Por Renata Bueno*
Em 1º de maio de 2025, a cidade de Polignano a Mare, localizada na região da Puglia, no sul da Itália, protagonizou um gesto de profundo simbolismo histórico ao aprovar, por unanimidade na Câmara Municipal, a nomeação de uma rua em homenagem à advogada brasileira Eunice Paiva, descendente direta de imigrantes locais.
Essa decisão ressoa com um ideal que venho defendendo há tempos: o fortalecimento dos vínculos entre Brasil e Itália através da memória, da justiça e do reconhecimento mútuo. Eunice Paiva é muito mais do que uma figura histórica. Ela é símbolo de resistência e dignidade em uma narrativa que continua a ecoar com intensidade. Sua trajetória foi retratada com sensibilidade no filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional.
A obra conquistou o mundo e, na Itália, emocionou multidões ao retratar, com profundidade, uma história marcada por coragem, sofrimento e esperança. Eunice não viveu apenas dramas pessoais; ela representa a incansável luta pelos direitos humanos, pela democracia e pela reconstrução de vidas devastadas pela ditadura militar brasileira, que ceifou a vida de seu marido, Rubens Paiva. A decisão da cidade de batizar uma rua com seu nome, na terra de onde vieram seus antepassados, carrega uma beleza singular. Não se trata apenas de uma homenagem geográfica, mas do reconhecimento de laços afetivos, culturais e históricos que cruzam oceanos.
Nascida no bairro do Brás, em São Paulo, berço da comunidade ítalo-brasileira, Eunice cresceu imersa nas tradições italianas, profundamente tocada pela herança de seus avós e pelo espírito coletivo de festas como a de São Vito, que segue viva na memória de milhares de descendentes.
Como tantos imigrantes italianos, os avós de Eunice não deixaram apenas heranças materiais, mas também um legado de valores, cultura e humanidade. A história de Eunice comprova que o caminho da imigração ítalo-brasileira não foi apenas de ida: ele também aponta para o retorno, para o reencontro com as origens e para a valorização de nomes que merecem ser eternizados.
Essa homenagem me toca de maneira especial. Vivendo na região da Puglia, onde se localiza Polignano a Mare, sinto uma emoção imensa ao testemunhar a concretização simbólica dessa ponte entre o Brasil e a Itália.
Esse gesto é a prova viva de como é fundamental preservar o elo entre nossos países, um elo sustentado por histórias como a de Eunice, que seguem inspirando e transformando. Como ex-deputada italiana eleita pela circunscrição da América do Sul, tive o privilégio de atuar em favor desse reconhecimento mútuo. Trabalhamos por reformas cidadãs, por acordos bilaterais e, principalmente, pela valorização das contribuições dos ítalo-brasileiros dos dois lados do Atlântico. A rua “Eunice Paiva” em Polignano a Mare torna-se, assim, um símbolo.
Um marco para os moradores da cidade, para os brasileiros com raízes italianas e para todos que compreendem o poder da memória como agente de mudança. Que este gesto inspire novas ações de valorização histórica e cultural, e que o exemplo de Eunice siga iluminando caminhos de justiça, dignidade e reconciliação.

Renata Bueno é uma parlamentar ítalo-brasileira nascida em 1979 em Brasília, DF, Brasil. Conhecida por seu envolvimento na política e na defesa dos direitos dos descendentes de italianos no Brasil. Renata Bueno foi eleita deputada federal em 2010, sendo a primeira mulher eleita pelo Partido Socialista Italiano (PSI) fora da Itália. Sua atuação política tem sido focada em temas relacionados à cidadania italiana, imigração, e fortalecimento dos laços entre Brasil e Itália. Ela é presidente da Associação pela Cidadania Italiana no Brasil e tem trabalhado para facilitar o processo de reconhecimento da cidadania italiana para descendentes de italianos no país. Além de parlamentar, Renata é advogada e empresária, com o Instituto Cidadania Italiana e Mozzarellart.