Em um trio elétrico, que ocupou entre duas e três faixas, cerca de 10 mil pessoas vestidas de verde e amarelo participaram nesta quarta-feira (7) da “Caminhada Pacífica pela Anistia Humanitária”, em apoio ao projeto de lei que prevê anistia para os condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023. O ato, realizado em Brasília, contou com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de parlamentares da oposição e de apoiadores da pauta. Em geral, os discursos foram dirigidos aos representantes do Parlamento, de quem os bolsonaristas dependem para prosseguir com o projeto de anistia.
A concentração começou na Torre de TV, no Eixo Monumental, de onde os manifestantes seguiram em direção ao Congresso Nacional em uma caminhada de cerca de três quilômetros, acompanhada por carro de som. O evento é organizado pelo pastor Silas Malafaia, que também participou dos discursos ao longo do trajeto. Como de costume, ele discursou depois da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro e antes de Jair Bolsonaro.
Apesar da recomendação médica para evitar aglomerações após cirurgia intestinal, Bolsonaro participou do ato após receber alta hospitalar no último fim de semana. Ele esteve internado por 22 dias por complicações decorrentes do atentado que sofreu em 2018.
“Deixamos uma marca no meio de vocês. Vocês conheceram seu país por dentro. Hoje nós sabemos quem somos, o que queremos e para onde iremos. Tudo passa pela decisão de vocês. Eu sou apenas instrumento. Eu sou apenas empregado de vocês. Não tenho nenhuma obsessão por poder, eu tenho paixão pelo meu Brasil. Eu não sei como alguns poderosos, fazendo tanta maldade, conseguem dormir em paz uma noite seque dessa vida”, afirmou o ex-presidente.
Bolsonaro fez ainda um apelo ao poder Legislativo e frisou a ideia de que cabe à Casa o futuro dos condenados no 8 de janeiro.
“Quem esperava um público como esse em Brasília no meio da semana, ninguém esperava isso. A anistia é um ato político e privativo do parlamento Brasileiro. O parlamento votou e ninguém tem que se meter em nada. A todos vocês, muito obrigado mais uma vez. Obrigado pelo momento e pela oportunidade”, disse Bolsonaro
Em sua fala, Michelle comparou as penas aplicadas aos envolvidos no 8 de janeiro a outros casos, em que o Supremo Tribunal Federal (STF), segundo ela, agiu de forma mais complacente.
“Uma ex-primeira dama do Rio de Janeiro foi condenada na operação Calicute. Ela pegou 18 anos de prisão. Foi presa em dezembro de 2017. Final de março de 2018, ela estava solta. Ao analisar o pedido de defesa de Adriana Ancelmo, Gilmar Mendes argumentou que a prisão de mulheres gravidas ou com filhos é absolutamente preocupante”, disse Michelle ao defender a cabeleireira e mãe de dois filhos, Débora Rodrigues dos Santos, responsável por pichar com batom vermelho a frase “perdeu, mané” na estátua da deusa Themis, durante os atos golpistas.
Michelle se referiu a ex-primeira dama Adriana Ancelmo, em um caso de 2017. Na ocasião, Adriana foi condenada pela primeira vez no âmbito da Operação Calicute, braço da Lava Jato no estado. Já o ex-governador Sérgio Cabral teve a pena ampliada para quase 60 anos de prisão. O esquema de corrupção, que desviou mais de R$ 220 milhões entre 2007 e 2014, foi revelado com a colaboração de executivos das empreiteiras Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia. A operação prendeu Cabral em novembro de 2016, mas também já foi solto.
Da mesma forma, apesar do apelo da ex-primeira dama, especialistas apontam que Débora não deve ficar presa por muito tempo e, no pior dos casos, ela irá progredir ao regime semiaberto até o final deste ano.
Como foi apontado, antes mesmo da manifestação, o discurso de Malafaia cedeu espaço para tecer elogios à decisão do ministro Luiz Fux.
“O ministro Fux acaba com a farsa do golpe. O ministro Fux desmascarou Alexandre de Moraes. Ele disse não tem prova de golpe de Estado, não tem prova de associação armada, não tem prova de abolição violenta de estado democrático. Pertence ao judiciário julgar, quando eles julgas, mesmo quando estão errados, ninguém pode falar nada. Anistia é exclusiva do poder legislativo. STF não pode meter o bedelho. O STF pode condenar a 200 anos se eles quiseram, acabou, a partir daí é congresso nacional.”, disse Malafaia.
Já o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, destacou a quantidade de manifestantes presentes e elogiou a disposição de Bolsonaro.
“Parabéns, Bolsonaro! Se você tivesse sarado uma semana antes, eu não sei como estaria isso aqui. Já tem 10 mil pessoas aqui. Olha, um trabalho pacífico, tranquilo, ninguém pode reclamar disso. Nós estamos aqui para acabar com o sofrimento dessa gente. Vai ter o nosso apoio e nós vamos ter Jair Bolsonaro como candidato a presidência da república”, disse Costa Neto.

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Também estiveram presentes os deputados federais Nikolas Ferreira (PL-MG), Gustavo Gayer (PL-GO), Marco Feliciano (PL-SP), Eros Biondini (PL-MG), Sargento Fahur (PSD-PR) e Mauricio do Vôlei (PL-MG), além dos senadores Magno Malta (PL-ES), Damares Alves (PL-DF) e Eduardo Girão (Novo-CE). Familiares de presos, influenciadores digitais e caravanas vindas de ao menos nove estados também participam da mobilização.
Foi a primeira manifestação organizada por grupos de direita que se aproxima da Praça dos Três Poderes desde os episódios de depredação nas sedes dos Três Poderes, em janeiro de 2023. Por esse motivo, o Supremo Tribunal Federal reforçou seu esquema de segurança. A Polícia Militar do Distrito Federal e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência acompanharam o ato.
Segundo Malafaia, o evento foi comunicado previamente às autoridades e contou com um plano de segurança para evitar incidentes.
A manifestação busca aumentar a pressão sobre o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), para que leve à votação o requerimento de urgência para o projeto de anistia. O pedido reúne 262 assinaturas, cinco a mais do que o mínimo necessário. Motta, no entanto, tem evitado colocar o tema em pauta, sob argumento de que a proposta não é prioridade no momento.
Eleito com apoio de setores da oposição e da base do governo, Motta chegou a sinalizar apoio à anistia no início do ano, mas desde então recuou. A oposição reagiu iniciando uma obstrução dos trabalhos legislativos, mas até agora não obteve êxito em alterar a posição do presidente da Câmara, que também enfrenta resistência do governo federal e do Supremo Tribunal Federal quanto ao avanço da proposta.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não esteve em Brasília nesta quarta-feira. Ele viajou na noite anterior para a Rússia, onde participa de compromissos internacionais.