Após tarifas dos EUA, possível invasão de produtos chineses no Brasil preocupa indústria

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MAELI PRADO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPESS)

Dono de um mercado consumidor relevante, o Brasil é um dos alvos da esperada redistribuição maciça de produtos chineses dos Estados Unidos, que impuseram ao país asiático uma tarifa de 125%, para o resto do mundo.

Essa potencial invasão alarmou o setor produtivo brasileiro, que defende um monitoramento cuidadoso das compras da China —alguns setores já notam disparada de importações— e a eventual adoção de mecanismos de defesa comercial.

A preocupação é com a escala monumental dos manufaturados da China, que responde por um terço da produção mundial. Ao mesmo tempo, diferentes setores reconhecem que os produtos brasileiros podem ganhar espaço no mundo com a provável reorganização do comércio mundial.

“As regras do jogo estão mudando, e há prejuízos e oportunidades num cenário de muita incerteza”, afirma Rafael Cagnin, economista do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), que lembra que outra consequência é o menor crescimento da economia mundial.

Ele aponta que o Brasil precisará avaliar as importações de forma detalhada, determinando os casos em que serão necessárias medidas de proteção, como mecanismos antidumping (taxação de importações de bens que chegam a preços inferiores aos praticados na origem).

Para uma parte da indústria, essa possibilidade é insuficiente, já que os processos de dumping são demorados e caros. Na avaliação de Fernando Valente Pimentel, diretor-superintendente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), o Brasil precisará ir além e impor cotas para limitar as importações da China.

“Os processos de dumping possuem um prazo de resolução de até 18 meses. Se todos os setores entrarem com processos ao mesmo tempo, o problema só será resolvido em cinco anos”, diz. “Mas depois que as tropas chinesas ocuparem o país, não tem mais volta. Até lá, Inês é morta”, ironiza.

O executivo diz que os Estados Unidos importaram US$ 113 bilhões em têxteis no ano passado, e que a China respondeu por 25% desse total. “Não acredito que tudo isso deixará de ser vendido para os Estados Unidos, mas o maior risco que temos no curto prazo é: para onde vão mandar tudo isso?”.

Cagnin defende que, apesar da necessidade de defesa comercial, o Brasil não pode ser levado pelo calor do momento, entrando na seara do protecionismo, e simplesmente fechar o mercado. “O Brasil está atrasado na agenda de integração internacional, e esse seria um erro”.

DISPARADA EM CALÇADOS
Algumas entidades apontam que o salto na entrada de produtos da China no Brasil já vem acontecendo, após os Estados Unidos colocarem uma tarifa de 20% aos produtos do gigante asiático no início de fevereiro.

Dados da Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados) mostram que, apenas no mês de março, as importações de calçados subiram 47,7% na comparação com o mesmo período do ano passado, o equivalente a 5 milhões de unidades. A principal origem foi a China, com alta de 51,7% na mesma comparação.

“Essa invasão ocorre antes mesmo da entrada em voga da nova tarifa”, afirmou o presidente-executivo da entidade, Haroldo Ferreira, em nota. “A previsão é de que aumente ainda mais nos próximos meses.

A Abicalçados apontou que o que mais preocupa no tarifaço de Trump é “a desova da produção chinesa no mercado doméstico brasileiro, gerando concorrência desleal com as produtoras brasileiras”.

Para a Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica), as tarifas podem abrir portas para a elevação das exportações de produtos do setor elétrico e eletrônico para os Estados Unidos.

“A Abinee acredita que o Brasil não deve entrar nessa guerra tarifária, mas deve sim se armar para enfrentar uma concorrência ainda maior no mercado interno, uma vez que países como China, Coreia do Sul e Vietnã deverão redirecionar suas exportações para outros mercados”, disse em nota.

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