
Audiência adiada para maio determinará se a dupla deve receber uma pena menor. Se isso acontecer, os irmãos podem se tornar elegíveis para liberdade condicional. Fotos dos irmãos Menéndez em 2023; a defesa deles está apostando em algumas alternativas para reverter condenação à prisão perpétua
Donovan Correctional Facility
Após décadas na prisão, os irmãos Erik e Lyle Menendez têm chance de terem a sentença revista – e possivelmente serem libertados – em um caso de assassinato que ainda divide os Estados Unidos.
Eles cumprem prisão perpétua pelo assassinato dos pais, Kitty e Jose Menendez, em 1989, quando tinham 21 e 18 anos. O caso voltou a ganhar atenção após uma série popular da Netflix no ano passado.
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Nesta quinta-feira (17), a dupla compareceu por videoconferência a um tribunal de Los Angeles, em uma audiência há muito aguardada. Mas, após um início conturbado, o juiz decidiu adiar a revisão de sentença para o próximo mês.
A audiência agora adiada determinará se a dupla deve receber uma pena menor. Se isso acontecer, os irmãos podem se tornar elegíveis para liberdade condicional – o que pode levá-los à liberdade.
Promotores argumentam que Erik e Lyle planejaram meticulosamente os assassinatos para ter acesso à fortuna dos pais. O atual promotor do distrito de Los Angeles afirma que os irmãos continuam mentindo sobre o caso e que não deveriam ser libertados.
Mas os advogados dos irmãos há muito sustentam que os assassinatos foram um ato de legítima defesa e alegam que o pai abusou deles por anos. Eles também destacam documentos judiciais que detalham a reabilitação dos irmãos durante os anos em que estiveram presos.
O caso de assassinato em 1989, que há décadas mobiliza o país, foi reaberto em 2024 quando o então procurador distrital de Los Angeles, George Gascón, endossou o pedido de revisão da sentença feito pelos irmãos — condenados à prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional.
Entretanto, na própria procuradoria de Los Angeles, houve mudanças significativas: Gascón foi derrotado e não conseguiu se reeleger para o cargo e foi substituído no ano passado por Nathan Hochman, que no último dia 10 anunciou sua oposição à revisão da sentença.
Os irmãos Menéndez admitiram os assassinatos durante julgamento na década de 1990, mas disseram que o fizeram em legítima defesa — alegando terem sofrido anos de abuso emocional e sexual do pai e afirmando temer que os próprios pais pudessem matá-los.
A seguir, entenda o caso, e o que aconteceu na audiência desta quinta-feira.
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O que levou ao adiamento da audiência?
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A audiência desta quinta-feira começou de forma conturbada – e acabou levando o juiz a adiar o processo para o próximo mês.
O dia começou com o escritório do Promotor Público do Condado de Los Angeles fazendo um pedido de última hora para adiar a audiência, a fim de que o tribunal pudesse analisar um novo relatório elaborado pela junta de liberdade condicional do estado.
Esse relatório, uma avaliação de risco, analisou se os irmãos representariam perigo para o público geral caso fossem libertados em liberdade condicional.
O documento foi solicitado pelo governador Gavin Newsom depois que os irmãos pediram clemência em seu caso – mais uma tentativa de Erik e Lyle na esperança de serem libertos da prisão.
A audiência seguiu adiante, e os advogados que representam os irmãos Menendez e os familiares das vítimas lançaram uma ofensiva contra o escritório do Promotor Público do Condado de Los Angeles, que se opõe à revisão de sentença.
Eles acusaram os promotores de violar os direitos das vítimas ao exibir imagens gráficas da cena do crime e de criar um conflito de interesse dentro da junta de liberdade condicional.
Mark Geragos, um advogado de defesa de destaque que representa os irmãos, afirmou que pediria a retirada do escritório do promotor do caso.
O juiz Michael Jesic, da Suprema Corte do Condado de Los Angeles, defendeu o promotor responsável pelo caso, Habib Balian, que pediu desculpas por não ter avisado a família antes de mostrar as fotos chocantes.
O juiz disse ao advogado Bryan Freedman, que representa membros da família Menendez que apoiam a libertação dos irmãos, que essas audiências trarão momentos difíceis para os familiares.
“Se alguém se sentir desconfortável, precisa pensar se realmente deve estar aqui”, advertiu o juiz.
Depois do intervalo para o almoço, o juiz decidiu adiar o processo até o dia 9 de maio, para ter tempo de analisar o relatório de avaliação de risco e o pedido de afastamento do promotor.
O que acontece agora?
Cartaz pede liberação dos irmãos Menéndez, em 17 de abril de 2025
REUTERS/Daniel Cole
Se a audiência acontecer como planejado em 9 de maio, o juiz analisará as provas, ouvirá testemunhas e, por fim, determinará se Erik e Lyle devem receber novas sentenças.
