THAÍSA OLIVEIRA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Símbolo da democracia brasileira, a praça dos Três Poderes vive avanços e reveses desde os dois últimos atentados extremistas e pode passar agora pela primeira grande reforma desde a inauguração, em 1960.
Considerada por alguns como a praça mais importante do Brasil -além de uma das mais representativas da arquitetura modernista no século 20-, o espaço está localizado na cabine do avião imaginário projetado por Lucio Costa para Brasília.
Em cada uma das pontas do triângulo equilátero, em um sinal de equivalência e independência, estão as sedes dos Três Poderes: o Palácio do Planalto (Executivo), o Supremo Tribunal Federal (Judiciário) e o Congresso Nacional (Legislativo).
Desde que foi inaugurada, a praça foi ganhando novas estruturas -como um pombal, feito a pedido da ex-primeira-dama Eloá Quadros, esposa do ex-presidente Jânio Quadros- e se transformando junto com a cidade.
“Nos anos 1980 e 1990 era muito comum os jovens de Brasília se encontrarem na praça dos Três Poderes para tocar violão, jogar conversa fora e tomar vinho barato”, explica o publicitário João Carlos Amador, autor do livro “Histórias de Brasília”.
“Isso porque era uma cidade que não tinha muitas opções de lazer. A praça acabou virando um ponto de encontro, até mesmo para que as pessoas se reunissem para saber o que fazer depois. Isso foi se perdendo nos anos 2000”, diz.
Com dois atentados inéditos no local -o ataque golpista de 8 de janeiro de 2023 e a explosão de um homem-bomba, em 2024-, o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) agora tenta reocupar a praça dos Três Poderes.
Sob a responsabilidade do Governo do Distrito Federal, a praça passou apenas por restauros pontuais nos últimos anos e viu as pedras portuguesas do piso -muitas delas soltas por falta de manutenção- serem usadas como arma para destruir vidraças em 8 de janeiro.
Em 2021, o governo do DF chegou a propor um projeto de reforma ao Iphan, mas o órgão cobrou alterações para garantir a preservação de características originais, uma vez que a praça é tombada a nível nacional e distrital.
Agora, o próprio Iphan tenta destravar a recuperação do local por meio da captação de recursos via Lei Rouanet. O instituto afirma que a restauração está estimada entre R$ 22 milhões e R$ 25 milhões e que já há empresas interessadas em participar.
“A gente não quer a reforma da praça só para ver ela restaurada e bonita de novo. Também. Mas acima de tudo porque a gente quer povo. A gente quer gente na praça”, afirma o presidente do Iphan, Leandro Grass.
A proposta apresentada prevê a recuperação do piso de pedras portuguesas, o restauro de obras de arte, iluminação, revitalização de museus, projeto de acessibilidade e instalação de câmeras de segurança.
O projeto foi desenvolvido pela empresa vencedora da licitação, Land 5 Arquitetura e Urbanismo, ao custo de R$ 744 mil. Apesar disso, a proposta tem despertado críticas entre especialistas, especialmente pela instalação de bancos e estruturas metálicas que possam criar sombra.
“A praça é seca para denotar essa austeridade. Ela não é uma praça festiva, de permanência ou de encontros casuais, uma coisa bucólica, pitoresca”, afirma o arquiteto e professor da UnB (Universidade de Brasília) Eduardo Pierrotti Rossetti.
“A praça existe para revelar para quem vivencia aquele espaço, com plena visibilidade, os três palácios que representam os Três Poderes. Nisso, o projeto do Lúcio Costa é absolutamente brilhante; entendeu o problema da carga simbólica do que é uma capital.”
O Iphan afirma que a instalação dos bancos e dos ombrelones está prevista para a última etapa da obra e “ainda será discutida com a população, com profissionais e instituições relacionadas tanto com a temática da preservação quanto ao uso contínuo da praça”.
Segundo o instituto, a obra de restauração dos elementos já existentes, que inclui piso, esculturas, bancos e fachada do Museu da Cidade, tem início previsto para julho e pode ser concluída até o ano que vem.
O Iphan também espera que o sistema de monitoramento previsto no projeto ajude a praça a se livrar das grades que passaram a cercar as sedes dos Poderes nos últimos anos.
Após o atentado de 8 de janeiro, o presidente Lula (PT) determinou a retirada das grades em frente ao Palácio do Planalto e convidou os demais Poderes a fazerem o mesmo. O gesto foi efetivamente seguido, mas as grades voltaram ao Supremo depois do atentado promovido pelo homem que morreu ao se explodir.
“Queremos Brasília sem grades. Essa é uma postura institucional, respeitando o momento, respeitando as circunstâncias, mas trabalhando para reverter esse quadro de insegurança e tensionamento”, diz o presidente do Iphan.
REABERTURA DA CASA DE CHÁ ATRAI TURISTAS
Desde junho do ano passado, a praça dos Três Poderes tem atraído turistas e moradores com a reabertura de um café projetado por Oscar Niemeyer entre 1965 e 1966 (seis anos após a inauguração de Brasília e da praça).
A “Casa de Chá” de Niemeyer foi usada durante cerca de cinco anos como centro de atendimento ao turismo, após ser fechada em 1994. O café foi reinstalado a partir de uma parceria entre o governo do DF e o Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e atrai cerca de 12 mil visitantes por mês, segundo o governo local.
“A Casa de Chá já é um dos pontos mais visitados do Distrito Federal. Brasília é política, ela faz parte da vida em sociedade, mas Brasília é muito mais e é isso que a gente vai mostrar”, afirma o secretário de Cultura do DF, Cláudio Abrantes.