Farmacêutico francês transforma remédios em ‘doces’ para crianças com câncer usando impressão 3D


Desde 2013, o cientista francês Maxime Annereau adapta as doses, o sabor e a forma dos medicamentos usados por crianças e adolescentes com câncer. Ele utiliza impressoras 3D para fabricar os remédios na farmácia do Instituto Gustave Roussy, situado em Villejuif, perto de Paris. Pílulas de aspirina
Patrick Sison/Arquivo/AP Photo
O hospital francês é uma referência na luta contra o câncer e um dos três estabelecimentos no mundo que produz medicamentos impressos em 3D para seus pacientes, em sua própria farmácia.  
De acordo com o farmacêutico, há uma grande carência de moléculas no mercado para tratar crianças e idosos – a indústria utiliza principalmente dados de homens adultos saudáveis para produzir a maior parte dos remédios.
Em busca de soluções, o farmacêutico então apostou, há três anos, na impressão 3D de medicamentos para melhorar a tolerância das crianças aos produtos usados nos tratamentos contra os cânceres.
“São questões que foram sendo trazidas pelos médicos e as enfermeiras, que sempre estão em contato com os pais”, conta Maxime. 
Os pediatras então perguntaram ao farmacêutico se era possível melhorar o sabor do Bactrim, um medicamento que associa dois antibióticos e é utilizado em larga escala.  
“O problema é que, na maioria dos casos, esse comprimido é muito grande para os pacientes. Ele existe em forma de xarope, mas uma dose corresponde a mais ou menos 20 mililitros ou duas colheres de sopa… E o gosto é de fato muito ruim. As crianças tentam tomar uma vez e depois recusam, mas deveriam usar o remédio durante a quimioterapia, que dura entre seis meses e dois anos, três vezes por semana” explica. 
Sem o antibiótico, há risco de infecção, o que pode levar ao adiamento das sessões de quimioterapia, aumentando o risco de recaídas. Para resolver o problema, Maxime e sua equipe então começaram a testar outros formatos e sabores possíveis para o Bactrim com a impressão 3D. 
“O desenvolvimento de um remédio é mais ou menos como uma receita culinária”, conta o cientista, com “erros e acertos”.
Durante o processo, a equipe tentou, por exemplo, criar comprimidos menores do antibiótico com o aroma de hortelã, mas não obtiveram a aprovação unânime dos pacientes. 
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Antibiótico em forma de macaron
O farmacêutico então aprimorou a molécula, que foi testada em 20 crianças e adolescentes internadas no hospital com diferentes tipos de câncer. Os centros de pesquisa e tratamento franceses se beneficiam de uma legislação que permite colocar em prática rapidamente novas soluções para os pacientes, com menos burocracia.  
O resultado foi aprovado, mas os pediatras queriam algo “ainda melhor”, conta Maxime. “O ‘melhor’ demorou oito meses para ficar pronto. Como somos franceses”, brinca, “imaginamos um jeito para disfarçar o gosto do remédio e decidimos fazer um macaron”. 
O macaron é um biscoito redondo francês de cerca de 5 centímetros, de vários sabores, popular em várias regiões do país.
“O gosto é uma questão física. O que não é gostoso não deve estar em contato direto com as papilas gustativas. Sem esse contato direto, você não sente um gosto ruim”, explica o farmacêutico.
A equipe então separou os dois antibióticos do Bactrim vendido na forma de xarope e colocou a molécula que tinha o melhor sabor na parte externa do comprimido. A outra ficou na parte interna, o que reduziu o tempo de contato com as papilas, “enganando” o paladar.
Ao separá-los, a equipe também aumentou a concentração do produto em formato 3D, que passou a ter 400 mg, o que também facilita o tratamento. 
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A última fórmula, que tem um gosto “bem açucarado”, está sendo testada em cinco pacientes desde março. Em junho, diz o farmacêutico, o estudo com a molécula será ampliado para 30 pacientes, durante seis meses.  
Neste período, os dados coletados permitirão confirmar a eficácia do medicamento transformado pela impressão em 3D. A equipe busca também otimizar os parâmetros de impressão para produzir um número maior de comprimidos, mais rapidamente.  
Segundo Maxime, a equipe também é encarregada da parte logística e, além de produzir os remédios, o instituto deve também desenvolver os cartuchos para as impressoras. Em breve, outras moléculas, usadas em tratamentos contra os cânceres pediátricos e adultos, também será melhorada pelos farmacêuticos do centro.
As impressoras do hospital em breve serão capazes de produzir 60 antibióticos por hora, 500 por dia. Em dois anos, a produção quadruplicou e novos projetos de grande escala estão sendo estudados, como a versão pediátrica de um medicamento anticâncer usando impressão 3D. 
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