Reino Unido e UE chegam a acordo para redefinir relações pós-brexit

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

O Reino Unido e a União Europeia assinarão nesta segunda-feira (19) uma redefinição histórica das relações pós-brexit. O acordo remove algumas barreiras comerciais e vai incluir colaboração na área de defesa.

O primeiro-ministro Keir Starmer, que apoiou a permanência na UE, aposta que garantir um acesso mais tranquilo à Europa para visitantes e comerciantes britânicos abafará os gritos de “traição” de apoiadores brexit.

No entanto, o acordo traz riscos políticos para Starmer, pois aborda questões sensíveis, incluindo os direitos de pesca, e muitos dos compromissos exigirão negociações adicionais.

O governo disse que a redefinição com seu maior parceiro comercial reduzirá a burocracia para produtores de alimentos e agrícolas, tornando os alimentos mais baratos, melhorará a segurança energética e adicionará quase £ 9 bilhões (R$ 70 bilhões) à economia até 2040.

Este é o terceiro acordo que o Reino Unido fecha neste mês, após os pactos com a Índia e os EUA. “É hora de olhar para frente”, disse Starmer em um comunicado. “Deixar para trás os debates antigos e as lutas políticas para encontrar soluções práticas e de bom senso que tragam o melhor para o povo britânico.

“Estamos prontos para trabalhar com parceiros se isso significar melhorar a vida das pessoas aqui em casa.”

O acordo está inserido na nova ordem global imposta pelo presidente americano, Donald Trump, que forçou governos ao redor do mundo a repensarem laços comerciais, de defesa e de segurança, aproximando Starmer do presidente francês Emmanuel Macron e de outros líderes europeus.

“É hora de olhar para frente -deixar para trás as velhas lutas políticas e encontrar soluções práticas e sensatas que melhorem a vida do povo britânico”, disse Starmer na rede X (antigo Twitter).

Uma concessão na área da pesca por parte do Reino Unido abriu caminho para o acordo. Embarcações britânicas e da UE terão acesso recíproco às águas por 12 anos, em troca de uma redução permanente na burocracia e nas verificações fronteiriças que têm impedido muitos pequenos produtores alimentares de exportar para a Europa.

Economistas da Universidade de Aston estimam que as exportações agroalimentares do Reino Unido para a UE podem aumentar em mais de 20% como resultado do acordo veterinário.

As exportações de alimentos e bebidas do Reino Unido para a UE foram de £14 bilhões (R$ 106 bilhões) em 2024, segundo a Federação de Alimentos e Bebidas, grupo de lobby da indústria. A indústria pesqueira do Reino Unido representa apenas cerca de 0,03% da produção nacional britânica.

O acordo desta segunda-feira é um prêmio econômico muito almejado nas negociações de “redefinição”, enquanto o outro ponto central será uma parceria de segurança e defesa, abrindo caminho para uma cooperação mais estreita entre Reino Unido e UE em rearmamento e treinamento militar.

Ambos os lados estiveram envolvidos em intensas negociações durante a noite de domingo (18) sobre os detalhes do acordo, incluindo pesca e comércio de alimentos, além da redação de um esquema proposto de mobilidade juvenil.

Starmer argumentou com sucesso que os dois lados deveriam continuar discutindo o esquema juvenil – incluindo a possibilidade de o Reino Unido retornar ao programa de intercâmbio estudantil Erasmus – em vez de fazer compromissos concretos na cúpula na Lancaster House.

Apesar das expectativas britânicas, o acordo de segunda-feira não incluiu disposições para permitir que cidadãos britânicos cruzem a fronteira para a UE de forma mais rápida, utilizando os portões eletrônicos de passaporte.

O bloco vinculou tal acordo, assim como novas regras para facilitar turnês de músicos britânicos, ao progresso na mobilidade juvenil, que permitiria que jovens adultos dos estados-membros estudassem e trabalhassem no Reino Unido e vice-versa.

Diplomatas da UE disseram que o texto final afirma que ambos os lados trabalharão para alcançar um acordo sobre a melhoria da mobilidade juvenil, prevendo meses de negociações. Eles descreveram o resultado como decepcionante, mas reconheceram que Starmer estava sob forte pressão doméstica sobre migração.

Embaixadores dos 27 estados membros se reuniram na manhã de segunda-feira para aprovar o pacote, enquanto os líderes das instituições da UE se dirigiam a Londres para formalizá-lo.

Grupos pesqueiros no Reino Unido temem que o acordo de 12 anos sobre pesca corra o risco de se tornar permanente, e políticos conservadores da oposição e a imprensa eurocética já estão alegando que o setor foi traído.

Jonathan Reynolds, secretário de Negócios do Reino Unido, disse que o setor pesqueiro se beneficiará do novo acordo veterinário, argumentando que isso ajudará a vender peixe e frutos do mar para a UE.

“Não se trata apenas do que você pesca, mas de para quem você vai vender”, disse ele.
Fontes do governo britânico informaram que ministros anunciarão nesta segunda-feira um “Fundo de Crescimento da Pesca e das Comunidades Costeiras” no valor de £ 360 milhões (R$ 2,7 bilhões) para investir em comunidades costeiras, na tentativa de conter a reação política.

Starmer também deve assinar o pacto de defesa e um comunicado prometendo uma cooperação econômica mais profunda durante uma reunião de duas horas com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, António Costa.

Esse acordo abrirá caminho para que o Reino Unido tenha acesso a um fundo de armas da UE de €150 bilhões (R$ 960 bilhões), embora os detalhes precisos sejam definidos posteriormente.

A cúpula UE-Reino Unido deve enfatizar um espírito de reconciliação, mas as negociações tensas em Bruxelas no domingo foram um lembrete de que o relacionamento agora é altamente transacional.

Os detalhes do acordo UE-Reino Unido são politicamente muito sensíveis.

O Reino Unido reconheceu que a remoção de barreiras ao comércio de alimentos exigirá que o país “alinhe-se dinamicamente” às regulamentações da UE à medida que mudam -e também faça pagamentos ao bloco para financiar trabalhos sobre padrões alimentares e animais.

Os detalhes do texto final serão publicados nesta segunda-feira, mas Starmer e seus interlocutores da UE enfatizarão as áreas de acordo em vez das tensões expostas pelas dolorosas negociações de última hora.

NOVE ANOS DE CRISE

O voto do Reino Unido para deixar a UE em um referendo histórico em 2016 revelou um país profundamente dividido sobre questões como migração, soberania e comércio.

Isso desencadeou um dos períodos mais tumultuados da história política britânica, com cinco primeiros-ministros no cargo antes da chegada de Starmer, em julho passado, e deteriorou as relações com Bruxelas.

Pesquisas mostram que a maioria dos britânicos agora lamenta o resultado do referendo, embora não deseje voltar à UE.

Em vez de buscar um retorno completo a um pilar do bloco, como o mercado único, Starmer procurou negociar melhor acesso ao mercado em algumas áreas -uma abordagem que muitas vezes é rejeitada pela UE como “escolha seletiva” de benefícios do bloco sem as obrigações da adesão.

A remoção da burocracia no comércio de alimentos exigirá que o Reino Unido aceite a supervisão da UE sobre os padrões de produção, mas Starmer provavelmente argumentará que vale a pena para ajudar a reduzir o custo dos alimentos.

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