Seca na amazônia e enchentes no RS são destaque em relatório da ONU sobre clima na América Latina

GIULIANA MIRANDA
MADRI, None (FOLHAPRESS)

As enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul, bem como a seca e os incêndios que assolaram a amazônia e o pantanal, estão entre os destaques do novo relatório sobre o estado do clima na América Latina e no Caribe em 2024, publicado pela OMM (Organização Meteorológica Mundial), vinculada à ONU (Organização das Nações Unidas).

O documento, lançado nesta sexta-feira (18), retrata “o crescente impacto dos extremos climáticos, meteorológicos e hídricos sobre vidas, meios de subsistência e cadeias de suprimento alimentar em uma região já marcada pela pobreza e insegurança”.

O relatório destaca também o derretimento da geleira Humboldt, a última da Venezuela, que transformou a nação no segundo país do mundo a perder todas as suas geleiras nos tempos modernos.

O documento regional vem na sequência do lançamento de uma análise da OMM sobre o estado do clima global, publicada em 19 de março. Em um ano em que o planeta, como um todo, registrou sua temperatura mais alta, os termômetros na América Latina e no Caribe seguiram a tendência de alta em 2024, ficando 0,9°C acima da média registrada de 1990 a 2020.

Dependendo do conjunto de dados analisado, a região teve o primeiro ou o segundo ano mais quente da série histórica.

“Em 2024, os impactos do clima e do tempo se espalharam dos Andes à amazônia, das cidades populosas às comunidades costeiras, causando grandes perturbações econômicas e ambientais. A seca e o calor extremo alimentaram incêndios devastadores. Chuvas excepcionais desencadearam inundações sem precedentes, e vimos o furacão de categoria 5 mais precoce já registrado”, disse, em nota, Celeste Saulo, secretária-geral da OMM.

Na primeira metade do ano, o fenômeno climático El Niño influenciou os padrões de precipitação em vários países. No Brasil, ele contribuiu para secas generalizadas na amazônia e no pantanal, que tiveram chuvas 30% a 40% abaixo do normal.

“A bacia amazônica enfrentou uma das secas mais severas da história. Até o final de setembro de 2024, 745 mil pessoas foram afetadas pela estiagem. O pantanal viveu sua segunda pior temporada de seca e incêndios”, enumera o documento, que também destacou o nível recorde de baixa do rio Negro, em Manaus.

A seca e as ondas de calor também favoreceram a ocorrência de incêndios florestais na amazônia e no pantanal, assim como em outras localidades do México, Belize e Chile.

No país andino, grandes incêndios deixaram mais de 130 mortos, tornando-se o pior desastre do país desde o terremoto de 2010.

Outras regiões, contudo, sofreram com precipitações acima da média que deixaram um rastro de inundações e deslizamentos. É o caso do Rio Grande do Sul, afetado por chuvas torrenciais e fortes enchentes em abril e maio de 2024.

A situação no estado foi considerada “o pior desastre climático do Brasil”, destaca o relatório, indicando as mais de 180 mortes e R$ 8,5 bilhões em perdas econômicas para o setor agrícola.

O documento chama a atenção para a atuação do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) nos alertas de perigo e reforçou a importância de que o poder público e a população ampliem a compreensão dos riscos dos desastres.

“A linha do tempo dos eventos relacionados a esse desastre mostra claramente que previsões de chuva e alertas de enchente de alto risco foram emitidos dois dias antes da inundação mais severa em Porto Alegre. Populações que vivem em áreas vulneráveis e expostas foram alertadas e evacuadas a tempo. No entanto, o número de vítimas fatais ainda foi elevado. É necessário aumentar a compreensão dos riscos de desastres por parte das autoridades e do público em geral”, diz o texto.

O derretimento acelerado das geleiras, que representam fontes de água essenciais para milhões de pessoas na América do Sul, é apontado como “motivo de preocupação” pela Organização Meteorológica Mundial.

Em 2024, a Venezuela se juntou à Eslovênia como os primeiros dois países a perderem todas as suas geleiras.

Dados indicam que, no ano passado, os Andes já haviam perdido 25% da cobertura de gelo desde o fim do século 19, e suas geleiras tropicais estão derretendo em um ritmo dez vezes mais rápido do que a média global acumulada.

O derretimento das geleiras, somado ao aumento de temperatura dos oceanos, vem contribuindo para o aumento do nível do mar, ampliando a vulnerabilidade de comunidades costeiras e das ilhas do Caribe.

A frequência e a intensidade dos eventos climáticos extremos, como secas, inundações, ondas de calor e furacões, já afetam a agricultura e a segurança alimentar na América Latina e no Caribe.

No Haiti, a combinação de violência, instabilidade econômica e impactos climáticos aumentou a insegurança alimentar aguda. Enchentes no sul do país afetaram mais de 116 mil pessoas, causando perdas significativas na agricultura e na pecuária.

Diante desse cenário, a OMM ressalta que é crucial implementar estratégias para antecipar ações e tornar a agricultura da região mais resiliente, fortalecendo sistemas alimentares e priorizando ações de mitigação.

O documento trouxe também algumas boas notícias, como o crescimento das energias renováveis, que já representam quase 69% da matriz energética da região. A capacidade de geração de energia eólica e solar cresceu cerca de 30% em relação a 2023.

Outro ponto positivo foi a ampliação dos sistemas de alertas precoces e dos serviços meteorológicos e hidrológicos nacionais, que já estão contribuindo para salvar vidas e ampliar a resiliência da região.

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