TAMARA NASSIF
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
A Bolsa brasileira fechou em uma nova disparada nesta quinta-feira (24), embalada pelas sinalizações de que a guerra comercial entre Estados Unidos e China pode chegar a um acordo.
A alta de 1,78% levou o Ibovespa ao patamar de 134.580 pontos, o maior desde setembro do ano passado. Já o dólar fechou em queda de 0,42%, cotado a R$ 5,692, em um movimento global de desvalorização.
A perspectiva de arrefecimento das tensões entre as duas maiores economias do mundo também levou os índices de Wall Street às alturas. O S&P500 avançou 2,03%, o Nasdaq Composite, 2,74%, e o Dow Jones, 1,23%.
O sentimento positivo, porém, permanece frágil devido a informações conflitantes sobre as negociações. A visão é da analista sênior do Swissquote Bank, Ipek Ozkardeskaya, que vê que, “de concreto, apenas o ‘show’ de Trump”.
Ele disse, em entrevista coletiva na quarta à noite, que busca um acordo comercial “justo” com a China e que “tudo está ativo” nas tratativas envolvendo os dois países.
O republicano já havia declarado que “não jogaria duro” com os chineses e que reduziria “substancialmente” as tarifas, hoje em 145%. A China, por sua vez, aplica tarifas de 125% a produtos norte-americanos como resultado da escalada da guerra comercial.
Horas antes, o país asiático assegurou estar aberto ao diálogo com Washington. “Se tivermos que lutar, iremos até o fim, mas as portas do diálogo seguem abertas”, declarou Guo Jiakun, porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores.
Nesta quinta-feira, entretanto, Jiakun negou que Pequim esteja em negociações com Washington sobre tarifas. “São informações falsas”, afirmou, em resposta a uma pergunta sobre as “constantes notícias do lado americano” que chegaram até a mencionar um acordo já fechado.
“China e Estados Unidos não se consultaram nem negociaram sobre a questão tarifária, menos ainda alcançaram um acordo”.
O mesmo foi dito por Scott Bessent, secretário do Tesouro dos EUA, que afirmou que os diálogos não começaram.
“Acredito que as duas partes estão esperando para falar com a outra”, disse, durante um ato à margem das reuniões da primavera do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial, em Washington.
Bessent advertiu que os dois países não realizaram nenhuma conversa comercial. Fontes familiarizadas com as discussões disseram que Pequim deixou claro que via as tarifas de Trump como uma forma de intimidação econômica e não irá ceder.
Mas Trump, nesta quinta, afirmou que os dois países conversaram durante a manhã. “Eles tiveram uma reunião esta manhã”, disse, recusando-se a dizer a quem estava se referindo. “Não importa quem são ‘eles’. Podemos revelar isso mais tarde, mas eles tiveram reuniões esta manhã, e nós estamos nos reunindo com a China.”
Em meio ao vai-e-vém de informações conflitantes, investidores optaram por vender dólares e buscar outras moedas neste pregão, em movimento que beneficiou o real.
O índice DXY -que compara o dólar a uma cesta de seis moedas fortes- caiu 0,55%, a 99,29 pontos, indicando fraqueza global da divisa dos EUA.
Do lado dos mercados acionários, o clima foi de apetite por risco. “A perspectiva é de que o pior da retórica em torno das tarifas pode ter ficado para trás, abrindo espaço para atitudes mais moderadas do governo. Nos EUA, as ações de tecnologia lideram o rali antes de uma rodada importante de resultados corporativos, incluindo Alphabet e Intel após o fechamento”, diz Paula Zogbi, gerente de research da Nomad.
Ela pontua que o otimismo deriva, também, dos recuos de Trump em relação à independência do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA).
O presidente vinha ameaçando de demissão Jerome Powell, chefe do Fed, por discordar da forma que a política monetária vem sendo conduzida. Ele chegou a chamá-lo de “Sr. Tarde Demais” e “grande perdedor”, e o assessor econômico da Casa Branca, Kevin Hassett, afirmou que o desligamento de Powell estava sendo estudado.
O alvo nas costas de Powell levou o mercado a temer uma interferência política no Fed, cuja independência é um dos pilares do sistema financeiro dos Estados Unidos e, por consequência, da economia global.
Trump, então, recuou. A jornalistas no Salão Oval da Casa Branca, disse que não tem intenções de demitir o chefe do Fed, mas “gostaria que ele fosse um pouco mais ativo na redução das taxas de juros”.
O Fed tem adotado uma postura de “ver para agir” diante das pressões econômicas causadas pela onda de tarifas de Trump. Diferentemente do Banco Central do Brasil, o dos EUA trabalha com um mandato duplo, isto é, baliza as decisões de política monetária pela inflação e pelo mercado de trabalho. O objetivo é manter os preços controlados, dentro da meta de 2% ao ano, e atingir o pleno emprego.
Mas especialistas dão como certo que as sobretaxas de importação aumentarão os preços ao consumidor final, o que pode levar a um repique inflacionário. Por outro lado, as medidas podem enfraquecer o mercado de trabalho, aumentando o desemprego. Cada um dos cenários fortalece decisões opostas sobre a política monetária: inflação elevada é combatida com juros altos; emprego fraco, com juros baixos.
As incertezas em torno das tarifas -cujas magnitudes já foram alteradas diversas vezes, em um vai-e-vém pouco previsível- colocou o Fed em uma posição delicada, e membros da autarquia, incluindo Powell, reconheceram que podem ser forçados a focar só na inflação ou só no desemprego.
Na visão do estrategista Felipe Paletta, da EQI Research, parte relevante do movimento positivo na Bolsa nesta sessão está atrelada à queda das taxas dos juros futuros, que, por sua vez, foi influenciada pela perspectivas de que o Fed precisará reduzir os juros para proteger a economia dos EUA dos potenciais efeitos nocivos da nova política comercial.
Além disso, destaques corporativos sustentaram a disparada do Ibovespa. Vale subiu 1,72% antes da divulgação do balanço corporativo, previsto para a noite desta quinta.
Itaú ainda disparou 2,37%, enquanto os papéis ordinários e preferenciais da Petrobras caíram 0,91% e 0,16%, respectivamente.