Não se trata de um novo julgamento, e a culpa dos irmãos não será questionada. Grande parte do foco poderá ser em cima do que os irmãos fizeram durante seus 30 anos de prisão.
Na audiência – que não será televisionada – ambas as partes (os advogados dos irmãos Menendez e os promotores públicos) apresentarão argumentos sobre por que os irmãos devem ou não ser sentenciados novamente.
Eles também poderão convocar pessoas para depor. Isso poderá incluir uma ampla gama de indivíduos, desde pessoas envolvidas no processo contra os irmãos na década de 1990 até agentes penitenciários falando sobre os últimos 30 anos dos irmãos atrás das grades.
É provável que tenhamos manifestações de membros da família Menendez, muitos dos quais se tornaram defensores ferrenhos da libertação de Erik e Lyle. Mas pelo menos um membro da família criticou duramente os esforços para libertá-los.
Milton Anderson, irmão de Kitty Menendez, disse que os irmãos têm “sangue-frio” e argumentou que a dupla deveria permanecer atrás das grades pelo “ato hediondo”.
Nova sentença poderia levar à libertação
Uma vista mostra a Prisão Estadual Richard J. Donovan, que abriga Erik e Lyle Menendez, em San Diego, Califórnia.
REUTERS/Mike Blake
No final de outubro de 2024, o então procurador distrital do condado de Los Angeles George Gascón recomendou que os irmãos tivessem a sentença revista para uma pena menor, o que os tornaria imediatamente elegíveis à liberdade condicional.
Gascón afirmou que sua decisão foi influenciada por vários fatores, incluindo os esforços de reabilitação dos irmãos durante o período na prisão.
Os documentos judiciais do seu gabinete destacaram as conquistas acadêmicas de Lyle e Erik — ambos obtiveram vários diplomas — e suas contribuições comunitárias, como a criação do programa GreenSpace para melhorar a aparência do ambiente da prisão, de autoria de Lyle.
Gascón também observou que, com a compreensão mais profunda que temos hoje sobre o impacto do abuso sexual e físico nas crianças, ele acha que o julgamento provavelmente teria tido outra abordagem.
Mas o novo procurador distrital, Nathan Hochman, que assumiu o cargo em dezembro de 2024, demonstrou discordar dessa interpretação e pediu a rescisão do pedido de seu antecessor.
Ao se posicionar no início de março contra a revisão da sentença, Hochman argumentou que as alegações de legítima defesa dos irmãos eram parte de uma ladainha de “mentiras”.
Falando em uma entrevista coletiva, o procurador disse qu, inicialmente, os irmãos não demonstraram verdadeira responsabilidade pelos assassinatos.
“Eles não mostraram total percepção de seus crimes”, afirmou, apontando entretanto que os irmãos planejaram meticulosamente os assassinatos e tentaram encobrir o crime.
Para Hochman, o pedido por uma nova sentença só poderia ser reconsiderado se os presos admitissem ter fabricado suas alegações de legítima defesa.
O procurador argumentou que os irmãos Menéndez reconheceram apenas quatro das 20 supostas mentiras que contaram sobre o caso.
Os críticos de Gascón dizem que o ex-procurador distrital só decidiu se envolver no caso como um último recurso desesperado para melhorar seu desempenho nas pesquisas, quando estava concorrendo à reeleição.
Hochman, por sua vez, assumiu prometendo ser mais duro com os crimes.
Há outras alternativas para a liberdade?
Se a tentativa de revisão da sentença fracassar, or irmãos e seus defensores já estão buscando outros caminhos que poderiam levar à sua libertação, incluindo:
Clemência: o advogado dos irmãos Menéndez, Mark Geragos, apresentou um pedido de clemência ao governador da Califórnia, Gavin Newsom, abrindo um segundo caminho em potencial para a liberdade deles.
A clemência poderia significar uma pena reduzida ou até mesmo um perdão, mas não anularia as condenações dos irmãos.
Newsom ordenou que um conselho de liberdade condicional faça uma avaliação de risco para analisar se os irmãos constituem um perigo para a sociedade — um passo em um processo mais amplo que pode levar à clemência. Uma audiência foi marcada para junho.
Um novo julgamento: Os advogados dos irmãos também pediram um novo julgamento, argumentando que os jurados deveriam poder considerar uma pena menor, como homicídio culposo. Hochman se opõe a isso.
O que os irmãos Menéndez fizeram?
Lyle (à esquerda) e Erik Menendez durante o julgamento em que eram réus por matarem os próprios pais, em 1990
Nick Ut/AP Photo, arquivo
Em agosto de 1989, José e Kitty Menéndez foram encontrados mortos a tiros dentro de sua mansão em Beverly Hills.
Seus filhos, Erik e Lyle, chamaram a polícia e disseram que encontraram os pais mortos ao chegar em casa.
A brutalidade do crime levou as autoridades a acreditar inicialmente que talvez tivesse sido um ataque de mafiosos.
