
De acordo com a fiscalização do trabalho, ela vivia em condições degradantes, sem carteira assinada, férias ou descanso semanal. Caso segue sob investigação. Idosa é resgatada de trabalho escravo em Belo Horizonte
Uma trabalhadora doméstica de 63 anos foi resgatada em Belo Horizonte após mais de 30 anos de serviços prestados a uma mesma família, chefiada por um advogado, sem salário, registro em carteira ou qualquer direito trabalhista.
Segundo a fiscalização, a mulher morava e trabalhava na casa dos investigados desde os anos 1990. Durante todo o período, era exigido que ela realizasse tarefas como cozinhar, lavar e passar roupas, limpar a residência e cuidar de crianças, idosos e animais da família.
Em troca, recebia apenas moradia e alimentação. Ela não tinha jornada de trabalho definida, não descansava aos fins de semana nem em feriados e não tinha férias.
A operação, conduzida por auditoras fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com o apoio do Ministério Público do Trabalho e da Polícia Militar, teve início em fevereiro e foi concluída em abril, mês em que se celebra o Dia Nacional da Trabalhadora Doméstica.
Violência psicológica e assédio moral
Trabalho análogo à escravidão (foto ilustrativa)
Marcos Serra Lima/ G1
A trabalhadora dormia em um pequeno quarto nos fundos da casa, sem ventilação adequada. De acordo com a fiscalização, ela ainda era submetida a violência psicológica e assédio moral, vestia roupas usadas, doadas pelos patrões, e não tinha acesso regular a serviços básicos de saúde.
“Esse caso em si chamou muita atenção porque a família empregadora era chefiada por um advogado, e esse advogado nada fez ao longo desses mais de 30 anos para resguardar os direitos trabalhistas dessa trabalhadora doméstica. Isso indignou ainda mais a equipe de fiscalização”, detalhou Cynthia Saldanha, auditora fiscal do trabalho.
Embora os empregadores tenham afirmado que ela era tratada como “parte da família”, os auditores concluíram que ela não era reconhecida nem como empregada nem como familiar.
A condição de vulnerabilidade da mulher — que não tem parentes próximos, enfrentou privações desde a infância, possui baixa escolaridade e apresenta problemas de saúde — foi apontada como fator que facilitou sua exploração.
A fiscalização caracterizou a situação como trabalho análogo à escravidão, com base em três elementos: jornada exaustiva, condições degradantes e trabalho forçado.
A mulher foi retirada do local no fim de março e encaminhada a uma instituição de acolhimento de longa permanência, onde recebe acompanhamento médico, odontológico e psicológico.
O nome da vítima, dos empregadores e o bairro onde ocorreu o caso estão sendo preservados, já que a investigação ainda está em andamento. O Ministério Público do Trabalho deve entrar com uma ação civil pública no Ministério Público contra os responsáveis.
O caso configura graves violações trabalhistas e também desrespeito a tratados internacionais sobre direitos humanos, como as Convenções da OIT nº 29 e nº 105, além da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
Denúncias
“Os casos de trabalho análogo à escravidão no âmbito doméstico têm ganhado visibilidade e a sociedade tem conseguido identificar esse fenômeno. É muito importante que qualquer cidadão que tome ciência, que tem conhecimento de uma trabalhadora doméstica em condições análogas de escravo, denuncie para a inspeção do trabalho”, completou a auditora.
As denúncias de trabalho análogo ao de escravo podem ser feitas pela Internet, no Sistema Ipê (clique aqui), do Ministério do Trabalho.
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