento escolar.

A pesquisa, intitulada IDEB em Foco: Como as Desigualdades nas Condições das Escolas Afetam o Desempenho Educacional, analisou comparativamente as 50 escolas com os melhores e as 50 com os piores resultados no IDEB em São Paulo. O estudo identificou padrões de segregação espacial e forte correlação entre o desempenho escolar e o nível socioeconômico das regiões onde as escolas estão localizadas.

“Os dados demonstram que o baixo desempenho educacional em territórios vulneráveis é resultado de um conjunto complexo de fatores que transcendem a gestão escolar, como desigualdades estruturais, violência urbana e falta de acesso a serviços básicos”, afirma o cientista político Rudá Ricci, presidente do Instituto Cultiva.

Segregação espacial e desigualdades internas

A distribuição territorial das escolas evidencia a segregação socioeducacional na capital paulista. Distritos como Mooca, Carrão, Butantã, Perdizes e Parque São Domingos concentram apenas escolas entre as mais bem avaliadas. Por outro lado, regiões como Vila Prudente, Vila Medeiros, Pedreira, Lajeado e Cidade Tiradentes abrigam exclusivamente unidades com as piores notas no IDEB.

O estudo ainda observa que, em alguns bairros, há escolas tanto entre as melhores quanto entre as piores do ranking, o que revela desigualdades intraurbanas que são ocultadas pelas análises em escala distrital. A limitação dos dados disponíveis — que não permitem uma desagregação por bairro ou escola — é apontada como um dos principais obstáculos para o diagnóstico preciso dos desafios enfrentados.

Tamanho da escola e desempenho

Outro dado relevante identificado na pesquisa é a correlação entre o porte das escolas e seus resultados no IDEB. Escolas de menor tamanho tendem a obter melhores índices. Segundo os pesquisadores, essas unidades permitem um acompanhamento mais individualizado dos estudantes, maior agilidade na gestão e relações mais coesas entre os membros da comunidade escolar.

Na análise da evolução do IDEB entre 2019 e 2021, os contrastes são marcantes: 71% das escolas com melhor desempenho melhoraram seus índices, sendo que 9% registraram avanços superiores a um ponto. Já entre as escolas com pior desempenho, apenas 18% apresentaram melhora, enquanto 74% sofreram quedas em seus indicadores.

“Isso revela um ciclo de deterioração educacional em áreas vulneráveis que precisa ser enfrentado com políticas públicas amplas e intersetoriais”, destaca Ricci.

Condições adversas e impactos da violência

O levantamento também aponta que as escolas localizadas em regiões vulneráveis enfrentam desafios como infraestrutura precária, insegurança, ausência de serviços básicos e impactos crescentes de eventos climáticos extremos. A violência urbana é destacada como um fator especialmente prejudicial, gerando medo, estresse e traumas que comprometem o rendimento e a frequência escolar dos alunos.

Proposta de abordagem multidimensional

A pesquisa propõe que a avaliação e o apoio às escolas levem em conta três dimensões principais: administrativa (condições de trabalho e desenvolvimento humano), pedagógica (projeto político-pedagógico, formação docente e avaliação) e comunitária (relações com as famílias e redes de proteção social). Essa abordagem multidimensional visa superar a lógica das avaliações padronizadas e capturar a complexidade que permeia o desempenho escolar.

Críticas à terceirização

Na conclusão, o estudo alerta que a simples transferência da gestão para organizações privadas não resolve os problemas estruturais das escolas, nem garante melhorias na qualidade da educação. Além disso, levanta preocupações quanto à transparência na escolha das OSs e ao impacto sobre as carreiras de professores e servidores públicos.

“A qualidade da educação não pode ser medida apenas por índices como o IDEB, nem garantida por mudanças pontuais de gestão. É preciso enfrentar as desigualdades estruturais com políticas públicas integradas, que articulem educação, saúde, habitação, segurança e desenvolvimento social”, afirma Rudá Ricci.

O Instituto Cultiva defende que, em vez de delegar a responsabilidade da educação pública, a administração municipal invista em ações que fortaleçam as escolas em seus próprios territórios, considerando suas especificidades e necessidades reais.

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