SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (7), por 315 a 143, um pedido do PL para interromper a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), réu no caso da trama golpista para impedir a posse de Lula (PT).
O projeto abre brecha para tentar atingir todo o processo relativo à trama golpista de 2022 e beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O presidente da Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal), Cristiano Zanin, porém, já havia avisado a Câmara sobre restrições de competência dos deputados nesse caso, e quatro ministros da corte afirmaram à reportagem que a medida é inconstitucional.
A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) já tinha avalizado nesta quarta, por 44 votos a 18, a suspensão da ação contra Ramagem, com uma brecha para tentar suspender o processo “em sua integralidade”. Esse trecho impactaria diretamente o ex-presidente e outros réus no caso.
A proposta determina, de forma genérica, sem mencionar Ramagem, que o andamento da ação penal fica sustado.
O texto contraria o entendimento do STF, que determina que a avaliação sobre a eventual suspensão de ação penal é restrita aos atos cometidos pelo congressista após sua diplomação.
Entenda o projeto e sua repercussão até agora.
O PROJETO
O PL, partido de Jair Bolsonaro, pediu à Câmara a suspensão de ação penal contra Alexandre Ramagem no caso da trama golpista de 2022 enquanto ele for deputado federal. A proposta é um recurso contra a decisão do STF e passou primeiro pela CCJ, relatada pelo bolsonarista Alfredo Gaspar (União Brasil-AL).
Gaspar concordou com o requerimento e propôs que a ação penal seja suspensa “em sua integralidade” no relatório, o que poderia beneficiar Bolsonaro por interromper a ação em todas as suas ramificações, para todos os réus.
O relatório foi aprovado na CCJ por 44 votos a 18. No plenário da Casa, teve 315 votos a favor e 143 contra. A decisão da Câmara tem efeito imediato, sem precisar passar pelo Senado.
SUSPENSÃO DE AÇÕES NA CÂMARA
A Câmara dos Deputados e o Senado possuem a atribuição, segundo a Constituição de 1988, de sustar ações penais após o acolhimento da denúncia contra algum congressista pelo STF.
Segundo o artigo 53, dos parágrafos terceiro a quinto, a ação é interrompida se a maioria da Casa votar em favor da suspensão, suspendendo também a prescrição enquanto durar o mandato.
O caso de Ramagem é o primeiro do tipo a ser analisado pela Câmara. Os congressistas também veem o caso do aliado de Bolsonaro como uma forma de abrir precedentes para beneficiar eventuais processos na corte contra deputados acusados de desviar emendas parlamentares.
REAÇÃO DO GOVERNO
Diante da movimentação da oposição como forma de ajudar Bolsonaro, a base do governo já se prepara para contestar a aprovação do relatório de Alfredo Gaspar. Segundo o líder do PT na
Câmara, o deputado Lindbergh Farias (RJ), a pauta é uma nova versão da anistia.
Os governistas também entendem que o Legislativo não tem poder para determinar o trancamento de todo o processo a todos os réus.
“A gente vai primeiro tentar convencer os deputados da loucura que é isso. Alguém vai provocar o Supremo, e o Supremo vai declarar inconstitucional. Então, é melhor a Câmara não entrar nessa aventura”, disse Farias antes da votação.
QUESTIONAMENTO NO SUPREMO
O presidente da Primeira Turma do STF, Cristiano Zanin, já havia avisado a Câmara sobre restrições de competência dos deputados nesse caso, e quatro ministros da corte afirmaram à Folha que a medida é inconstitucional.
Na avaliação de advogados ouvidos pelo Painel, a suspensão de toda a ação penal pode ser questionada pela PGR (Procuradoria-Geral da República), abrindo caminho para que o Supremo derrube a medida.
Outro caminho pode ser uma contestação de um partido diretamente a Zanin, que levaria a discussão ao STF.
Há uma expectativa entre congressistas de que, se o caso for judicializado, a corte dará ordem nesse sentido, mas teria o desgaste de ter de se posicionar sobre o tema mais uma vez.
NOVO ATRITO ENTRE OS PODERES
Em ofício enviado a Hugo Motta há duas semanas, Zanin afirmou que a Casa só tinha competência para sustar crimes de deputados imputados após a diplomação. Isso limitaria a sustação a dano qualificado ao patrimônio e deterioração do patrimônio tombado.
Outros três crimes -associação criminosa armada, golpe de Estado e abolição do Estado democrático de direito- pelos quais o deputado é acusado, que teriam sido cometidos antes da diplomação, não seriam abrangidos, no entendimento de Zanin.
Ramagem afirmou, durante a sessão da CCJ que aprovou texto em seu favor, que a suposta perseguição do Judiciário que estaria ocorrendo agora poderia atingir políticos de esquerda.