ANDRÉ BORGES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O governo busca formas de ampliar a oferta de crédito ao produtor nacional de café com o intuito de tentar reduzir a pressão inflacionária sobre o produto, que teve aumento de 66,2% nos últimos 12 meses encerrados em fevereiro e que tem tido sua presença reduzida na mesa da população.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, encaminhou um pedido ao Ministério da Fazenda, para que seja avaliada a possibilidade de autorizar a contratação simultânea de créditos de custeio para produção de fontes como o Pronamp (Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural) e o Funcafé (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira).
Pela regra atual, o produtor que toma crédito de custeio do Pronamp não pode acionar outra fonte de financiamento de custeio no mesmo “ano agrícola”, período de 12 meses –iniciado em 1º de julho de um ano e concluído em 30 de junho do ano seguinte–, usado como referência para o planejamento, financiamento e execução da atividade agropecuária. A ideia é liberar o acesso, também, aos recursos do Funcafé.
Hoje, o tomador de dinheiro do Pronamp só pode acessar o Funcafé para recuperação de cafezais danificados. Pela proposta, esse produtor poderia recorrer ao Funcafé também para custeio geral, sem que isso descaracterize seus status de beneficiário do Pronamp.
A flexibilização do crédito rural, segundo o ministério, não representaria aumento de subsídios, porque manteria os limites de repasses por tomador, em cada uma das fontes. O crédito anual de custeio no Pronamp é de até R$ 1,5 milhão por beneficiário, enquanto do Funcafé é de R$ 3 milhões por cafeicultor.
Paralelamente, o governo também pretende expandir essa possibilidade para agricultores de pequeno porte, que são atendidos pelo Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Dessa forma, a mudança pegaria todos os portes de produtores de café. No caso do Pronaf, o empréstimo para custeio é de até R$ 250 mil por beneficiário, por ano agrícola.
“Trata-se de medidas que objetivam contribuir para o aumento da oferta de alimentos e para a redução dos preços praticados no mercado interno”, afirmou Carlos Fávaro, ao defender a proposta.
Hoje, nem todo o dinheiro do Funcafé tem sido acionado. Em algumas safras, até R$ 1 bilhão chega a ficar parados no fundo, porque muitos produtores não conseguem acesso ao recurso, por causa das regras do crédito rural.
O maior interesse pelo Pronamp não é casual. Hoje essa linha de crédito oferece taxas de até 8% ao ano, enquanto o Funcafé tem taxas de até 11% ao ano. Além disso, Pronamp e Pronaf são mais amplos e têm mais tradição de uso pelos produtores, com apoio mais direto de bancos públicos como o Banco do Brasil. O resultado é que uma fatia entre 10% e 20% do total disponibilizado pelo Funcafé não tem sido usada a cada safra.
A demanda feita pela Agricultura foi encaminhada ao Conselho Monetário Nacional (CMN), com a proposta de que o colegiado aprove a mudança no Manual de Crédito Rural (MCR). Em paralelo, Fávaro também enviou um ofício ao MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), propondo a mesma medida em relação ao Pronaf.
Dados do censo demográfico de 2017 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam que a cafeicultura é fortemente baseada em pequenos e médios produtores rurais. Ao menos 88% dos estabelecimentos destinados à produção de café possuem menos de 50 hectares de área produtiva.
“Esse perfil socioeconômico e o ciclo da cultura justificam a necessidade de maior flexibilidade no crédito rural, permitindo que os produtores tenham formas diversificadas de financiamento”, afirmou, por meio de ofício, o diretor do Departamento de Política de Financiamento para o Setor Agropecuário do Ministério da Agricultura, Tiago Nunes de Freitas Dahdah.
A reportagem procurou a Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café) e a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) para comentar o assunto, mas não houve posicionamento até a publicação deste texto.
O café está na lista dos 11 produtos que tiveram o imposto de importação zerado pelo governo, como forma de tentar reduzir a pressão inflacionária no mercado nacional. Como mostrou a Folha, praticamente metade dos brasileiros (49%) reduziu o consumo de café em razão da alta de preços, de acordo com pesquisa Datafolha. Outra saída adotada por metade dos entrevistados foi escolher uma marca mais barata do produto.
Segundo o levantamento, 79% dos brasileiros adotaram alguma mudança de comportamento em resposta à inflação de alimentos. As principais são sair menos para comer fora de casa (61%) e reduzir a quantidade de alimentos que costuma comprar (58%).