Sob Lula, Abin fez ação hacker contra o governo do Paraguai


Lula e o presidente do Paraguai, Santiago Peña | Imagem: Ricardo Stuckert/Presidência da República

Por Aguirre Talento – UOL

A Abin (Agência Brasileira de Inteligência), sob o atual governo Lula (PT), executou uma ação hacker contra autoridades do governo do Paraguai. O planejamento da operação de espionagem teve início ainda na gestão da agência durante o governo Bolsonaro (PL), mas a ação foi executada com a autorização do atual diretor da Abin de Lula, Luiz Fernando Corrêa.

O UOL apurou que a ação invadiu computadores para obter informações sigilosas relacionadas à negociação de tarifas da usina hidrelétrica de Itaipu, que é objeto de disputa comercial entre os dois países há muitos anos.

A ação foi descrita em detalhes em depoimento — obtido com exclusividade pelo UOL — prestado à Polícia Federal por um servidor da Abin que participou diretamente da ação. Um segundo agente da Abin também relatou à PF a existência da operação. O UOL ainda confirmou os fatos com uma terceira pessoa que teve acesso a informações detalhadas da ação.

De acordo com o depoimento do agente, a ação resultou na captura de dados de diversos alvos ligados à cúpula do país vizinho.

A operação aconteceu meses antes de o governo brasileiro fechar um novo acordo sobre os valores pagos ao Paraguai por energia vendida ao Brasil, em maio de 2024. Porém, o agente não explicou se as informações obtidas na ação da Abin foram usadas para favorecer o Brasil na negociação.

A PF apura agora se a operação hacker contra o governo do Paraguai teve caráter ilegal.
Procurados, o diretor Luiz Fernando Corrêa e a assessoria de imprensa da Abin não se manifestaram. O espaço segue aberto para posicionamento.

A investigação faz parte de inquérito que apura desvios da Abin sob a gestão do ex-diretor Alexandre Ramagem, no governo de Jair Bolsonaro (PL), mas que também passou a detectar suspeitas de irregularidades envolvendo o atual diretor.

Esse depoimento foi prestado em novembro do ano passado por um servidor concursado da Abin há mais de 20 anos, que atuou na área de inteligência. Ele participou tanto de operações na gestão de Ramagem como também da ação hacker que relatou à PF.

O UOL teve acesso com exclusividade à transcrição do interrogatório, enviada sob sigilo ao STF (Supremo Tribunal Federal).

Para preservar a segurança do agente da Abin em operações de campo, a reportagem optou por omitir o seu nome. Um segundo servidor da Abin também confirmou à PF a existência dessa operação, mas não deu detalhes por não ter participado diretamente dela.

Intrusão em computadores

De acordo com o agente, a ação envolveu o uso de um programa chamado Cobalt Strike, usado para invasão de dispositivos de informática.

“O Cobalt Strike era uma ferramenta utilizada para o desenvolvimento de um artefato de intrusão em computadores do governo paraguaio para dados relacionados à negociação bilateral de Itaipu […] O objeto da operação era a obtenção dos valores que seriam negociados do anexo C dos valores de venda de energia produzida por Itaipu”, afirmou o agente da Abin à PF.

O chamado anexo C do tratado sobre a divisão de energia assinado entre Brasil e Paraguai em 1973 estabelece as bases financeiras de comercialização da energia de Itaipu.

A energia gerada pela usina é dividida igualmente entre os dois países. Como o Paraguai tem uma demanda menor, vende parte de sua energia para o Brasil. Essas condições estão estabelecidas no anexo C do tratado.

A ação da Abin ocorreu em um momento estratégico das negociações sobre esse assunto. O tratado previa que os valores da tarifa de energia e as condições de comercialização voltariam a ser discutidas em 2023. Nos últimos anos, os governos do Paraguai vinham pressionando o Brasil para aumentar o valor pago pela energia excedente do país vizinho.

Em maio do ano passado, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, fechou um acordo com o presidente do Paraguai, Santiago Peña, no qual o Brasil aceitou aumentar a tarifa paga pela energia de Itaipu, mas abaixo do valor pedido pelo Paraguai.

Na ocasião, o governo brasileiro também abriu a discussão para negociar as condições do anexo C do tratado.

Ataques hackers não partiram do Brasil

Segundo o servidor da Abin, a ação hacker não foi feita a partir do Brasil. Agentes da Abin fizeram três viagens para o Chile e o Panamá para montar servidores virtuais, de onde foram disparados os ataques.

Os alvos seriam “autoridades relacionadas diretamente à negociação e aos valores a serem cobrados por megawatt”, disse o agente. “Foram invadidos o Congresso paraguaio, Senado, Câmara e Presidência da República”, revelou.

O agente da Abin relatou que foram executadas ações para capturar senhas e dados de usuários das autoridades do Paraguai, com o objetivo de ter acesso a informações sensíveis para a negociação das tarifas de Itaipu.

“Foram capturadas [informações] de cinco ou seis pessoas”, confirmou o agente à PF, sem contudo revelar as identidades. O servidor também não detalhou as informações obtidas e a data ou período em que a operação foi realizada.

Autorização dos diretores

A PF perguntou ao agente da Abin se as ações eram de conhecimento da cúpula da agência e se tiveram a autorização dos diretores.

Ele explicou que o plano de operação foi inicialmente aprovado pelo então diretor da Abin Victor Carneiro, que comandou a agência no final do governo Bolsonaro como sucessor de Ramagem.

Segundo o servidor da Abin, a operação obteve o aval de diretores seguintes do órgão, incluindo o atual, Luiz Fernando Corrêa.

Em seu depoimento, o agente disse que um dirigente da Abin “apresentou pessoalmente” a operação para o atual diretor da agência. “Luiz Fernando teria vibrado, gostou muito, que era a primeira vez que se sentia numa atividade de inteligência”, relatou o servidor à PF.

Homem de confiança do presidente, Luiz Fernando Corrêa é delegado de Polícia Federal aposentado e chegou a comandar a corporação durante o segundo governo Lula.

A nomeação dele para comandar a Abin no terceiro governo Lula desagradou o atual diretor da PF, Andrei Rodrigues, que havia tentado emplacar um nome de sua confiança para o órgão. Nos bastidores da Abin, o avanço das investigações da PF sobre a atual gestão da agência é visto como um desdobramento dessa disputa de poder.

O foco inicial da apuração da PF foi o uso da estrutura da agência pelo ex-diretor Alexandre Ramagem para espionar adversários políticos do governo Bolsonaro e atuar em defesa dos filhos do então presidente. As provas apreendidas ao longo da apuração, entretanto, resultaram na descoberta de suspeitas de irregularidades envolvendo as gestões seguintes.

Aguirre Talento – UOL

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