Guerra na região de Tigré, na Etiópia, deixou veteranos incapacitados e sem assistência

Chandera Weldesenbet está preocupado com a possibilidade de morrer sem receber os cuidados de que precisa.

Aos 41 anos, o veterano da recente guerra na região de Tigré, na Etiópia, tem estilhaços de metal no corpo que ainda não foram removidos, mais de dois anos após o fim do combate.

Sem receber atendimento médico especializado, Chandera fica acamado a maior parte do tempo, devido às dores. Ele é uma das muitas vítimas cujos ferimentos, tratados de forma insuficiente, ou sem tratamento algum, servem de lembrança dos custos da guerra.

“Quando penso sobre minhas perspectivas para o futuro e minha possibilidade de criar um filho em meio a tantas dificuldades e circunstâncias, perco a esperança”, diz ele, com um filho pequeno em casa.

Chandera, ex-funcionário de um hotel na cidade de Shire, descobriu que as instalações de saúde da região foram praticamente destruídas pelo conflito.

O coordenador da Comissão Nacional de Reabilitação da Etiópia, Temesgen Tilahun, disse à Associated Press que existem mais de 43 mil ex-combatentes de Tigré.

Milhares de pessoas foram mortas na guerra que colocou os combatentes locais contra as tropas federais, aliadas a combatentes de outras regiões, e terminou em 2022. Ninguém sabe quantos ficaram feridos.

Alguns ex-combatentes de Tigré voltaram para suas casas e descobriram que não havia meios de receber assistência médica para deficiências permanentes.

Hiluf Haile conseguiu acesso à fisioterapia na capital de Tigré, Mekele, para se ajustar a uma nova prótese de perna, no único centro de Tigré que oferece esse tratamento. Mas ele testemunhou a escassez crônica de apoio para outros ex-combatentes mutilados

Muitos dos que sofreram ferimentos graves têm apenas acesso limitado à fisioterapia ortopédica, e precisam transitar por comunidades com pouca ou nenhuma infraestrutura de acessibilidade.

Eles “sobrevivem mendigando, expondo as cicatrizes da guerra”, conta Haile.

Tesfaye Kiros, outro veterano, perdeu uma perna e não consegue encontrar emprego. Ele pede esmolas regularmente em uma estação de ônibus movimentada em Mekele.

Ele sonha em voltar à cidade natal de Zalambessa, próximo à fronteira com a Eritreia, mas seu futuro permanece incerto diante das novas tensões que surgiram entre a Etiópia e a Eritreia, sua antiga aliada de guerra.

Aos 31 anos, Kiros havia ficado eufórico quando foi escolhido por uma organização na diáspora, Ações de Resgate e Oásis para os Mutilados de Guerra, para receber um triciclo elétrico que iria ajudá-lo a se locomover. Mas, sem conseguir encontrar trabalho, ele vendeu o veículo para alimentar seus filhos.

“O triciclo teria me ajudado muito”, lamenta.

Com recursos limitados enquanto Tigré se recupera da guerra, o governo regional recorreu ao governo federal, em Adis Abeba, a capital do país, para pedir mais apoio – e para que doadores internacionais possam contribuir.

O governo ofereceu aos veteranos reintegração nas forças armadas

“Tigré tem muitas pessoas com deficiência que precisam de apoio, especialmente médico, e a situação é extremamente grave”, diz Gebrehiwot Gebrezgiabher, integrante da Comissão de Gestão de Risco de Desastres de Tigré. “Estamos sobrecarregados demais para ajudá-los sem mais apoio financeiro.”

O Centro de Fisioterapia Ortopédica Mekelle, que funciona em Tigré há quase três décadas com apoio do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, está tentando suprir essa demanda.

O grupo vem oferecendo tratamento para combatentes mutilados, fornecendo próteses e auxiliares de marcha, como muletas, mas não tem condições de ajudar a todos que precisam sem mais recursos financeiros.

“Ao longo dos anos, realizamos um total de 180 mil atendimentos. Mas esse número parece pequeno em comparação aos 65 mil que ofertamos apenas nos últimos três anos”, diz o diretor, Birhane Teame.

Teame pediu às organizações internacionais que ajudem seu grupo “a aliviar o fardo” em Tigré.

Estadão Conteúdo

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