A denúncia feita nesta quinta-feira (15) pela coluna de Lauro Jardim, em O Globo, é tão absurda que chega a ser inacreditável — ou melhor, trágica. Os dirigentes de clubes e/ou federações assinaram um novo estatuto da CBF sem sequer terem recebido o texto do que estavam assinando. O documento, até hoje, não foi publicado no site da entidade e só agora veio à tona, meses depois, revelado pela imprensa.
Segundo fontes internas da própria CBF, os cartolas agora estão “loucos”, revoltados com o presidente Ednaldo Rodrigues, que teria apresentado apenas “alguns pontos” da reforma durante uma reunião em novembro. Na ocasião, disse que se tratava apenas de uma “adequação às normas da FIFA”. Mal sabiam eles que estavam entregando um cheque em branco.
As mudanças aprovadas — e secretamente mantidas até agora — concentram ainda mais poder nas mãos de Ednaldo. Entre elas:
• Permissão para que o atual presidente possa concorrer a um terceiro mandato;
• Fim da possibilidade de intervenção da diretoria em federações ou dirigentes — agora só o presidente pode agir;
• Autorização para contratos com empresas de familiares de dirigentes — o que era proibido;
• Esvaziamento de funções da diretoria, com concentração total nas mãos de Ednaldo.
É ingenuidade? É burrice? Ou é cumplicidade? Como é possível que dirigentes com direito a voto no colégio eleitoral da CBF assinem um novo estatuto — a “Constituição” da entidade — sem saber o que estão assinando? Não se trata de uma cláusula contratual qualquer. São mudanças profundas na estrutura de poder da maior entidade do futebol brasileiro.
E mais: isso é legal? Do ponto de vista jurídico, há muitos questionamentos a serem feitos. O uso da boa-fé dos signatários, a omissão deliberada de informações essenciais, a não publicação do estatuto… Tudo isso pode configurar abuso de poder, má-fé administrativa, possível fraude documental e até crime de falsidade ideológica, dependendo das circunstâncias e da comprovação de dolo.
O momento não poderia ser mais delicado. Ednaldo já é alvo de questionamentos no Supremo Tribunal Federal. Seu mandato está por um fio. A revelação desse escândalo pode ser mais uma peça a ser adicionada aos autos. A Justiça precisa saber: é possível manter no comando da CBF alguém que alterou sorrateiramente as regras do jogo para se perpetuar no poder?
O futebol brasileiro, mais uma vez, paga o preço da omissão e da covardia institucional.