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Pela primeira vez em quase um século de existência, o Aeroclube do Rio Grande do Norte recorreu à Justiça para discutir a propriedade do terreno onde está instalado desde 1928, localizado no bairro Tirol, em Natal. A ação, intitulada querela nullitatis insanabilis cumulada com ação declaratória de nulidade, foi ajuizada contra a União e o Estado do Rio Grande do Norte e busca reverter atos de expropriação e dissolução considerados ilegítimos, ocorridos durante a ditadura militar.
O centro da disputa
O Aeroclube foi fundado em 1928 e, desde então, ocupava a área com um edifício-sede e um campo de pouso. Em 1952, a entidade recebeu formalmente a doação do terreno por meio de escritura pública lavrada com base na Lei Estadual nº 582/1951. Durante décadas, o uso do imóvel nunca foi questionado, até que, no auge do regime militar, o Ministério da Aeronáutica cassou a autorização de funcionamento da escola de aviação, alegando descumprimento ao Decreto-Lei nº 205/67. Isso levou, em 1969, à dissolução do Aeroclube por decisão da Justiça Federal, com trânsito em julgado em 1973.
Na sequência, o imóvel foi adjudicado à União e teve seu registro transferido. O Aeroclube, no entanto, alega que jamais deixou de existir e que sua dissolução foi apenas um instrumento para permitir a expropriação do terreno, sem o devido processo legal e sem pagamento de indenização.
Nova ofensiva judicial
A ação atual propõe a nulidade dos atos praticados durante o regime militar com base em princípios de justiça de transição. Os advogados do Aeroclube sustentam que a expropriação violou o direito fundamental à propriedade e à liberdade de associação, protegidos por tratados internacionais e pela Constituição da época.
Além disso, o processo denuncia que, mesmo após a sentença que rejeitou a reivindicação de posse feita pela União em 1994, o Estado do Rio Grande do Norte teria conseguido, de forma irregular e sem contraditório, restaurar o registro do imóvel em seu nome, mediante despacho em execução de sentença que não autorizava tal medida.
Reversão questionada
A disputa é agravada pela cláusula de reversão prevista na lei de doação, que estabelecia o retorno do bem ao Estado em caso de extinção da entidade donatária. Contudo, os atuais representantes do Aeroclube afirmam que a entidade nunca foi legalmente extinta, tendo apenas sofrido perseguições políticas e administrativas durante a ditadura. Também argumentam que a entidade manteve suas atividades esportivas e sociais, o que afastaria a alegada perda de finalidade da doação.
Um julgamento com reflexos históricos
A ação reacende o debate sobre os efeitos de atos administrativos e judiciais realizados no período autoritário e coloca o Judiciário diante do desafio de avaliar a validade de decisões que, segundo a parte autora, violaram garantias fundamentais. A decisão do caso poderá ter repercussões tanto jurídicas quanto simbólicas, ao tocar na legitimidade da posse e propriedade de um dos espaços mais tradicionais da cidade.
Por ora, o Aeroclube segue em sua sede histórica, buscando no Judiciário não apenas a preservação de seu espaço físico, mas também o reconhecimento de sua história e resistência institucional.
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