
Marcellus Campêlo
A Inteligência Artificial (IA) deixou de ser apenas uma inovação tecnológica e passou a representar uma poderosa aliada no enfrentamento dos principais desafios sociais. Não é por nada que é o tema central do Relatório de Desenvolvimento Humano 2023/2024. Intitulado “Pôr fim ao impasse: Reimaginar a cooperação num mundo polarizado”, o documento, divulgado recentemente pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), mostra que a IA pode fazer a diferença sobre os indicadores sociais, se for utilizada de forma ética e inclusiva.
O relatório revela que o progresso global do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) atingiu seu ponto mais baixo em 35 anos. Fatores como conflitos armados, crises de dívida, mudanças climáticas e tensões geopolíticas contribuíram para essa estagnação. Além disso, a desigualdade entre países ricos e pobres aumentou pelo quarto ano consecutivo, evidenciando a necessidade urgente de novas estratégias para retomar o crescimento sustentável.
A boa notícia é que o Brasil subiu cinco posições, alcançando a 84ª colocação entre 193 países e territórios. O IDH brasileiro foi de 0,786 em 2023, contra 0,780 em 2022. Esse índice coloca o país na categoria de Alto Desenvolvimento Humano.
O progresso brasileiro foi impulsionado por melhorias nos indicadores de renda nacional bruta per capita e expectativa de vida. No entanto, desafios ainda persistem, especialmente em relação às desigualdades regionais e setoriais. Nesse contexto, o uso responsável de tecnologias emergentes, como a IA, surge como crucial para garantir um progresso sustentável e inclusivo para todos os brasileiros.
Como o IDH é o principal parâmetro de qualidade de vida, a IA, sem dúvida, tem potencial capaz de transformar realidades, ampliar o acesso aos direitos básicos e gerar impactos duradouros nas políticas públicas. O Relatório do PNUD destaca a IA como um dos pilares estratégicos para destravar o progresso humano, atingindo os três eixos do IDH: educação, saúde e renda.
No primeiro eixo, vejo que as soluções inteligentes podem ajudar a personalizar o ensino, reduzir a evasão escolar e elevar a qualidade da educação, com o uso de plataformas de aprendizagem, tutores virtuais e análise de desempenho. Em comunidades remotas, a IA pode viabilizar a educação à distância com conteúdo localizado, superando as barreiras geográficas e a falta de infraestrutura física.
No Amazonas, a IA já é uma ferramenta incorporada à educação, em diversas iniciativas do Governo do Estado, que possibilitaram a modernização do ensino, capacitação de professores e melhoria da gestão escolar.
A saúde é outro bom exemplo de uma área que vem recebendo investimentos do Governo do Amazonas na área tecnológica. No início do ano, o governador Wilson Lima lançou o Programa Saúde AM Digital, seguindo essa tendência de usar a IA a favor da população e como ferramenta para vencer as barreiras geográficas.
O programa conta com assistente virtual, que possibilita a comunicação com o usuário para confirmação de consultas e exames, permitindo o reagendamento e a ocupação da vaga com pacientes que aguardam atendimento pelo Sistema de Regulação (Sisreg).
Conta, ainda, com o sistema de teleconsultas, oferecendo 12 especialidades médicas que podem ser acessadas à distância, pelo celular ou nas telessalas que estão sendo instaladas nos municípios. Com isso, a Secretaria de Estado de Saúde (SES-AM) garante qualidade e agilidade no atendimento, além de ampliar o acesso da população aos serviços públicos.
Na parte de renda e empregabilidade, a IA também pode impulsionar a produtividade, automatizar tarefas repetitivas e criar novas oportunidades de negócios e serviços digitais. Com qualificação adequada, pode favorecer a inclusão no mercado de trabalho digital, principalmente entre jovens e populações vulneráveis.
É preciso ressaltar, entretanto, que, apesar do potencial, os benefícios da IA não se distribuem de forma automática. É necessário um olhar especial para países e regiões com baixo acesso à internet, baixa escolaridade e infraestrutura limitada. Para que a IA seja um motor real de melhoria do IDH, é vital democratizar ainda mais o acesso à tecnologia.
É com esse olhar que o Governo do Amazonas, ao implementar o Programa Saúde AM Digital, por exemplo, incluiu também o apoio para que os municípios do interior, onde os problemas são maiores, possam ter o incentivo necessário para fornecer estrutura de atendimento para quem não tem acesso à internet ou tem dificuldade para uso da tecnologia. As telessalas que estão sendo montadas estão suprindo essa dificuldade, garantindo conectividade e ajudando na formação das pessoas para uso das ferramentas.
No Programa Social e Ambiental de Manaus e Interior (Prosamin+), executado pela Unidade Gestora de Projetos Especiais (UGPE), pasta que administro, também há recursos previstos para apoio nas ações de transformação digital no estado. O programa destinou 5 milhões de dólares para a Empresa Processamento de Dados do Amazonas (Prodam), numa parceria que também envolve a Secretaria de Estado de Administração e Gestão (Sead). O objetivo é melhorar a capacidade de governança, cibersegurança e gestão dos serviços públicos, com foco, principalmente, nos usuários.
Em 2024, foram liberados, por meio do Prosamin+, R$ 8,6 milhões. O montante de R$ 1,6 milhão foi para aquisição de software de gestão de patrimônio, por parte da Sead, e R$ 7 milhões repassados à Prodam para a compra de equipamentos.
A Prodam recebeu seis novos servidores hiperconvergentes Nutanix de última geração. Os novos servidores fizeram aumentar em mais de dez vezes a capacidade de processamento e armazenamento da empresa. Os equipamentos estão sendo utilizados no processamento de informações de sistemas que atendem à população, como os de trânsito, educação e saúde, além de soluções voltadas à governança, como o Sistema Integrado de Gestão Eletrônica de Documentos (Siged).
Os exemplos citados aqui mostram que o Governo do Amazonas já vem trilhando, com certa folga, esse caminho agora indicado pelo PNUD. Mas é preciso entender que a tecnologia, e a Inteligência Artificial como foco principal, não é, por si só, uma solução mágica. Deve ser aliada a políticas públicas inteligentes, investimento social e inclusão digital, como tem sido feito aqui, para que realmente possa acelerar o desenvolvimento humano de forma exponencial, beneficiando as regiões historicamente excluídas.
A tecnologia é elemento fundamental para a atualização de setores como educação e saúde, para que possam atender às demandas do século XXI, preparando as populações para um mundo cada vez mais digital.
A escolha está nas mãos dos formuladores de políticas, gestores públicos e da sociedade civil: usar a IA como ferramenta de exclusão ou como ponte para uma vida melhor para todos.
Marcellus Campêlo é engenheiro civil, especialista em Saneamento Básico e em Governança e Inovação Pública; exerce, atualmente, os cargos de secretário de Estado de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano – Sedurb e da Unidade Gestora de Projetos Especiais – UGPE
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