Diante do crescimento forte das demandas interna e externa, as empresas brasileiras voltaram a investir nos últimos anos na expansão da capacidade produtiva, algo que por um bom tempo esteve fora de cogitação em diversos setores porque havia muita ociosidade nas fábricas.
Segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), R$ 371 bilhões foram direcionados em 2024 à expansão dos ativos voltados à produção. Eles vão desde máquinas de uma linha industrial à infraestrutura, como estradas, portos, aeroportos e redes de transmissão de energia.
O valor, correspondente a 18,2% do total de investimentos produtivos no Brasil, é o maior em dez anos. Para chegar a esse número, o Ipea desconta, dos investimentos brutos divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a depreciação dos bens de capital. De 2016 a 2020, o Brasil não investiu o suficiente para repor todo o desgaste dos ativos necessários para a produção, o transporte e a comercialização de produtos e serviços.
Nesse período, marcado por recessão doméstica, paralisia de obras executadas por empreiteiras envolvidas nos escândalos de corrupção da operação Lava Jato e pela pandemia da covid-19, o País chegou a perder, de forma inédita, parte da capacidade produtiva.
A reação econômica após o choque da crise sanitária foi rápida. Depois dela, o consumo continuou sendo sustentado por impulsos fiscais, geração de emprego e expansão do crédito, fazendo com que o uso da capacidade instalada nas fábricas voltasse a bater a marca de 83%. Esse porcentual não era registrado havia 11 anos na sondagem da indústria de transformação feita pela FGV.
Houve, assim, um incentivo para não só substituir as máquinas que chegavam ao fim de sua vida útil, mas também para expandir a capacidade, com as empresas contando, durante parte desse processo, com juros em nível abaixo da média histórica e, depois, com os incentivos da nova política industrial.
A siderúrgica Gerdau, a fabricante de baterias Moura e a petroquímica Braskem são exemplos de grupos que concluíram ou estão com projetos de expansão em curso. Enquanto a Gerdau investiu R$ 1,5 bilhão para produzir mais bobinas de aço na usina de Ouro Branco (MG), a Moura desembolsa R$ 850 milhões para dobrar a reciclagem de chumbo na fábrica de Belo Jardim (PE). Na Braskem, foram anunciados em janeiro R$ 614 milhões para ampliar a produção em usinas na Bahia, no Rio Grande do Sul e em Alagoas.
Segundo Marco Antônio Cavalcanti, técnico do departamento de estudos e políticas macroeconômicas do Ipea, a demanda aquecida, num contexto de uso relativamente elevado da capacidade instalada nas fábricas, trouxe um “incentivo natural” a novos investimentos. “Esse processo foi potencializado pelo ciclo de redução da Selic entre 2023 e 2024”, acrescenta o economista.
Entre os destaques do levantamento feito pelo Ipea, os investimentos em máquinas e equipamentos voltaram a superar a depreciação depois de nove anos, ainda que com uma diferença pequena, de apenas 2,8%, equivalente a R$ 16,8 bilhões, em 2024.
Já na infraestrutura, os investimentos chegaram perto de R$ 260 bilhões no ano passado e bateram dois recordes, segundo estimativas da Abdib, a associação que representa o setor. Foi a maior cifra da série estatística, iniciada em 2010, superando em quase 10% o pico anterior, registrado em 2014. Além disso, dentro do montante, os investimentos privados, de R$ 197 bilhões no ano passado, continuaram renovando recordes.
Mais de cem projetos de concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs) foram realizados no Brasil nos últimos três anos. Ao mesmo tempo, o novo arcabouço fiscal, ao trazer regras menos rígidas de gastos e um piso para investimentos públicos, abriu o caminho para a retomada de obras federais.
A associação brasileira de infraestrutura, em relatório divulgado em novembro, ressalta ainda que o País está criando um padrão de financiamento novo e inédito a projetos de infraestrutura.
Com os recursos de bancos públicos, surgiram novas formas de captação no mercado de capitais, com destaque para o lançamento das debêntures de infraestrutura.
Ex-economista do Banco Mundial nas áreas de indústria e energia, o consultor Cláudio Frischtak diz que os investimentos vêm crescendo no setor elétrico e no saneamento básico — este último na esteira da atualização do marco regulatório de 2020 e, mais recentemente, das privatizações de empresas como a Sabesp. Apesar disso, Frischtak observa que os investimentos seguem claramente insuficientes para modernizar a infraestrutura do País.
Estadão Conteúdo