Mas os irmãos começaram a entrar no radar das autoridades por causa do seu comportamento — como gastos extravagantes, incluindo a compra de relógios Rolex, jogatina e festas.
Uma confissão ao psicólogo que os acompanhava foi sua ruína.
A namorada do terapeuta gravou em segredo a confissão e fez uma denúncia às autoridades.
Em março de 1990, os irmãos foram indiciados pela polícia.
Eles foram a julgamento em 1993 e admitiram os assassinatos, mas argumentaram que agiram em legítima defesa.
Eles descreveram anos de abuso emocional, físico e sexual — principalmente por parte do pai, José, um executivo de música e cinema de Hollywood.
Em depoimento, Lyle e Erik afirmaram que confrontaram os pais sobre o abuso sexual e que a situação havia se tornado conflituosa. Para os irmãos, os pais estavam planejando matá-los.
Os membros da família testemunharam sobre os abusos que presenciaram, mas nenhum deles disse ter visto o abuso sexual pessoalmente.
Promotores argumentaram que a motivação do assassinato era financeira — os pais tinham uma fortuna de US$ 14 milhões (cerca de R$ 80 milhões).
O primeiro julgamento terminou sendo anulado, uma vez que o júri não chegou a um acordo sobre o veredicto. Mas um segundo julgamento, em 1995, os levou à condenação.
Quem quer que os irmãos Menéndez sejam libertados?
Diane Hernandez, sobrinha de Kitty Menendez, e Anamaria Baralt se abraçam perto do Tribunal de Van Nuys West, no dia de uma audiência de recondenação no caso de Erik e Lyle Menendez, em Los Angeles.
REUTERS/Daniel Cole
Após o lançamento da série na Netflix, celebridades como Kim Kardashian e Rosie O’Donnell apoiaram publicamente a libertação dos irmãos.
Mais de duas dúzias de membros da família Menéndez emitiram um apelo público para que Erik e Lyle sejam soltos.
Estes familiares alegaram que os meninos sofreram abusos sexuais horríveis nas mãos do pai e não são uma ameaça à sociedade.
A irmã de Kitty Menéndez, Joan Anderson VanderMolen, argumentou que “o mundo inteiro não estava pronto para acreditar que os meninos pudessem ter sido estuprados ou que homens jovens pudessem ser vítimas de violência sexual”.
Ela disse que agora “sabemos que não é bem assim” — e “um júri de hoje jamais daria uma sentença tão severa”.
Mas a família não está totalmente de acordo.
Uma advogada de Milton Andersen, irmão de Kitty Menéndez, afirmou que os irmãos tinham “sangue frio” — e acrescentou que as ações deles “destruíram a família e deixaram um rastro de sofrimento que persiste há décadas”.
“José foi alvejado seis vezes e Kitty foi alvejada dez vezes, incluindo um tiro no rosto depois que Erik recarregou [a arma]”, disse a advogada, Kathy Cady.
Andersen acredita que os sobrinhos deveriam permanecer na prisão por seu “ato hediondo”, acrescentou Cady.
A vida dos irmãos na prisão
Uma vista de drone mostra a Prisão Estadual Richard J. Donovan, que abriga Erik e Lyle Menendez, em San Diego, Califórnia
REUTERS/Mike Blake
Ambos os irmãos se casaram enquanto cumpriam suas penas de prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional.
Lyle Menéndez se casou duas vezes. Seu primeiro casamento, com a ex-modelo Anna Eriksson em 1996, terminou em divórcio depois que ela supostamente descobriu que ele estava trocando cartas com outras mulheres.
Em 2003, ele se casou com Rebecca Sneed, uma editora de revista, em uma cerimônia na prisão. Sneed evita os holofotes, mas foi descrita como uma parceira solidária e reservada.
Já Erik Menéndez se casou com Tammi Saccoman em 1999, após um relacionamento por correspondência que se transformou em romance. Tammi, que já havia sido casada, tem falado abertamente sobre sua relação com Erik.
Em 2005, ela publicou um livro de memórias intitulado They Said We’d Never Make It, detalhando o relacionamento deles.
Apesar dos desafios de se casar com um homem que está atrás das grades, Tammi referiu-se ao casamento como satisfatório, classificando-o como uma parceria única e forte.
Ela estava no tribunal em Los Angeles quando o ex-procurador distrital Gascón fez o anúncio sobre o pedido de revisão da sentença.
No dia seguinte, ela escreveu na rede social X (antigo Twitter).
“Ontem foi um dia difícil e emocionante”, publicou ela na rede social em 25 de outubro.
“Sou grata ao procurador distrital [George] Gascón, por sua coragem de buscar uma nova sentença para Erik, mas estou naturalmente desapontada por ele não ter ido além e agido de acordo com sua própria convicção de que Erik e Lyle já cumpriram tempo suficiente na prisão.”
Com informações das reportagens de Kayla Epstein e Regan Morris, da BBC News, e de Samantha Granville e Christal Hayes, da BBC News em Los Angeles (EUA).