Diplomatas veem erro em quebra de protocolo de Janja e apontam tema sensível para China

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RICARDO DELLA COLETTA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Os comentários da primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja, com críticas ao TikTok durante encontro de Lula (PT) com o presidente da China, Xi Jinping, podem ter sido interpretados pelo governo chinês como uma quebra de protocolo, avaliam diplomatas ouvidos pela reportagem, situação agravada por se tratar de um tema altamente sensível para o regime.

Apesar do que consideram um erro, eles dizem que qualquer incômodo surgido pela situação tende a ser pontual e não deve ter maiores impactos sobre a relação bilateral entre Brasil e China, principalmente pela posição altamente pragmática de Pequim.

Janja causou incômodo na delegação chinesa ao falar com Xi sobre os efeitos nocivos da rede social TikTok. Segundo noticiado pelo portal G1, ela teria dito que o algoritmo da rede social favorece a direita. A Folha confirmou que a intervenção de Janja gerou desconforto entre os representantes chineses.

Lula foi questionado sobre o tema em entrevista coletiva no fim da viagem. Na ocasião, disse que partiu dele a iniciativa de abordar a regulação do TikTok e que Janja apenas comentou o tema posteriormente. O presidente criticou a própria delegação brasileira pelo vazamento da conversa.

“Alguém teve a pachorra de contar uma conversa que aconteceu em um jantar e que era muito pessoal e confidencial”, afirmou Lula. “Se o ministro estivesse incomodado, ele deveria ter me procurado e pedido para sair [da reunião]”, afirmou Lula sobre a situação.

De acordo com o presidente, a resposta de Xi foi a de que o Brasil tem o direito de fazer a regulamentação das redes. “Não é possível a gente continuar com as redes sociais cometendo os absurdos que cometem, e a gente não ter a capacidade de fazer uma regulamentação.”

Ainda segundo Lula, Xi se comprometeu a enviar uma pessoa para discutir a regulamentação das redes no Brasil.

Diplomatas consultados nesta quarta-feira (14) indicam dois aspectos que podem explicar o incômodo da parte chinesa com o comentário de Janja.

O primeiro é o rígido protocolo que rege as visitas de Estado na China, em que tudo ocorre sob estrita formalidade.

De acordo com pessoas que já interagiram nesses tipos de recepção, há pouco espaço para improvisação, e situações que fogem do previamente combinado são malvistas.

O episódio ocorreu no jantar oficial oferecido a Lula por Xi, na residência oficial do líder chinês.

O segundo ponto é o fato de Janja, sem cargo oficial, ter interpelado Xi diretamente sobre um tema altamente sensível para Pequim.

O popular aplicativo de compartilhamento de vídeos, com mais de 170 milhões de usuários nos Estados Unidos, está ameaçado por uma lei americana aprovada no ano passado que exige que o TikTok se separe de seu proprietário chinês ByteDance ou feche as operações nos EUA.

O argumento é que o governo chinês poderia colher dados de cidadãos americanos por causa de suas conexões com o TikTok. Há ainda preocupação do lado americano de que a China poderia usar o aplicativo para impulsionar desinformação nos EUA com objetivos políticos. Pequim nega as acusações.

Trump suspendeu a aplicação da lei federal que prevê o banimento do TikTok e estabeleceu o prazo de 19 de junho para que haja um acordo pelo qual investidores americanos comprem o aplicativo.

Apesar do episódio em Pequim, a avaliação de diplomatas ouvidos é a de que seja improvável qualquer efeito concreto sobre as relações entre Brasil e China. Isso porque os chineses têm uma visão estratégica que prioriza o pragmatismo e o planejamento de longo prazo.

Como exemplo, eles citam que o Brasil é um importante fornecedor de alimentos para os chineses, com exportações que somaram US$ 94,3 bilhões em 2024.

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