SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Uma análise publicada nesta terça-feira (8) na revista The Lancet avalia os impactos do corte de recursos no Pepfar (Plano de Emergência do Presidente para o Alívio da Aids), anunciado por Donald Trump, sobre o tratamento e a prevenção da Aids na África Subsaariana. O estudo projeta que, caso o programa seja suspenso ou tenha o financiamento reduzido, cerca de 1 milhão de crianças poderão ser infectadas pelo HIV e 460 mil morrerão em decorrência da doença até 2030.
Os autores também estimam que, em cinco anos, até 2,8 milhões de crianças podem ficar órfãs se o Pepfar for extinto ou tiver seus recursos limitados.
Segundo a análise, o plano é sustentável a longo prazo e reduz o risco de infecção ao longo da vida de crianças. Antes da chegada dos antirretrovirais ao continente, mais de 20 milhões de pessoas morreram por causas relacionadas à Aids.
A projeção foi feita com base em modelagens que utilizaram dados disponíveis para estimar os riscos enfrentados por crianças da África Subsaariana na ausência do programa. Entre os principais benefícios do Pepfar, os especialistas destacam o fortalecimento dos sistemas de saúde, a prevenção da violência sexual contra meninas e o apoio a programas de saúde infantil. Também apontam impactos positivos nas relações diplomáticas e no comércio bilateral entre os Estados Unidos e países africanos.
Em 20 de janeiro deste ano, o presidente dos EUA anunciou uma suspensão de 90 dias no financiamento do Pepfar. Apesar de ainda haver autorização parcial, diversos serviços e iniciativas foram interrompidos ou suspensos desde então.
Criado em 2003 pelo governo norte-americano, o Pepfar é considerado um dos pilares no combate global à epidemia de HIV, com mais de US$ 120 bilhões investidos em prevenção e tratamento desde sua criação.
Ao longo dos 22 anos de existência, o programa é creditado por ter salvado mais de 26 milhões de vidas e evitado a transmissão do HIV para 7,8 milhões de bebês. Atualmente, graças ao Pepfar, mais de 20 milhões de pessoas, principalmente na África Subsaariana, têm acesso a serviços de prevenção e tratamento. O número de órfãos por Aids caiu de 14 milhões em 2010 para 10,5 milhões em 2023.
A publicação inclui ainda uma carta assinada por 11 autoridades da área de saúde na África, que detalha o compromisso de governos locais com a transição para uma gestão mais sustentável dos programas de HIV, em parceria com os EUA.
Entre as sugestões para garantir a sustentabilidade do Pepfar até 2030, os autores defendem o engajamento de parceiros locais e internacionais, o fechamento de lacunas de financiamento, o fortalecimento de iniciativas comunitárias e a melhoria dos sistemas de saúde locais.
Os países beneficiados já demonstram compromisso com essa transição, segundo o estudo, com o cofinanciamento anual passando de US$ 13,1 bilhões em 2004 para US$ 40,7 bilhões em 2021.
A análise ressalta que, nos próximos 25 anos, metade das crianças e adolescentes do mundo viverá na África, segundo o coautor Joel-Pascal Ntwali-NKonzi, da Universidade de Oxford.
Os autores reconhecem, no entanto, limitações no estudo, como a volatilidade do financiamento internacional e a incerteza sobre o futuro do programa. As projeções foram baseadas em dados atuais sobre infecções por HIV e taxas de mortalidade.