SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
As esculturas da exposição “Popular, Populares”, em cartaz no Museu Afro Brasil, têm tanto movimento que parecem compor um filme esculpido em barro e madeira. Elas são como fotogramas que narram histórias de amor, aventura e violência que se passam no interior do Brasil.
Pelas mãos do célebre Mestre Vitalino, ganharam forma cangaceiros empunhando armas e facões. Já José Celestino concebeu homens e mulheres brandindo cartazes com palavras de ordem contra a fome e a favor da educação. Por outro lado, Noemisa decidiu pôr em evidência a afetividade ao retratar noivos durante um casamento.
Embora mostrem a rotina nos rincões do país, as obras passam longe da ideia de Brasil profundo. Afinal, o país que se revela nos trabalhos sempre esteve na superfície, só que nem todos estavam dispostos a enxergá-lo.
“Essa produção pode ser entendida como o coração do país, uma representação estética de uma certa brasilidade, aquilo que vem do nosso chão e do nosso povo”, diz Hélio Menezes, diretor artístico do Museu Afro.
Apesar de sua importância para compreender o Brasil, esses trabalhos ainda são vistos como uma produção menor dentro do circuito artístico. Se atualmente recebem o nome de arte popular, no passado eram chamados de “naïf”, palavra que significa ingênuo em francês.
O termo, hoje considerado pejorativo, faz referência a origem dos artistas. Essas figuras aprendem o ofício na prática, e não em espaços acadêmicos. Em geral, são pessoas negras e nascidas em regiões afastadas dos grandes centros urbanos.
É o caso, por exemplo, de Madalena dos Santos Reinbolt, conhecida por bordar paisagens rurais e urbanas usando linhas de lã.
Em 2022, a artista ganhou uma exposição no Masp, o Museu de Arte de São Paulo, que atualmente está em cartaz no American Folk Art Museum, em Nova York. Um de seus trabalhos, inclusive, abre a mostra do Museu Afro.
“Madalena não teve formação escolar em artes, entretanto realizou uma linguagem única e marcante”, diz Menezes.
Apesar do apuro estético, Reinbolt só despontou mesmo depois de sua morte, em 1977. É um problema comum entre artistas populares, grupo frequentemente posto nas margens do setor cultural. Por vezes, essa lateralidade não é apenas metafórica, mas também literal.
Quando assumiu o Museu Afro, no ano passado, Menezes percebeu que as obras desses artistas ficavam expostas nos corredores laterais que davam acesso aos banheiros, uma área secundária da instituição.
“Esse foi um dos motivos que nos incentivou a realizar uma mostra no espaço nobre do museu, visível de todos os ângulos e de todos os andares”, diz Menezes.
No Museu da Imagem e do Som, a cultura popular também ganhou centralidade. Só que dessa vez por meio das imagens da fotógrafa Dani Tranchesi.
Nas fotografias, vemos o Brasil multicolorido da festa do Boi Bumbá e o país cheio de fé dos festejos religiosos.
“Foi fascinante captar esses instantes da vida das pessoas, uma vida que é muito diferente daquela que tenho.” As imagens estão reunidas na exposição “Seja o que Deus Quiser”, título que dá pistas sobre o que o público encontrará na mostra.
Em sua prática artística, Tranchesi abdica do controle em favor da imprevisibilidade, o que torna suas imagens um registro de acontecimentos fortuitos. Isso pode ser visto nas fotos dos festejos de Iemanjá e de Santa Bárbara, em Salvador. “Eu gosto do que é inusitado, de sair e não saber o que exatamente vou encontrar.”
Entre 2019 e 2024, a artista percorreu diversas regiões do Brasil ao lado do Diógenes Moura , curador da mostra que também assina crônicas sobre as imagens.
Durante as incursões, a fotógrafa registrava os acontecimentos sem mirar numa perfeição técnica. O objetivo era justamente preservar a espontaneidade das cenas. “Às vezes, a foto está um pouco torta, às vezes a pessoa passou de relance. É muito difícil ter uma imagem de alguém posando, mesmo.”
Um desses poucos registros é a fotografia de dona Maria Helena, benzedeira de Juazeiro do Norte. No registro, ela está na frente de uma parede onde há inúmeras imagens religiosas, como quadros de Nossa Senhora e esculturas de Jesus Cristo. Na mostra do MIS, a expografia ressalta esse fervor religioso com um altar montado em torno da fotografia, o que confere uma atmosfera quase sagrada à benzedeira.
Imagens que povoam o imaginário popular também permeiam a exposição “Andy Warhol: Pop Art!”, no Museu de Arte Brasileira da Fundação Armando Álvares Penteado, a Faap. No entanto, o que está em evidência não são representações sagradas, mas símbolos da sociedade de consumo.
Ao andar pelos corredores expositivos, vemos as famosas telas que retratam Marilyn Monroe e as embalagens da sopa Campbell. Essas obras fazem parte de um conjunto com mais de 600 itens -a maior exposição do artista já realizada fora dos Estados Unidos.
“Pessoas que não têm um contato direto com a obra dele vão ter aqui uma oportunidade de ver uma quantidade poucas vezes vista”, diz Marcos Moraes, diretor do Museu de Arte Brasileira. “É uma exposição que abre muitas perspectivas de discussão sobre o mundo de hoje, em que memes, internet e redes sociais estão pululando.”
POPULAR, POPULARES
– Quando Ter. a dom., das 10h às 17h. Até 13 de julho
– Onde Museu Afro Brasil – Av. Pedro Alvares Cabral, Parque Ibirapuera
– Preço R$ 15
– Classificação Livre
SEJA O QUE DEUS QUISER
– Quando Ter. a sex., das 10h às 19h. Sab., das 10h às 20h. Dom., das 10h às 18h. Até 22 de junho
– Onde Av. Europa, 158 – Jardim Europa
– Preço R$ 10 (inteira)
– Classificação Livre
ANDY WARHOL: POP ART!
– Quando Ter. a dom., das 9h às 20h. De 1º de maio a 30 de junho
– Onde MAB FAAP – r. Alagoas, 903, São Paulo
– Preço R$ 70 (inteira)
– Classificação Livre